O catador
O bigode branco, sempre bem aparado, porém levemente amarelado pelos anos de fumante. O cheiro forte daquele cigarro de palha, com aquele tabaco preenchendo o tal enroladinho amarelado, sempre avisava quando ele estava chegando.
Costumava comprar rapaduras de um vendedor ambulante que passava algumas vezes por semana naquela rua poeirenta de terra solta, onde as crianças brincavam despreocupadas e corriam atrás do moço dos doces com sua carroça para poderem acariciar o cavalo manso. Gostava de chupá-las tomando seu chimarrão no final da tarde. A palha que envolvia o doce ele guardava para fazer o palheiro, o cigarrinho fedido. Gostava de reutilizar tudo, tinha idéias para tudo.
Quando ia caminhando pela rua, sempre olhava em direção ao chão, parecia sempre procurar coisas que nunca havia perdido. Fossem parafusos, molas ou pedaços de qualquer coisa que achasse útil, ele guardava no bolso da calça. Levava para casa e enfiava tudo numa maleta de ferro, tipo daquelas de marceneiro. Se as coisas fossem grandes demais, como tábuas ou pneus carecas, ele as enfiava na garagem, ao lado do fusca branco empoeirado. Sua mulher enlouquecia com aquela tralha toda. Mas na hora da cachacinha com mel no início da noite ela sorria e esquecia tudo.
Gostava de ficar sentado no sofá de almofadas verdes, recostado no travesseiro com fronha de cavalo, embaixo daquela colcha colorida, vendo TV ao lado da netinha e do amor da sua vida.
*Saudades de ti vô*