A enigmática bolsinha preta.
A imponente igreja de Santo Antonio escondia o sobrado amarelado localizado bem atrás.Lá funcionava o agitado Centro Estudantino de Guaratinguetá.Um portão de ferro,uma escadinha,uma sala de recepcão,um corredor,outra escada e no andar de cima a diretoria.Paulinho era o presidente.Tempos quente para estudantes,pois era época de ditadura.Guaratinguetá sempre fora uma cidade conservadora,assim não haveria problemas para a Aeronáutica,localizada lá nos confins do bairro Pedregulho.No centro estudantino havia uma pessoa singular:Luiz Toprê! Acho que era diretor de não sei o quê.Sempre vestido com o uniforme:camisa caqui,dois bolsos,mangas curtas e uma bolsinha preta embaixo dos bracos.Não a largava nunca! Era um frenesi naquela centro estudantil,pois jovem gosta de agitar.O Luiz Toprê sempre solícito sem abandonar a bolsinha preta.Que segredos haveria nela? Estudávamos todos numa escola formadora de cabecas pensantes:Instituto de Educacão Conselheiro Rodrigues Alves. Tempos idos de escolas de qualidade,escolas públicas.Luiz Toprê tinha esse apelido porque era negro,e os amigos com receio de ofendê-lo,chamavam-no de Toprê ao invés de preto.Jeitinho brasileiro.Passados quase 50 anos,encontro-me com o Luiz Toprê quase todo sábado,num restaurante no centro de S.Paulo,à noite.O local é de um grande amigo nosso,Zé Mané.Não precisa dizer que é português,né? Nossos encontros são entremeados de conversas mil,saudades trocentas e um canto gravado eternamente na memória:*Ó quem vem lá.Sou eu morena. O estudante de Guará. O estudante sinal de guerra. O estudante gostosão da terra.* Lembrancas não faltam ao nosso encontro,mas o caso da bolsinha preta até hoje ele não explicou direito.Que ráios de bolsinha que ia e vinha prá baixo e prá cima,debaixo do braco do Luiz Toprê? Grande segredo de época deliciosa de nossa juventude.Grande segredo de uma pessoa simples e lutadora.A mãe era doméstica.Luiz aproveitou a chance de estudar junto aquela sociedade conservadora e tradicional.Aproveitou e foi em frente até se formar em Biomédicas,em S.Paulo.A vida nos dá oportunidades,seja você pobre ou rico,e a gente tem que aproveitar a chance,senão perde o bonde da história. Luiz aproveitou a chance e eu também.Mas...a bolsinha preta...Até hoje inexplicável! Nossas conversas de sábado à noite,no restaurante Marajá,na rua Martins Fontes,são entremeadas de lembrancas e alegrias por podermos usufruir da vida de uma maneira salutar.*Quem da solidão faz seu bem,vai se tornar seu refém.*-diz a música de Gudin e é verdade.O sábado é um dia sagrado.Vinicius de Moraes que o diga *Porque hoje é sábado.*A bolsinha preta vai continuar um mistério.Nossas vidas não.Hoje elas são um livro aberto,pois temos mais de 60 anos bem vividos Fiquem na paz!