SETEMBRO VERMELHO
Nome de batismo Onildo Raimundo, codinome Larissa
Uma flor que nasceu e se reconheceu mulher frente ao preconceito
Nascido em terra de macho
Sua delicadeza desafiou os encalços da vida
Driblando as surras e a humilhação
Impedido de usar seu cobiçado baton
Sua mãe lhe pintava seu pai lhe surrava e sua mente se embaralhava
Porque não se consegue cantar a letra se a musica está fora do tom
A mulher que nasce num homem é uma Eva desprezada por adão
Todo dia Onildo era levado para roça para colher cacau
Larissa ficava dormindo dentro daquele corpo sensual
Ninguém sabe que tudo começou
Por alguem que lhe estuprou no meio do milharal
Isso não desencadeou sua sexualidade
Mas lhe deu a certeza que sua alma queria viver outra realidade
Livre, pode escolher e desejar seus homens, seus corpos, seus braços
Livrou-se de crescer estigmatizado
E de esconder-se dentro de um visual de macho
Deu tempo ao tempo até que pudesse
Ser alforriado do preconceito do seu pai
Quando pode mudou-se da roça
Delineou suas pernas grossas e afinou sua voz
Gastou sua economia com maquiagens
Para amenizar suas linhas de expressões
Foi muito tempo abaixo de sol
Que suas mãos calejadas passariam por transformações
Algum tempo depois da alma desfazer-se das surras e das feridas
Onildo deixou de ser homem para enfim nascer larissa
Mulher extremamente sensual
Que no novo local em que morava
Ninguém duvidava que ela já houvesse sido ele
Maquiador, cabeleireira, manicuro, pedicuro
Era a deusa das transformações
Sua arte criou fama
E sua cama ganhou homens de segundas intenções
A mulher venceu o homem naquela alma sofrida
O homem sucumbiu-se
Ao descobrir que abrigava em si uma mulher oprimida
Larissa assim como tantos buscava seu direito de igualdade
Direito a andar de mãos dadas
Direito a beijar na boca direito de ter direito a felicidade
Ela iniciou um movimento contra a segregação sexual
Levantou a bandeira
Que o Brasil tem que respeitar a opção de cada qual
Seu movimento ganhou seguidores por toda parte do Brasil
Seu lema era:
Não frustre seu filho
Por suas frustrações de viver provando que foi sempre viril
As atenções aumentaram
Igrejas repudiaram mas sua luta ganhou adeptos
É um direito do ser humano escolher seu caminho
E de seu livre arbítrio definir o que é certo
A guerra venceu o medo
Larissa enfim pode ver pessoas do mesmo sexo no altar
Trocando alianças plantando esperança na alma da humanidade
O amor é transexual, é espiritual e carnal somado a felicidade
Larissa enfim venceu o preconceito e viu a gema se soltar da clara
A diversidade é a liberdade de usar baton
E espalhar a base pela sua cara
As barreiras se quebraram
E crianças abandonadas puderam ser adotadas
Larissa adquiriu respeito de todos
E ódio de muitos que conservam na alma a discriminação
Numa tarde de primavera
Larissa era a flor mais bela a bailar no seu jardim
Ela contemplava as flores e lembrava-se que através do seu serviço
Deu uma fazenda ao seu pai, deu a sua mãe uma confecção
Ajudou seus afilhados, agregados e irmãos
Todos que há humilharam
Um dia tiveram que humildemente vir comer na sua mão
Mas larissa nada cobrou porque ela dizia
Que tudo que ela conquistou foi deus lhe deu de presente
Era sete de setembro a cidade toda vazia
Larissa no jardim colhia flores na sua maior alegria
Quando foi baleada no peito pelas mãos da homofobia
Seu corpo caiu lentamente
Sobre os copos de leite plantados no seu jardim
As rosas brancas se avermelharam com o sangue de larissa
Ela vestia um sorriso lindo naquela alma tão fria
Sabia que ela se calava, mas as suas conquistas nunca se calariam
Enquanto desfalecia a única certeza que ela tinha
É que sua morte logo seria esquecida
Como aquele que foi morto numa danceteria
Outro que teve uma lâmpada fluorescente estilhaçada sobre o rosto
Mas uma certeza ela tinha
A certeza que a vida vale a pena quando se viveu tudo sem limite
Se deus controla a humanidade e respeita a nossa verdade
Porque o homem quer interferir nas coisas que deus permite
(Mauricio Ife)
Contato: maumau_cezar@hotmail.com
Espero sinceramente ter podido ajudar a bandeira da diversidade respeitada, pois todos merecem repeito independente de sua cor, credo ou orientação sexual.