COISAS DE FAMÍLIA VIII

Sentiu o gosto de sangue. Ainda assim, ficou firme protegendo o corpo da mãe de mais uma investida do pai. Sentiu outro soco, desta vez no estômago. Os gritos, que não entendia, ficaram no ar até que finalmente o homem desistiu e se foi. Só então Murilo permitiu a queda do corpo. A mãe, passou as mãos no rosto do filho e juntou com ele as lágrimas num misto de dor e revolta.

Mas Murilo sabia que a cena se repetiria. Era assim há muito tempo. Não entendia bem a relação da mãe, Josina e do pai, José.

Desde sempre vivia as agressões do homem e a insistência da mãe e o que restava-lhe era defender a mãe com o próprio corpo. Sempre que podia se colocava a frente do corpo dela e sentia as muitas pancadas.

Só que, no pensamento, o desejo de crescer e matar o homem, se fortalecia a cada gota de sangue que sentia.

E naquela noite, depois de um banho, foi até o mirante próximo e olhou o céu. As muitas estrelas bailavam numa melodia que só o coração podia ouvir. Lembrou-se do sonho de um dia se formar e proporcionar uma vida diferente para a mãe. Ainda era um sonho. Mas para Murilo mais uma opção.

O que fazer?

Canalizar o ódio ou viver o sonho?

Naquele momento, só o que tinha era a duvida.