PELA LINHA DO HORIZONTE BRANCO
Todos os dias ele cuidava delas com um carinho que aconchegava o mais indiferente frio.
Já era quase primavera e da janela do restaurante, logo pela manhã, o cenário do lago o procurava para absorvê-lo ao emoldurado dos picos distantes sempre cobertos de gelo, já contando com as cores viçosas que também decoravam aquela primorosa paciência de anos.
Dum capricho ímpar e movido por um evidente amor incondicional, meticulosamente parecia calcular passo a passo todo o milimétrico procedimento que repetia em prol da beleza das janelas dali.
Quase octagenário, apresentava um equilíbrio ímpar ao subir pelas escadas ancoradas apenas nas paredes de fora do edifício, num ângulo que provocava calafrios e assim apoiado alcançava até o último andar do hotel donde partia descendo com seu regador nas suas mãos ainda firmes, numa precisão que não permitia nem uma gota de água a mais, tampouco uma a menos sobre os vastos gerânios coloridos que ornamentavam as tantas floreiras.
Assim que me viu, através do vidro da janela, me lançou um sorriso que talvez significasse um "bom dia", e num segundo deixou acima de si o presente das flores viçosas que, pelo lado de fora, decoravam aquele ambiente quente.
Deixou-me a memória de dois olhos dum limpo azul celeste de outono, e duma rala cabeleira que lembrava flocos de neve.
Ali ensinava que a beleza da simplicidade lhe fizera feliz.
Um vento soprou através da cortina de voal bege e uma gaivota, sobre o espelho das águas cristalinas, cruzou o céu em direção ao branco das neves eternas.
Um pio de ave ecoou a se esvaecer no espaço longínquo aonde o tempo me selaria mais uma bela lembrança...
Verídico, lago de Lucerna.