Desencontros

Desencontros

Conheceram-se numa festinha de amigos. Ela dançava feliz, ao som do rock que ela amava e ele fazia força para suportar, pois não gostava. Achou o sorriso dela lindo e chamou-a para conversar. Ela pediu uma coca, ele uma cuba libre, a bebida do momento. Saíram mais vezes depois. Ela gostava de cinema, ele curtia o bar. Às vezes variavam o programa, ela queria ir à praia, e ele, ao campo de futebol. Iam assim, levando o namoro em ritmo de concessões. Um procurava fazer os caprichos do outro, para estarem juntinhos. Um dia, ela falou em casamento. Ela sonhava com a igreja, o vestido de noiva e a festa com os amigos. Ele não queria cerimônia, só ir ao cartório e formalizar a união. Ela insistiu, chorou... Ele não vacilou, virou as costas e ela ficou desfiando os farrapos de seus sonhos. Ela jurou não sofrer mais, esquecer que ele existia. Ele jurou não esquecer que ela existia e que não a deixaria estragar sua vida, por causa de uma bobagem. Ela fez que não ouviu o telefone, e não saiu mais de casa. Ele se cansou de telefonar e se mandou pra casa dela. Ela, carente, aceitou o pedido de desculpas. Ele, imponente, impôs sua condição para continuar o namoro. Ela aceitou. Ele sorriu. Casaram-se no cartório, dois meses depois, sem a presença de nenhum de seus amigos. Ela queria uma viagem de lua de mel. Ele queria uma TV nova para o apartamento. Ela abriu mão da viagem. Ele, assumiu o controle remoto da TV 29” na programação de esportes. Ela via os dias passando enquanto vivia de frutas e salada. Ele, cada vez mais engordando enquanto abusava das massas e de carne. No seu aniversário, esperou ansiosa pela surpresa do presente. Ela era romântica, sonhava com flores, ou quem sabe jóias, perfumes, um vestido lindo ou um sapato novo. Ele era prático chegou em casa com tanquinho de lavar roupas, para facilitar a vida dela. Ela parou de sonhar com aquilo que gostava e se entregou ao trabalho de casa. Ele parou de ir para casa depois do trabalho e começou a fazer as coisas que gostava. Um dia era o jogo de futebol, a cerveja com os amigos, um joguinho de baralho. E assim a vida foi passando. Ela começou a sonhar em ser mãe. Ela queria uma menina, uma bonequinha para preencher o vazio que começava a tomar conta de sua vida. Ele queria um menino, e ponto final. Engravidou. .. Ela se achava linda no espelho com o ventre volumoso, aconchego da vida que crescia dentro dela. Ele a achava horrível, deformada pelo inchaço da gravidez, destituída de toda a sensualidade que havia nela. Ela sentiu que era hora e correu para o hospital. Ele, chegou horas depois, quando ela já estava no quarto com o bebê nos braços. Ela sorriu e lhe apresentou Gabriela. Ele apenas olhou indiferente e lhe virou as costas. Ela deixou que as lágrimas rolassem. Ele foi beber todas as bebidas que coubessem. Em casa, as coisas nunca mais foram as mesmas. Ela vivia para a filha e cuidava da casa. Ele vivia cada vez mais tempo na rua. Ela quis ir embora, mudar de vida. Ele disse que podia, mas que não que ela não teria mais vida para mudar. O medo a fez ficar. E assim se passaram os anos... Um dia, Gabriela também saiu pelo mundo. Ela nunca sentiu tão forte a solidão. Ela fechou a porta do quarto e não saiu mais. Ele, saiu pela porta da sala e não voltou mais. Ela chegou perto da janela e viu os carros pequeninos, pontinhos de luz cruzando a avenida. Ela abriu os braços e se atirou na noite. Escolheu voar com os anjos. Ele ainda continua sem entender porque.

maria do rosario bessas
Enviado por maria do rosario bessas em 05/10/2011
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