É um assalto! Feliz Natal e Próspero Ano Novo

É um assalto! Feliz Natal e Próspero Ano Novo!

Vando

Acordei-me com um pressentimento. Tomei banho, tomei café, escovei os dentes, vesti a roupa. Às 8 horas saí pela cidade, e nessa hora já fazia um calor intenso. Era manhã de 24 de dezembro de 1982; na pequena e pacata cidade de São Paulo Moleque, o dia estava começando como sempre, bastante tranqüilo. Seus moradores se dirigiam para o trabalho, uns para suas propriedades rurais, outros para as pequenas indústrias que existiam no município. Localizada na região Centro-Oeste do Estado de Sergipe, com um povo hospitaleiro onde todos se conheciam. A maioria de seus habitantes vivia da exploração da agropecuária e plantação de algodão. Também existiam três fábricas de beneficiar o algodão e uma de beneficiar leite gerando empregos para os moradores residentes na sede do município, possuía e ainda possui um pequeno comércio e duas agências bancárias.

Naquela manhã ensolarada véspera de Natal, os bancos e comércio como de costume abriram suas portas às 8 horas para atender seus clientes. Na praça Jackson Figueiredo estavam sendo montados o trivolí, a onda e o carrossel, pois à noite seriam iniciadas as festas de fim de ano. O prefeito municipal distribuía em frente à Prefeitura cesta básica para a população carente. De chofre vi um carro passar por mim, com quatro pessoas no seu interior, não consegui visualizar o modelo, mas veio na minha mente que eram pessoas estranhas. Naquele instante comecei a pensar em uma reportagem que li nas páginas policiais do Jornal “O Globo” que comprei quando fui a Aracaju, onde narrava com detalhe um assalto a um banco no centro comercial do Rio de Janeiro, onde um dos assaltantes foi morto por policiais.

Zé Birro abriu as portas de sua bodega mais cedo, pois esperava um aumento das vendas nesta véspera de Natal, e mandou seu filho, Birrinho, fazer um depósito de uma certa quantia em dinheiro no banco. Ao lado, Florival, que era farmacêutico, e tinha uma pequena farmácia, despachava uma receita a um paciente. Passei por Antonio Grilo, que em tempo de festa vendia cachorro quente, ia se dirigindo ao banco para retirar uma pequena poupança e comprar os pães, salsichas e outros condimentos para o preparo dos cachorros quentes, na esperança de faturar bem nessa noite.

Lá pela dez horas me dirigi a uma agência bancária para fazer alguns pagamentos; na entrada fiquei conversando com José Francisco, segurança do banco, que me disse que viu um homem desconhecido sentado em um dos bancos da praça olhando para a casa bancária. E também um Chevette de cor verde com três homens em seu interior rondando a praça. Acrescentando que veio em sua mente que poderiam ser assaltantes de banco, mas ponderou, isto nunca tinha acontecido na cidade, também não era muito freqüente no Estado. Aquela sua suspeita foi logo dissipada, pois só ouvia falar de assalto a bancos nos noticiários da televisão e nos grandes centros do sul do país, e se distraiu. Voltei a pensar na reportagem que li no jornal. Alguns bancários saíram da agência para lancharem em lanchonetes localizadas próxima a unidade bancária.

De repente a surpresa, um senhor de estatura mediana de terno e gravata, vinha em direção ao banco junto com jovem de tipo galego, de calça Jeans e camisa pólo. O senhor se adiantou com passadas rápidas e entrou no estabelecimento, eu também entrei junto com o desconhecido, virei o rosto e vi o jovem que vinha atrás encostando o revólver na costela do Francisco e anunciou “é um assalto”. Gelei. Pela surpresa e medo, vendo que o assaltante estava tremendo e com o revólver engatilhado, o guarda urinou nas calças, pois qualquer movimento que fizesse seria fulminado. Daí por diante outros dois bandidos entraram na agência e deram início ao assalto sob o comando de um senhor bem vestido, que tinha entrado antes. Um dos meliantes se dirigiu à gerência, e com o revólver em punho e o cão acionado colocou no ouvido do gerente Messias Rodrigues, que também fez pipi nas calças de tanto medo. Eu vi o segurança e o gerente com as calças molhadas, depois eles me contaram que aquilo era urina. O cliente Zé de Gracinha, que estava na mesa do gerente em pé, sentou-se na cadeira branco como um papel. Um outro bandido pegou o sub gerente, José Quincas, com o revólver em punho encostado nas costelas e saiu empurrando, foi quando o bancário disse “você está me machucando”, o assaltante retrucou “cale a boca filho da puta me entregue o dinheiro o mais rápido possível”, e saiu rebocando o coitado para tesouraria. Uma caixa do banco vendo toda aquela movimentação e tremendo de medo, desmaiou e foi aí que o “comandante” do bando disse “fiquem calmo, não reajam, pois ninguém vai sair machucado”.

Um dos ladrões teve a petulância de pedir a servente que estava tremendo e de cabeça baixa para levar água a bancária que estava desmaiada. O bancário, Luiz João, que tinha saído para lanchar, ia voltando todo ligeirinho de cabeça baixa e distraído, pois era caixa executivo e com certeza tinha clientes esperando na fila para serem atendidos. Quando entrou na agência um dos assaltantes colocou o revólver em sua cabeça e disse “entre devagarzinho”, então Luiz saiu pisando macio como um gato quando está querendo pegar um rato.

Todo cliente que entrava na agência era rendido e mantido com refém, inclusive eu. Pedro, um músico que estava no caixa sendo atendido, começou a tremer as pernas de tanto medo, já era meio amarelado e com a situação que estava passando naquele momento ficou todo amarelo. Os meliantes não roubaram dinheiro dos clientes que iam depositar ou pagar suas contas.

Depois que fizeram a catação de todo o dinheiro que existia na agência, os bandidos foram saindo de dois em dois, e o senhor que usava terno e que era o “chefe” do bando educadamente olhou para dentro da agência e disse “Feliz Natal e um Próspero ano Novo para todos”. José Quincas, o sub-gerente respondeu “pra vocês também”.

Vando
Enviado por Vando em 21/12/2006
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