Adorno empoeirado
“Sou feliz com a maternidade”.
Pronunciada essa frase, Denise saiu do consultório psicológico sem olhar para trás.
Quatro anos antes, sua mente era um sem fim de questões.
Depressão era a doença que a acometera, sem piedade. Quantas drogas ingeridas! Quantos dias perdidos no trabalho! Festas, inaugurações, viagens, nada mais cabia em sua agenda, exceto ela, a depressão.
Olhava para os filhos e lastimava não ser a mãe que prometera. O marido era um adorno empoeirado e esquecido na casa. Tinha um temperamento difícil. Cético quanto ao diagnóstico dado pelo médico da família, desprezava a saúde de Denise. Afundou-se naquilo que ele mais gostava de fazer, quando estava em casa: assistir à televisão.
Diálogos eram travados, em alguns poucos momentos da relação amistosa. Ambos, em seu silêncio assustador, eram veladamente descrentes das mudanças que se prometiam.
Ao longo dos dias, a medicação forte, a tarja preta a incomodava, dava seus primeiros resultados positivos. Denise observava que estar na depressão, trazia-lhe alguma lucidez e o palco da vida deixava de ser fictício.
Aquilo lhe era ambíguo, absolutamente confuso, pois sempre escutara falar que estado depressivo é seguido de dias insanos. Mas, para ela o caminho era trilhado às avessas.
Os filhos não entendiam o que acontecia a sua mãe, mas sabiam que algo bom estava longe de ser. Sofreram juntos. Não choravam, mas se compadeciam pela mãe.
Decidiu compreender os pensamentos, que se organizavam dia após dia, em seu cérebro acalmado. Mirava às pessoas nas ruas, ao seu redor, entre familiares e cria que fórmulas prontas, para o resultado da felicidade, não existem. Tudo o que via e analisava, não passava de momento. Sentia-se bem ao saber que colocar a sujeira sob o tapete, era uma aptidão inerente ao ciclo de pessoas conhecidas, ou não.
Olhou para a aliança colocada no dedo anelar, há quinze anos. Não se incomodou com aquela circunferência dourada, que já não cintilava como outrora. O embaçado dava-lhe todas as respostas do que fora seu casamento. Denise descortinou seu matrimônio. Assumiu que o amor de sua vida era apenas os filhos, nada mais do que eles, e tão simples assim.
Entendeu que cada um tem um amor para dar e receber, e o dela não era pelo sexo oposto. Como explicar isso às pessoas?
“Sem explicação, não há o que explicar algo consumado.” E ao pensar dessa forma, livrou-se da tarja preta e deixou vago seu horário, para o próximo paciente.
Por muito tempo lutava silenciosamente contra os clichês que diziam “os filhos são para o mundo.” Com toda verdade contida nessa frase feita, o resultado não a incomodava. Educara seus filhos para uma caminhada dentro e fora da casa.
Ao perceber que o manual de instrução para a vida nunca existiu, culminou o que sempre clamava por compreensão.
Sua vida era realizada através da maternidade, e nada mais.