SR. JOSÉ VENÂNCIO. (um velhinho andarilho)

Em 1.969, morávamos na Rua Jurací Magalhães, - Barra do Mendes- BA. Eu tinha 10 anos de idade, o mais velho dos quatro. A gente morava em uma casinha de "chão batido", não diria, em extrema pobreza; pois um certo dia tive a experiência de ver que, por mais dificuldades que a gente passa, tem alguém que está em situação bem mais difícil.

Era um final de tarde, estávamos todos em uma pequena sala, "um" dos quatro cômodos que tinha na casa, quando um senhor, idoso, aparentava 80 anos, talvez fosse mais novo; mas por ser um homem que vivia pelo mundo, o sofrimento o teria deixado desgastado, levando O, à uma velhice precoce; barbas amareladas, que deveríam ser brancas, calça e camisa de uma cor amarronzada, -talvez o mesmo problema da barba. - "Boa tarde"?! Disse Ele. A senhora pode me arrumar um pouco d'àgua? A minha mãe deu-lhe o copo com a água, Ele tirou do bolso, um pacotinho com um pó, ou eram folhas sêcas, pôs na boca e engoliu junto com a água. "Deus que abençôe a Sra. e os seus fiins". -Amém. Respondeu minha mãe.

O homem deu meia volta e deitou-se na calçada. Anoiteceu, quando meu irmão, "Deba", falou: "Mãe, o VEIM tá dormindo"! Bota Ele pra dormir aquí em casa!?

Minha mãe chamou o velhinho, e, so com muita insistência Ele aceitou entrar e dormir em uma esteira de palha, - que era cama de muita gente na época;- no outro dia, Ele amanheceu com febre e não aguentou se levantar. Minha mãe fez lá seus chás... bem, so após 3 dias, o Sr. José venâncio, disse: - Já estou bom; fíquem com Deus, Ele paga "ocês". - Amém. Respondeu minha mãe e o velhinho se foi, apoiando-se em uma madeirinha que lhe servia como bengala.

Um ano e talvez mais alguns meses, o meu irmão "Deba", viu o velhinho andando pelas ruas de Barra do Mendes e falou para a minha mãe, que teria feito careta para que o velhinho não o reconhecesse e voltasse para nossa casa; "que ja era outra" mudávamos mais que estação de ano. Minha mãe e o meu pai, quase morreram de rir. Quando... "Boa tarde"! Era o velhinho, que, perambulando pelas ruas de Barra do Mendes, procurava a nossa casa. Minha mãe o atendeu, pediu-lhe que entrasse, e Ele: - "NÃO, D. ZÉLIA; VOU APROVEITAR ENQUANTO É CEDO PARA ADIANTAR A VIÁGEM". Minha mãe perguntou-lhe: O Sr. vai para onde? - "NÃO SEI, D. ZÉLIA! EU VOU PARA QUALQUER LUGAR; MORO NO MUNDO". Abriu um saco que carregava com as suas coisinhas, de dentro tirou um pequena melancia e disse: -ME DERAM DE ESMOLA, D. ZÉLIA; MAS EU NÃO POSSO COMER MELANCIA; SOU MUITO DOENTADO; DÊ PARA OS SEUS "MININIM".- Deus é de "oiá" sepre "prôcês". Saíu andando rumo à estrada da Colina, e, percebí que minha mãe estava chorando baixinho. Eu e Deba, choramos com Ela. O Velhinho... não sei. Isso foi ha 41 anos atrás.

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São coisas que não tem como a gente esquecer; assim como não sabemos como será o amanhã.

Vange - Salobro -BA, 22 de setembro de 2011.