Noite de ressaca

Era noite e, ela sentada na sala, olhou pela janela e tentando divisar o mar.

Ouvir o som das ondas e não vê-las.

Ir à praia e não sentir mais o estranhamento de estar à beira do mundo. Já não procurava conchas, andava rápido ansiando um destino inexistente.

Gostava menos do mar. Não ria quando era levada pelas ondas. Não sentia prazer num mergulho na água gelada. Não via mais encanto em sentir o sal secando na pele até que virassem pequenos cristaizinhos que brilhavam ao sol.

Tinha medo de cacos de vidro na areia.

Tinha medo de água-viva.

Tinha medo de correnteza.

Tinha medo do sol.

Não era mais quem um dia já sentiu todo amor do mundo e sonhou ser clichê num campo de girassóis na Itália. Cresceu, dizia a si mesma. Cresceu para explicar a escassez.

Eventualmente chorava todos os sonhos que ficaram pelo caminho e mesmo que lutasse para estar de luto por si, sempre se cansava.

Tristeza cansa.

Ter dores de cabeça cansa também. Mas, isso ela não podia evitar. Seguia pensando e de tanto pensar, quando dormia sonhava com outros eus.

Teve épocas que considerou não mais levantar, porque o acordar não trazia nada mais que remelas e repetição das minúcias do protocolo diário.

Tristeza cansa.

Rotina cansa.

Estar no limite cansa também. Tinha bolas de ácido lático nas costas abaixo do pescoço, dizia sua psicóloga. Esferinhas de tensão fisicamente palpáveis e doloridas. Tensão onipresente, que ela, angustiada, se perguntava quando realmente elas começaram a se formar.

Tristeza cansa.

Rotina cansa.

Ser uma esfera de tensão cansa.

Ser alguém ou ninguém cansa também, e no fim ela decidiu continuar a ser apenas, só existir, vazia de significações.

Halina
Enviado por Halina em 20/09/2011
Reeditado em 08/08/2012
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