CORNILDO E MARGARIDA
Certa vez, saí pela noite, em busca de um Bar porreta, um local sossegado, de bom gosto, como este aqui. Sábado, inverno, a chuva não parava, teimosa, daquela do tipo “pega trouxa”, que parece que nem vai molhar e vai ensopando a tudo e a todos.
Rodei, rodei e acabei parando num boteco da periferia. A garganta já estava arranhando e não tinha como segurar mais. Cheguei, entrei, fui ao balcão, encostei os cotovelos e pedi um conhaque. Olhar atento a todos os lados, pois, o ambiente não era nada confiável. Nadinha de nada.
E ali estava eu bebericando meu conhaque, as conversas zoando pelo Bar, gente jogando sinuca, outros nas cartas e outros tantos contando causos. Um cheiro forte de cachaça vagabunda no ar. Numa mesa, no canto, estava um senhor, barba sem fazer, a mão esquerda segurando o queixo.
Nossos olhos se cruzaram. Eu o olhava atento aos seus olhos. De repente ele me olha como se me odiasse. Seus olhos faiscavam em mim. Levantou da mesa em que estava e veio cambaleando em minha direção. Pensei comigo.... Se eu correr o bebum me pega. Se ficar me mata no bafo. E resolvi ficar, como se nada estivesse acontecendo. Prestando mais atenção no seu andar, tropeçando no chão liso e cambaleando, fiquei mais tranqüilo.
E o danado vinha mesmo em minha direção. Fixei os olhos nele, semblante fechado, de bravo (eu sei interpretar legal), ameaçador. De nada adiantou. O bebum vinha vindo. Cambaleando mas vinha. Chegou perto de mim, apontou o dedo atrevido para meu nariz e disse:
- Foi você, não foi? Foi você...... Foi você que tava deitando com minha Margarida, não foi?
- Oh louco!!! Que é isso véio. Eu? Nem conheço tua Margarida meu amigo (quem sabe com esse tratamento ele aliviaria). Muito menos deitei com ela.
- Aceita um trago? Perguntei querendo demonstrar intimidade.
- Foi você sim. Esse bigode, esse jeito aí, claro que foi.....
E já estava pronto para me agredir, quando o bodegueiro felizmente interferiu:
Sorte minha que o Bodegueiro parecia ter credibilidade no pedaço. Ainda bem.
- Para com isso Cornildo. Não foi esse senhor não. Não foi ele. Ele não esteve lá não. Ele é novo aqui. Moro lá do outro lado da cidade, não é senhor?
Fiquei mais tranqüilo. Desarmei o espírito. Mas, mesmo assim, quase caí com o bafo do bebum.
- Então quem foi? Quem foi?
Perguntava chorando, demonstrando um desespero que até passou a me inspirar pena. Com o rosto todo molhado de lágrimas e descabelado, começou a chorar compulsivamente. Estranhei que o pessoal que estava lotando o Bar nem prestou atenção no incidente. O bebum voltou então cambaleando para a mesa, onde tinha uma garrafa de batida de maracujá, já pela metade. Cara moribunda, passando a mão pela testa, alisando, alisando e continuou a beber sua batida. Nessas alturas, já não era batida, era porrada mesmo.
E o bodegueiro então me explicou que aquela reação já era normal. Que ele era corno, mas não era violento. Que as pessoas nem tinham prestado atenção, pois, já estavam acostumados com ele. Explicou que a mulher dele o corneava, corneava e corneava, até que foi embora.
E cada vez que ele bebia - e bebia todo dia - todo homem diferente que chegava ao Bar, ele o acusa de ter deitado com sua Margarida.
- Foi você, não foi????
Essa pergunta ficava martelando minha cabeça, pensando no sofrimento do coitado do bebum. Ser corno já é danado de ruim. Ser corno afamado, ainda pior. E ser corno afamado e sem juízo, tanto pior. Mas cada corno tem o destino que faz por merecer. Se bem que a forma angustiante como fazia a pergunta, bem justificava a garrafa sobre a mesa e o seu jeito maltrapilho.
Acabei de beber meu conhaque, paguei e saí de fininho, esperançoso que o bebum não me seguisse. Quanto entrei no carro e arranquei, senti-me aliviado.
Mas fiquei, diria, intrigado com o caso. Voltei dias depois ao Bar, para conversar com o bodegueiro e saber mais sobre o bebum e sua história. Soube então, pela boca do bodegueiro, nas conversas regadas a mais e mais conhaque, e pelas malditas bocas dos manguaças fofoqueiros que freqüentavam o Bar, que a Margarida, ex mulher do pinguço, havia traído-o, ido embora e voltado para casa mais de 37 vezes. E ia novamente embora sempre que o Cornildo a pegava com alguém aquecendo sua cama.
Contavam que a Margarida era uma mulher formosa, seios fartos e tipo Raimunda. Que o Cornildo jamais supriu suas necessidades completamente. Ela sempre foi uma mulher "precisada" por demais, sempre com uma “queredeira" danada lhe cutucando as intimidades, acendendo as entranhas e bastava ver um bonitão que lhe desse trela, que já fazia labareda.
Na primeira vez que o Cornildo a pegou fazendo bobiça com um forasteiro, foi na própria sala da sua casa, no sofá mesmo. Daí o Cornildo, depois de correr atrás do safado, sem sucesso, encheu a cara e depois do porre curado, foi se queixar para o Padre, que lhe recomendou uma única e pacífica solução. O Cornildo voltou para casa e vendeu o sofá.
Depois vendeu o outro. Vendeu também a cama, a penteadeira, até a mesa da cozinha teve que vender para não matar a Margarida. Não pode desmanchar o banheiro, mas vendeu o chuveiro por uma mixaria e passou a tomar banho de caneca. Mas debaixo do chuveiro nunca mais a Margarida o corneou.
Quando pegou a Margarida fazendo uso de um vibrador importado, última geração, daquele que tem até ejaculação, importado da china, que ela comprou pela internet, ele descarregou o revolver que havia comprado no dito objeto amaldiçoado. Gastou todas as balas. Faltaram balas para utilizar quando pegou o flanelinha da esquina mamando as tetas da Margarida e com um pacote de bolacha na mão.
Ainda bem, se não teria cometido um crime. Ainda bem, disse o Padre, quando o Cornildo foi lhe fazer mais uma queixa da mulher, ameaçando que perderia seu lugar no paraíso, mas que iria tomar providências definitivas com os safados que seduziam sua bela e fogosa Margarida.
Então o Padre, para evitar uma desgraça maior, chamou a Margarida na Igreja e a aconselhou que fosse embora de vez. E ela foi. E o Cornildo daí mesmo é que caiu na manguaça e passou a ver em cada homem desconhecida que avistava, o seu rival, a pessoa que lhe havia germinado os chifres.
E ela realmente se foi, para outras freguesias. A Margarida era danada, alias, é danada. Aquela mulher realmente tinha “fogo no rabo” e em tudo mais buraco que possuía. Cheguei a pagar uma caixa de cerveja para os “amigos” que consegui fazer no Bar, para saber mais sobre a Margarida. nNão que tivesse interesse no seu fogo, apenas na sua história. Juro.
Soube então, que seguindo os conselhos do “seu” Padre, que ela teria então ido embora e está vivendo na cidadezinha de Corneópolis, onde depois de muito teste drive, sem que suas necessidades fossem saciadas, acabou tomando a decisão de casar, no modelo união estável, em regime 6/4. Isto mesmo, agora tem seis maridos, num casamento consorciado, vivendo e dormindo com seus seis maridos mansos, em um só quarto.
Mas não fiquem pensando coisa não, não fiquem maldando a coitada, pois, a Margarida é fogosa, mas não é mulher da vida. Nada de suruba, nada de orgia. Tudo dentro das conformidades. Só deita com um marido por vez. Um para cada dia da semana.
De segunda a sábado. No domingo ela folga dos maridos e vai passear numa cidade próxima, onde já está de intimidade com a delegada da comarca. Uma mulher decidida, muita eficiente, cumprindo suas atividades policiais sem usar arma. Na cintura, usa somente uma baita porchete. Mas a Margarida jura que está só experimentando, para ver se gosta da fruta. E está gostando. Que está apenas degustando pastel de pelo, mas se continuar tão bom como até agora, pede divórcio dos seis marmanjos e busca o Cornildo para temperar a relação. Diria assim uma pimenta para o Pastel de pelo.