Pousada de Tendinha
Pousada de Tendinha
Vando
Zeca chegou em casa correndo e sôfrego:
- Mãe, mãe, eu vi...
A mãe espantada, interrompeu-lhe: -“Você, Zeca, fica andando pela rua para ver besteira, não quero nem saber. Apronte, que nós vamos pra igreja orar, o Pastor e Joana vão falar hoje sobre sexo para jovens evangélicos. Você Vai ser muito interessante para você , pois já está ficando homem, vá tomar seu banho menino deixe essa cara de espanto, desembestado”.
- Já vou mãe! Respondeu ele, mas eu vi, não estou mentindo - resmungou Zeca para si mesmo.
José da Silva Nunes tinha 13 anos, morava com seus pais, no conjunto Marcos Freire III; menino inteligente e ativo. Chamado carinhosamente de Zeca, era bem comportado, nunca se envolveu com drogas ou furto, embora andejo e curioso. Em sua bicicleta percorria todos aqueles conjuntos habitacionais de Nossa Senhora do Socorro. Estudava sétima série do 1º grau, e seus professores observavam naquela criança, uma inteligência acima da média. Seu pai, Francisco Pedro, era marceneiro e sua mãe, Dona Joaquina, trabalhava em casa. Seus pais pertenciam a uma das diversas igrejas evangélicas do conjunto.
-“Já se aprontou Zeca?” - perguntou-lhe Dona Joaquina -“hoje não podemos perder a pregação do pastor Adão e da pastora Joana, é um assunto muito interessante para os jovens”. - “Já vou mãe”, respondeu ele.
Na igreja, já se encontravam os pregadores. O culto começou. Foram lidas algumas passagens da Bíblia, com as tradicionais louvações dos presentes. Em seguida, colocaram envelopes no púlpito para que os irmãos depositassem os dízimos. Atentos, os fiéis ouviam o Pastor Adão, enquanto ele falava da importância do tema sexo para os jovens, passando, em seguida, a palavra à Joana. Zeca a olhava de soslaio, enquanto ela pegava o microfone.
Joana apesar do pouco estudo, discorreu sobre a importância do sexo, alertando que os jovens de sua igreja não deveriam praticá-lo antes de se casarem, uma vez que isso iria de encontro aos ensinamentos de Deus. Enquanto ela falava, Zeca, atento, fixava a palestrante. Subitamente levantou-se e dirigiu-se para bem próximo do altar. Dona Joaquina, observando-o, repreendeu-lhe baixinho: -“Oh, menino curioso, vem cá!”. Enquanto isso, Joana, colocando-se como exemplo, contava que já tinha se casado uma vez e estava divorciada, e que só havia praticado o sexo quando estava de “papel passado”. Continuando, aconselhou que o namoro dos evangélicos não deveria ser prolongado, “namorou gostou, tem que casar rápido”. Acrescentou que já tinha um namorado, esclareceu que só praticaria sexo quando se casasse, e olhando para a platéia, concluiu: “Sigam meu exemplo”.
Zeca, quando ouviu aquilo, inquietou-se espantado.-“Deixe de chamego”, repreendeu-lhe novamente a mãe.
Na realidade, o primeiro casamento de Joana havia sido um desastre. Luiz Alberto, seu marido, havia sido seu professor em uma escola pública de Aracaju, e foi lá que a conheceu.Ele tinha pós-graduação e mestrado em língua portuguesa, além de ser engenheiro químico. Ficou atraído por ela, por ser uma jovem bonita e com uma compleição física acima das demais mulheres da região, apesar de ser uma menina pobre e moradora no conjunto Marcos Freire III. Alberto havia se divorciado da sua segunda esposa, só para casar com a aluna. Quando o pai da jovem soube do namoro, ficou furioso porque conhecia a fama de mulherengo atribuída a Luiz. -“Já foi casado duas vezes, e só quer a minha filha para desvirginá-la” dizia ele, concluindo que, certamente, depois a deixaria.
E o pai de Joana estava certo, o casamento durou pouco. A jovem não tinha uma boa formação cultural e se indispunha freqüentemente com a família de Alberto, que tinha em seu circulo familiar médicos, advogados e professores. Até que Alberto no início do casamento tentou persuadir a esposa a voltar a estudar. Mas ela não quis, dizia que não tinha cabeça boa. Por outro lado, os filhos de Alberto brigavam bastante com Joana. Contudo, a jovem queria ter um filho, pois garantiria assim uma pensão, mas ele nunca aceitou, era esperto. Por fim o casamento acabou. Ela voltou a morar com a avó e se dedicou mais ainda à religião.
Arranjou um emprego no comércio, ganhando o salário mínimo e demonstrava, no trabalho, ser uma mulher prendada, honesta e religiosa. No entanto, seu colega Pedro observou que eventualmente ela dava uma recaída, e se igualava às demais. Certa feita, contou-lhe que um outro colega estava olhando suas pernas, se achando a gostosa. Pedro, que era safadinho, descobriu sua fraqueza, e tentou conquistá-la: comprou uns pirulitos e a presenteou. Quando chupava a guloseima, olhava para Pedro passando a língua de maneira sensual e provocante no pirulito. Pedro disse a si mesmo: “ela é igual às outras, apenas se reveste de honesta e parece que tem um bocetão. Essa eu como! ”. Entretanto, não teve tempo de confirmar isso, foi demitido do emprego e não deu continuidade à conquista.
Também de vez em quando, Alberto, com saudade das belas pernas e seios, ligava tentando reconquistá-la e ter relações sexuais. Ela contava às colegas sobre as investidas de Alberto, mas afirmava que não queria nada com ele. Terezinha, uma outra colega, desconfiava e dizia: -“Sei não, essa mulher é misteriosa, ela está se encontrando com seu ex-marido, tenho quase certeza” Mas Joana no momento estava namorando José Carlos, um jovem simpático, 32 anos e evangélico como ela. Ele tinha uma motocicleta e, sempre que podiam, passeavam pela cidade, iam à pizzaria, já que ela gostava bastante de comer. Comia compulsivamente e estava um pouco gorda. Certa feita José desconfiou de algo, pois foi a sua casa e a esperou por quase duas horas, quando ela chegou por volta das 20:00 horas. Pensou: “Será que Joana está se encontrando com o ex-marido?”. No entanto, esforçava-se para tirar de sua cabeça esse incômodo pensamento, afinal ela dava-lhe plena confiança e dizia que não queria o ex de jeito nenhum.
Quando terminou o culto, Joana agradeceu a presença de todos e apresentou seu namorado aos seus irmãos e irmãs de fé. Zeca olhou para o rapaz “de fininho”, abaixando a cabeça pensativo.
-“Zeca vamos embora”- disse-lhe a mãe, notando que o filho sempre olhava pra trás. -“Olhe para frente, menino, senão você tropeça em alguma coisa e cai”- alertou-lhe.
De repente, Zeca, olhando para mãe, disse-lhe: -“Mãe, aquela moça que tava falando na igreja sobre sexo dos evangélicos, eu a vi entrando na pousada de Tendinha com um homem, mas não era aquele que estava na igreja não”.
D. Joaquina, espantada, indaga ao filho: -“Foi verdade mesmo,menino?.”
- “Foi, mãe”! - , respondeu o filho, resoluto.
Joaquina, indignada balbuciou: -“Meu Deus, não se deve confiar em mais ninguém”.