Quinta parte Da Luta Pela Sua Cidadania
Agora Catarina está arrependida de ter permanecido na sala de aula, parece que começa a cair na realidade, de que era ali somente uma intrusa que cantava o hino Nacional, onde o seu país não lhe dava o direito de estudar.
Ardia o seu coração por assistir aqueles colegas estudando e ela não tinha aquele direito.
Sai vagarosamente de cabeça baixa, mal consegue sair da porta, as lagrimas brotam, e para aumentar a sua frustração, ainda a professora chama-a de volta e diz:
_ Espere, vou mandar mais um comunicado para seus pais, para ver se, se convence de que não adianta voltar mais aqui sem a sua Certidão de Nascimento. Enquanto ela escrevia, Catarina permanecia em pé na porta.
Quando ela recebeu o bilhete junto vieram umas palavras que dizia:
_ Fale para seu pai deixar um pouco do baralho e te documentar, pois este ano é ano político e quem sabe estes que dão dentaduras novas para os desdentados, possam te contemplar com a Certidão de Nascimento. Ou então vai ficar para sempre sem estudar! Não me deixe mais falar-lhe nisto; eu creio que você sonha talvez demais, pois se sabe, que pobre demais não tem como estudar e ser alguém na vida. Sonha com uma coisa impossível; digo-lhe que isso te faz mal, que é melhor contar-se com a realidade; o que já sabe é brilhante, tem pelo menos a vantagem de saber assinar o nome, que lhe dará muita honra no dia em que se casar, pois não precisara colocar o dedo no lugar da sua assinatura.
A professora era uma senhora alemã, que havia vindo da Alemanha para o Brasil, ainda criança, com a imigração. Ela era uma pessoa ríspida e intolerante. Um dia ela havia contado um pouco de sua vida quando foi para a escola. Dizia que, quando era na hora do intervalo os estrangeiros eram vigiados pelos alunos brasileiros para não falarem a língua deles, mas sim o português. Parecia muito frustrada quando contava o sofrimento por ser castigados com penas rigorosas e humilhantes pelo militarismo, por muitas das vezes serem pegos se comunicando em seu idioma. Parecia que ela queria descontar nos seus alunos o que havia sofrido no passado.
Catarina cravara desta vez os olhos no chão, com a expressão vaga e morta de quem as apagou para as coisas desta vida. Ela deu uma estremecida, como se acordasse; levantou a cabeça, e lentamente com muita tristeza proferiu estas palavras em pensamento:
_ Talvez a professora tenha razão; mas eu não vou desistir nunca de estudar, nem que seja depois de velha, pois os meus sonhos são bons!
Ela balançou a cabeça, satisfeita de si mesma e murmurou bem baixinho:
_ Isso não é só um sonho, mas é uma realidade pura; vou me formar mesmo que seja com idade avançada.
Sobrava-lhe o sentimento de que ela acreditava ser digna.
Catarina, aparentemente buscava interrogar-lhe o pensamento, sem saber como se sair daquela situação. Ela rompeu o silencio:
_ Está bem.
Disse ela com um sorriso amarelo, meia querendo chorar.
_ Como não há motivo para eu ficar ardendo em cólera com você? Acudiu a professora. Não há uma coisa que me deixe mais com raiva do que falar com gente que não tem cérebro! Uma completa jumenta. A verdade é que, eu tenho razão, você me tira fora de mim com esse pouco caso que faz das minhas palavras quando falo que não adianta vim mais para a Escola.
_ Bom se isso é motivo para tanto desgosto para a senhora, não volto mais aqui, vou respeitá-la.
_ Você disse desgosto?_ Para mim nada! Agora para você!... Mas na vida é assim, se Deus quis que você viesse assim sem miolo! O que, que eu posso fazer? Pois este teu comportamento é mesmo de uma menina mal educada, ou é burra mesmo sem medida!
Catariana rapidamente sai de sua presença, como que não acreditava no que estava ouvindo, dando às costas segunda ordem.
_Vai guria! Diz a professora mão de ferro.
As lagrimas que ela havia engolido não teve muito esforço para que rolassem pela sua face vermelha e quente de vergonha. Catarina acompanhou aquelas palavras com um gesto de uma criança amedrontada, reprimida que a desentoava inteiramente a sua vida. Ela corava de medo e vergonha, o seu rosto denuncia o seu orgulho ferido. Os olhares para a professora foram amargos; com gesto de uma alma indignada.
A mágoa não era neste momento a de não ter a sua Certidão de Nascimento, neste momento isso até não valia muito, o que prevalecia mesmo era a pessoa que inferiorizava.
Aquelas ultimam palavras aquietaram o animo dela. Catarina estava ali pelo impulso da ânsia de querer estudar.
A professora, que possuía longa pratica na vida de humilhar os alunos sabia bem como arrasar uma criatura, com gesto e palavra manda-a, com o dedo apontado para a cara da Catarina, empurrando-a até fora da porta.
Catarina foi-se, um tanto magoada, e se convencera de que era ali uma importuna e que a felicidade de estudar não era para ela ali naquele ano.
Lá ia o bilhete seguro a sua mão de cabeça baixa percorria vagarosamente o carreador estreito, quase encoberto por uma vegetação conhecida no Estado do Paraná como guaxuma, uma vegetação bem flexível, que levava a molecada fazer sacanagem, amarravam uma a outra, bem rasteiro, e quando estava bem fechado, o carreador não dava para perceber as armadilhas, pois a vegetação alta cobria a menor. A armadilha funcionava de forma, que a vegetação era amarrada de um lado ao outro do carreador, e a festa era grande quando alguém caia. Ela é surpreendida por uma destas e caiu como uma madeira.
Catarina sempre tomava muito cuidada, mas neste dia ela não percebeu; estava muito distraída envolvida em soluços profundos, tropeça enlaçando seus pés e vai de cara ao chão, mergulhando o bilhete em uma poça de água.
Ela estava transpassada que não dava para aumentar a sua mágoa, levanta rápido, toda embarrada, e logo pensa:
_ Este bilhete não ia resolver nada mesmo, entregando ao meu pai! Eu tenho mesmo muita raiva é destes políticos que todo ano pegam os dados das pessoas e dizem que vão nos documentar e nada! Quem sabe eles quando saem daqui jogam dentro do primeiro rio que passam! Com certeza fazem isto.
No dia seguinte a Catarina volta á escola, pois queria outro bilhete, mesmo achando que não ia servir para nada, ela queria pelo menos tentar; quem sabe com um bilhete escrito pela professora as coisas iam mais adiante.
Repetem-se tudo de novo, recebe o mesmo sermão, ela tenta explicar a razão que estava ali, mas foi em vão, a professora mão de ferro não lhe - ouve, logo veio o, _ Cala boca guria! Você é mesmo uma cabeçuda!
A professora se volta para os alunos e dita a tarefa.
Catarina fala bem baixinho sussurrando no ouvido de sua amiga, Tereza dizendo:
_ Sou mesmo uma burra em vir aqui na Escola!
A Tereza fala ainda mais baixo:
_ Não, você não é burra.
Catarina estava ainda mais pálida do que já era.
Catarina estava olhando para a Tereza, que da de entender que ela quer lhe dizer algo. Então, ela aproveita quando a professora da às costas para escrever no quadro negro e pergunta:
_ O que é?
A Tereza diz que espere para a hora da saída. A professora mão de ferro murmura algo:
_ O que é gurias?
A Tereza lança os olhos no livro de português, e pega a ler.
Estava no começo do ano, e o pai da Tereza tinha muita influencia política, e mesmo sendo muito sedo para fazer política, já eram grandes as agitações no meio deste público. O pai da Tereza apoiava o partido do MDB, ( Movimento Democrático Brasileiro ), era o partido da oposição consentida. A ditadura, querendo uma imagem de democrática, permitia a existência de um partido levemente contrario. Contanto que ninguém fizesse uma oposição muito forte. Só havia os dois partidos. Arena (Aliança Renovadora Nacional) era o partido do governo. Cujos apoiavam descaradamente a ditadura. Um governo que não dava o direito dos brasileirinhos estudarem não tinha o direito de Cidadania!
A professora olha para as duas conversando, e dava para saber que ela tinha ali para elas um castigo com uma forte réguada; a régua que trabalhava na mão de ferro era de um metro de comprimento.
Esta régua fazia parte do corpo docente lá em cima da mesa, sempre de prontidão; onde a professora já olhava com os olhos arregalados como se fossem engolir as gurias, era só levantar pegar a arma bandida de todo o corpo docente, com a força da malvada, que não era pouco, ela derrubava nas costas, na cabeça, era onde acertasse.
A professora se volta para o livro e Catarina de cabeça baixa, imagina que a conversa da Tereza seja sobre algum benefício, que podia obter por meio da política, que ingenuidade! Ela esperava que pudesse ser favorecida no auxílio da Certidão de Nascimento; e logo ela levanta a cabeça e observa que a professora esta de olho no livro, acompanhando a leitura dos alunos, então meio por cima dos ombros da Tereza, Catarina ia lendo vagarosamente, mastigando as idéias e a paixão que tinha pela leitura. A observação era por cima do ombro esquerdo da Tereza, por que elas estavam sentadas nas carteiras do lado esquerdo da parede, o que a Tereza podia facilitar para Catarina, encostando o livro bem na parede, e sendo assim, ela podia enxergar com mais facilidade.
Como a professora esta concentrada na leitura, a Tereza virou-se rapidamente para traz e olha para Catarina, lhe entregando um bilhete que diz:
_ Meu pai vai apoiar a candidato a Presidência, Euler Bentes Monteiro, então ele pode ajudar a tirar a sua Certidão de Nascimento. No final da aula vamos lá à minha casa. E no final da aula como o combinado lá vai às duas amigas.
Para decepção da azarada, o pai da amiga não esta em casa, havia viajado a fim de tratar de negócios na Cidade de Cascavel. Catarina fica um tanto abatida, mas por hora não perde totalmente a ida à casa da amiga.
A amiga tira vagarosamente um par de congas já bem velhas de dentro de uma velha sapateira.
A amiga mostra de longe o conga velho e diz:
_ toma, é seu, pode vim pegar!
Era uma conga velha, mas ela estava descalço, não tinha calçado algum. Era uma miséria desgraçada, viviam muito, mais muito abaixo da linha da miséria daquela época.
Quando a Catarina suponha que vai ganhar o calçado, o seu coração salta de alegria.
A Tereza com olhar firme na amiga pergunta: _Você quer ganhar este conga?
Ela pensa que a amiga esta de brincadeira e diz: _Jura, que vai me dar mesmo?
A amiga cruzou os dedos beijando-os, jurando que estava falando sério.
Esta forma de juramento era muito séria.
Catarina diz:
_ Mas você vai ficar sem ele!
_ logo meu pai compra outro, pois ele tem muito dinheiro, e depois eu tenho mais calçados. Esse não vai me fazer falta.
A resposta da Catarina foi apresar em pega-lo, com tanta emoção, que mal podia acreditar, com um gesto rindo, meio com vontade de chorar de alegria.
A alegria durou pouco.
Elena a irmã da Tereza tomou a sacola, e, em seguida propôs-lhe um negocio, uma troca de serviço.
Ela daria a conga e em troca no dia seguinte Catarina ajudaria a lavar a roupa de oito pessoas, um acumula de roupa sujas de uma semana.
_É um ordenado bom as congas.
_Um par de congas usado é algo de ser doado, pois uma lavagem de roupa vale muito mais que isso.
Diz a Tereza de olhar feio para a irmã.
_Ora! Tem ai muitas meninas pobres que trabalham por o preço de um par de congas velho sim!
_Duvido que prestem! Aposto que você não encontra por um par de congas velho quem lave roupa bem sem estragar uma peça se quer! Eu tiro todas as manchas sem estragar uma peça, pois minha mãe me ensinou muito bem, a lavar roupa! Quero além das conga dois pacotes de bolachas Santa Maria!
Penso que é melhor pagar um pouco a mais e ter uma lavadeira boa, do que sofrer um prejuízo como o que sofreu outro dia com aquela pobre infeliz que você ia dar a ela um pacote de biscoitos, e ela manchou a calça de tergal do seu pai!
_Ah! A Tereza já te fofocou? Espere um instante.
A Elena deu um pulo na venda, e voltou lá de dentro com os dois pacotes de bolachas. Voltando a ter com a Catarina. Mas porem traz escondido, e diz:
_ Ande vamos!
Gritou-lhe da porta da cozinha, somente com as congas a vista:
_ É pegar ou largar! Eu só vou lhe pagar com as congas e, e esta bem paga!
Catarina pensa:
_ Ela teria que lavar as roupas no horário da aula, pois ela não havia desistido de freqüentar as aulas, mesmo sendo como ouvinte, pensava que se ficasse fora da sala de aula seria pior. Quem sabe nestes contra tempo não sugeria uma oportunidade de tirar sua Certidão de Nascimento, que lhe daria o direito ao um nome e o de estudar regularmente, e então ela não perdia nada em ir para a Escola. Fora do horário de aula ela ajudava sua mãe na roça.
Noêmia muito franzina, não conseguiria lavar tanta roupa sozinha. A Elena uma moça feita de dezoito anos, até um pouco robusta, capixaba, de pele morena.
Catarina volta o pensamento na escola e na situação que se encontrava, pouco lhe resolvia ir para a Escola, pois se pelo menos a professora mão de ferro colaborassem com ela, não custava nada passar as tarefas escolares para junto com os outros resolverem, sendo assim ela conseguia pelo menos aprender mesmo que não passasse de ano como os outros, ela aprendendo já era uma grande coisa.
A professora nem chamava pelo nome da Catarina na sala de aula, a não ser para lhe humilhar. A chamada era mesmo só para os matriculados.
Subitamente ela recusa-se a negociação, pensava:
_ O conga era bonito diante dos seus olhos, mesmo sendo velho, pois nunca havia calçado um.
Foi então que Elena, com as congas nas mãos veio esfregá-los um no outro, na vista de Catarina, como uma tentação. Realmente, era grande o desejo de Catarina calçar as congas; uma conga velha já bem desbotada de cor azul marinho.
Ela não queria recebê-lo sem o acompanhamento dos pacotes de biscoitos, mas custava também recusá-lo.
_ Anda, guria! Vamos tome aqui as congas!
Dizia a Elena, passando a conga de uma mão para outra, como se fosse uma coisa muito valiosa.
Catarina ainda silenciosa pensa:
_ Se a Elena não tivesse visto nada, que mal teria em a, amiga lhe presentear, pois ela tinha outros causados e dinheiro para comprar mais.
Catarina deitou-lhe outro olhar, nas congas nas mãos da Elena, tanto se ilude com a vontade de ter aquele calçado, não pensa nem mais um segundo e diz:
_ Me de ai.
A Elena deu-lhe, e Catarina, já coloca nos pés com sujeira e tudo, num alvoroço que não dava para exprimir aquela felicidade; a conga estava com ela, com os pés apertadinhos dentro deles, sentindo um pouco desconfortável, pois vivia o tempo todo descalço. Restava agora realizar a tarefa da lavagem das roupas, para obter a conga, pois só calçou para experimentar.
O combinado era; toma lá da cá. Só no dia seguinte no horário da aula realizaria a tarefa.
Como enganar sua mãe não era difícil, ela nuca ia à Escola saber se Catarina realmente estava lá.
Catarina estava em fogo, ansiosa para realizar a tarefa que lhe dava o direito de andar calçada. Ela esta em brasa, ansiosa que o pai da Tereza chegasse, e ela pudessem falar com ele a respeito da Certidão de Nascimento.
É hora de ir para roça, chega a casa depressa tira o uniforme branco e a saia azul marinho já bem desbotada; arruma o cabelo amarrando-o bem em cima da cabeça com um elástico velho cansado, e se retira para a roça.
Ela de manhã trabalhava na roça e das onze as quatorze horas na Escola, e das quatorze até a noite na roça novamente.
Quando ela chegava da roça só dava tempo para tirar a roupa de serviço dar uma lavada no corpo e fazer o seu penteado, com um pente de chifre, ela erguia o cabelo bem encima da cabeça prendia-o bem com um elástico ou uma tira de tecido velho, e colocava o uniforme.
Na volta da Escola para casa era mais rápido, pois era só tirar o uniforme e entrar, dentro da mesma roupa e correr para a roça, até ao escurecer.
As tarefas escolares eram resolvidas a noite a luz de lampião. Só que agora por não estar matriculada, por não ter A certidão de Nascimento ela só era aluna ouvinte lá na Escola, mas as tarefas ela pegava com a Tereza, na esperança de um dia ser premiada com o direito de ser uma Cidadã Brasileira, que até então não era Cidadã de lugar algum
No dia seguinte a labutação da lavagem de roupa começa. Estava lá elas de chapéu de palha. Um calor escaldante lhe sobrevinha com o calor do sol das dez e meia que quase lhes cozinhavam. Catarina de vez em quando largava a roupa em cima da tabua de lavar para se esticar as costas, que estava já horas envergada, com os pés todo dentro da água. Do joelho para cima estava em estado febril e a baixa do joelho estava derretendo com a força da água que passava entre as pernas. Ela lavava as roupas, molhava as roupas muito sujas na água do riacho, torcia-as, molhava-as, novamente, voltava a torcer. Ensaboava, escovava-as, molhava-as novamente, e voltava a torcer. Ensaboava e torcia uma, duas, três vezes. Depois enxaguava, dava uma molhada, agora a afunda, na água novamente. Bate a roupa na tabua, e da mais uma torcida e mais outra, torcia até que ficasse pingando muito pouco.
Resmungava a insolente bruxa idiota, com aquele tipo parado com um cigarro na boca, apurava as gurias. A Tereza fazia de conta que não ouvia os resmungos, assobiava acompanhando, uma musica que tocava pela Radio Colméia de Cascavel; Que Beijinho Dose com Tonico e Tinoco, e junto dela, ia a melancolia da Catarina, suspirando e batendo a roupa na tabua, automaticamente como se fosse escrava; ao passo que ela levantava e abaixava mergulhando a roupa na água, o corpo tremia-lhe todo, e ela de vez em quando lavava o rosto para refrescar o calor do rosto e aplacar o suor que escorria por toda a face, e então um suspiro abafado saia de seus lábios, horas depois:
_Já estamos quase terminando, tem como nós comer as bolachas que você trousse?
Acode com olhar humilde como um boi de canga, a Catarina já caindo de fome.
Elena furiosa retruca:
_Já é tempo de terminar! Mas é um despautério querer comer antes de terminar o trabalho!
_Mas são quase meio dia e eu estou só com um gole de café no estomaga. Estou quase em jejum!
_Sem terminar o trabalho nada de comer; e ponto final. Vamos logo, pois estou cansada de esperar duas molengas! Se fosse eu sozinha já tinha terminada!
As duas iam terminando já bastante cansadas pelo serviço. Agora é hora de recolher as roupas secas penduradas na cerca de arame. Num instante foram colocando-as, todas dobradas em cima de uma corriola forrada por um lençol. Em seguida retornaram para casa. E Catarina entrega o serviço recebendo o pagamento, sai correndo para a casa, come as bolachas, molhando-as com água; e não demora em ir para a roça; que trabalha até cair o sol. A Elena resolveu dar as bolachas também.
Catarina recebeu as congas com muito custo, tendo a ajuda da Tereza, na lavagem das roupas, apesar da Elena haver escolhido as mais sujas para ela lavar, o serviço foi realizado com eficiência, e assim se deu, serviço para lá e conga para cá.
Catarina, a pobre diaba estava com as tripas grudadas uma nas outras de fome, pois o horário da aula era das dez as quatorze horas, e o resto do dia trabalhava na roça com sua mãe, e quando ia a escola era lá que tinha a sua refeição, pois a comida em casa era regada! A sua mãe não lhe prepara a sua pobre refeição, acreditando que ela ia almoçar na Escola! Ela indo lavar a roupa para ganhar as congas, perdeu o almoço nos dois lugares, na roça e na Escola.
No dia seguinte é sábado, e Catarina esta sentada sobre uma raiz de um pé de Santa barba já bem de tardezinha. Quando a Tereza e outras amigas chegaram para brincarem de esconde, esconde, mas ela não se dispõe a brincadeira, estava estudando o texto litúrgico; no dia seguinte ela ia para missa calçado com as congas, e isso lhe deixava muito feliz e entusiasmada para a leitura.
Aquela noite parecia não ter mais fim. No dia seguinte lá estava toda anafórica, pois não tinha nem um calçado agora com uma conga!Isso era demais!
Entra a noite, mas as horas pareciam que iam à noite adentro, muito vagarosamente; parecia que esta noite é diferente das outras. Catarina imagina ali, com os livros e os pés calçado, matriculada e estudando. Não trocava aquele momento por nada desse mundo. O documento tão sonhado que daria o direito ao um nome e a estudar, ia venerar aquele documento como se fosse seu Anjo da guarda, pois dependia dele para que as portas da Educação se abrissem. Mais um instante na cama apertada, onde dividia uma tarimba velha com mais três irmã, ela ainda pensa em uma forma de enganar sua mãe sobre a negociação das congas; logo fluiu uma idéia, vai dizer que havia ganhado da Tereza. Então a Tereza confirmá-la-ia, sem nem um problema. Ainda continua a pensar: _ lembra-se, do dia em que teve o maior arranca rabo com a professora:
_ Catarina!
Berrou a professora.
Porque puxou os cabelos da colega?
Catarina respondeu que ele havia acusada-a de ladrona.
_ É mentira! Protestou o garoto.
_ que disse ela? Perguntou a professora.
Catarina repete a acusação que recebera. Logo quase toda a sala gritou: _ ladrona, piolhenta, piolhenta...
_ Calem-se, seus diabinhos! Berrou novamente a professora encolerizada a bater na mesa com aquelas mãos pesadas. Em seguida trás Catarina para o castigo alegando que ela havia tirado a atenção da aula. Que os problemas na Escola quem resolvia era ela.
Catarina logo que se viu livre da punição, não dava para esconder no rosto a expressão de raiva, que levou a fazer um gesto maroto para a guria que havia lhe acusado.
_ Ah! O que é isso? Exclamou a Professora.
E voltando-se, para Catarina disse-lhe, que voltasse para o castigo.
Ela resistiu à outra punição. A professora se desespera com a situação, muito nervosa apela por puxá-la, pelos cabelos.
Catarina agarra a mão dela e prega-lhe os dentes na mestre.
_ Ai! Um! Oh, diabinha! A professora vermelhou de cólera, prende a guria no meio das pernas, até que aparece um reforço que ajudam a colocar Catarina a novo castigo; isto serviu de escárnio da parte se alguns alunos e, quando chegou a casa, a mãe já estava informada do acontecido na sala de aula, deu-lhe ainda uma sova doida e fez ela pedir perdão, a professora no meio da rua, quando ela estava passando na charrete indo para casa.
Desde esse instante, todo o sentimento de humanidade, Catariana, transformou em desconfiança sistemática pelas pessoas de pele branca. Passou a fazer muito mau juízo dos povos europeus.
Somente a Eva, a mulher considerada uma rapariga, pelas mulheres de “famílias”; veio ter com ela, que depois de lhe abraçar, perguntou se estava muito magoada com aquilo que havia acontecido, as lagrimas rolaram, mantendo segredo, não falando nada, pois o que ia resolver?
Como este, e outros acontecimentos se deram na meninice de Catarina. Ela ficou muito medrosa e insegura, mas porem muito persistente. O sono chegou e ela fez a oração deitada, quase dormindo, que nas ultimas palavras ela, já adormeceu. Não viu a hora que dormiu. Na madrugada ela começou a gemer e sua mãe veio logo lhe atender. Ela estava ardendo em febre. Minha
filha, o sereno da noite é perigoso. Catarina tomou um copo de chá de folha de laranja adoçada com mel e uma cibalena. A D. Ondina permanecia de prontidão sentada a beira da cama, quando levantou-se, e abre uma brechinha da janela e diz:
_ Nossa, Catarina antes do sol aparecer, tenho que jogar água nos arvoredos e no jardim, pois a vegetação esta toda coberta de geada. Catarina se preocupa com o seu jardim, onde se refugiava para rabiscar os seus versinhos nos papeis que o açougueiro embrulhava a carne que nas poucas vezes que era comprada.
_ Amanha eu vou amanhecer bem, e então lhe ajudo jogar água nas no jardim.
A sua mãe com seu termômetro natural abaixa-se, sobre a Catarina, curvando-se, delicadamente encostando a boca na sua face e na testa, com os lábios fechado, como fosse lhe beijar, levantou-se, e diz:
_ É, a febre deu uma aliviada vou me deitar mais um pouco.
A sua mãe tremia, pois o frio congelava enquanto cuidava de Catarina. No amanhecer do dia levantou-se, meia tonta e jogou, água por todo o jardim e também nos arvoredos; e foi tomada por uma tremedeira, que quase não chega a cama, e logo a sua mãe acorda e corre para acudir as plantações da geada, mau sai a voz roca pela, vindo do resfriado da noite anterior e se agrava com o levantar cedo.
A sua mãe:
_ o que é que há minha filha? Você foi fazer arte de pegar uma pneumonia guria?
Catarina já estava novamente com febre. Os lábios ressecados e olhos vermelhos todo lagrimejando, pela febre. O seu pai, bom pai que sobre doença, que aparecia na família, ele preocupava-se, exageradamente. Que sempre foi reconhecida esta preocupação, quanto a saúde, ele não arredava o pé de perto do doente, enquanto não tinha a certeza de que estava tudo bem. Nisto ele sempre fora fiel a família. Ele chegou quando a D. Ondina já preparava outra xaropada de chá de folha de laranja com alho e cibalena.
Quando o cheiro chegou as suas narinas, ela teve náuseas. Então o pai entrou e ficou ciente de que Catarina estava tomada por uma febre, ele fez sinal para D. Ondina, para que se afastasse e pegou a xaropada da sua mão, e deu a Catarina, que foi tomando de gole em gole, que parava freqüentemente para respirar. Era como uma faca lhe atravessasse o pulmão de um lado para o outro.
O pai não demora em mandar a Terezinha à farmácia buscar o farmacêutico para examiná-la. Que não demorou em vir atender a enferma. Enquanto ele não chegava o pai e a mãe esfregavam os dedos em uma vasilha de sebo de carneira, fazendo massagem, eles não sabiam o que
fazer, tentando retirar dela aquela dor aguda que não deixava que sua respiração fosse objetiva. Aquilo eleva a preocupação de um pai que não tinha do que se dispor para salvar a vida de sua filha.
Então ela disse:
Estou melhor meu pai; a dor não esta mais tão forte.
O Farmacêutico preparava uma mistura de medicamento para lhe aplicar, e então não havia nem mais uma duvida. O farmacêutico deu o diagnostico:
_ Ela esta com pneumonia.
O medo do seu Florisvaldo dobra e diz:
_ E, agora, você que é farmacêutico formado que devo fazer?
_ Olha seu Florisvaldo o que eu posso fazer é lhe orientar a levá-la, ao hospital, pois ela precisa de um internamento.
A mãe levantou os olhos para o seu Florisvaldo, com olhos quase vertendo as lagrimas diz:
_ Nós vamos salvar a nossa filha. Você vai conseguir dinheiro, para tirar ela daqui, tenha fé.
Na mesma hora o pai sai a procura de um empréstimo, que naquele momento era mais fácil encontrar esmeralda na rua, do que encontrar alguém que lhe empreste alguns centavos.