Contos da terra II
Pirituba era do tipo aluguel. Não tomava conhecimento da causa, só do dinheiro. Sua fama corria terras e a garantia era total. Num dia destes, Coroné Firmino mandou chamar:
- Coisa pouca. Um tar de Migué Maluco. Tá atrapaiando meus plano na região e não quer vender a terra.
- Cinco mil.
- Fechado.
- Dois e meio na ida e dois e meio na vinda
- Fechado.
Pirituba permaneceu parado na varanda enquanto o Coroné foi buscar o combinado. Olhou em volta da fazenda e lembrou dos tempos de agregado junto com o pai e das muitas humilhações que sofreu junto com o velho Bina.
- Tá aqui
A voz grave do Coronel, trouxe Pirituba de volta.
Rapidamente pegou a sacola e montou no cavalo. Foi-se seguindo a orientação do contratante.
Sempre que saia a serviço evitava pensar. Quantas almas enviara ao Criador? Já não tinha a conta.
Duas horas de cavalgada e avistou a casinha. Pobre e distante. Apeou e passou a caminhar pelo risco de terra. Observou um cachorro que devolveu com latidos. Viu uma vaca e duas cabras. Ao lado do terreno uma pequena roça de legumes. De repente a porta se abriu. Pirituba parou e esperou. Um menino, de mais ou menos uns dez, saiu e encarou o homem.
- Quem é o senhor?
- Cê mora aqui moleque?
- Sim.
- Seu pai é o Migué?
- Sim.
- Cadê ele?
- Tá la dentro.
- Quero falar com ele.
- Tá bom... Mas o senhor vai ter que vir aqui dentro.
- Não. Prefiro falar com ele aqui.
- Mas ele não pode...
- Por quê?
- Vem vê.
Pirituba resistiu um pouco, mas a pressa foi mais forte. Entrou. Viu alguns "moveis" feitos a mão. Uma moringa de barro. E lá no fundo uma rede. Se aproximou e viu um homem, quase uma caveira, que dormia profundamente. O menino sentou ao lado e passou a molhar um pano e passar na cabeça do homem.
-Ele tá doente.
Disse baixinho.
Uma sensação de tristeza tomou conta do duro coração do matador. Pirituba olhou o menino e se viu numa situação parecida. Pensou no que seria daquele moleque depois que o pai...
Saiu da tapera. Montou no cavalo e voltou pra fazenda. Desta vez foi pensando.
Ao chegar encontrou com o coronel. Seu rosto era de surpresa.
- O que aconteceu Pirituba?
- Nada. Só não matei.
- Como assim "não matei"...
Pirituba sacou o revolver e disparou contra o coronel e saiu rasteiro... Nunca mais se ouviu falar dele na região.