Sarcasmo da vida...
Estava eu debaixo daquele maldito chuveiro há horas já, duas horas pra ser mais exato, é engraçado sabe, a vida é engraçada, na verdade hilária. Uma hora você é feliz com sua maldita namorada, a agrada, da um dos maiores presentes de aniversário que já pode dar a alguém, não algo caro, mas sim algo digno de um amor.
Lágrimas, lágrimas e mais lágrimas, é tudo que consigo ver, da pra sentir elas rolarem pelo meu corpo enquanto estou no chuveiro, sentir em que parte elas estão, pois mesmo com o chuveiro no “hot” sinto a frieza delas percorrendo minha pele. Também é engraçado o modo como fui cego, talvez eu não quisesse enxergar a verdade, que ela não me chamava mais de amorzinho, ou de benzinho e pensava que era por que tinha se acostumado com meu nome, quando na verdade ela guardava essas palavras para outro.
Raiva. Esse é um dos piores sentimentos humanos, é como uma fuga instantânea, a pessoa te dá um leve motivo para ter ódio, e você o tem. Só para não encarar de forma mais adulta, porém também mais sofrida toda aquela situação. Não posso ter ódio ou raiva, não apenas por que não é certo, mas também não consigo ter nenhum sentimento negativo por ela, nem tão menos por ele. A propósito, qual a culpa deles?
Hilário também é o modo como trouxe duas coisas comigo para debaixo do chuveiro, uma gilete (sim, estou pensando em me matar), e o telefone sem fio de minha casa (sim, eu ainda tenho esperanças de que ela se arrependa do que ela fez). Quase todos os momentos tristes de minha vida são desabafados aqui, debaixo do chuveiro, a água quente caindo no meu corpo trás um alívio tão bom pra minha alma, mas as lágrimas frias ainda me incomodam. Queria parar de chorar, nem que só um pouco.
Agora me sento no chão do banheiro, estou cansado, cansado de sofrer, de chorar, de tentar amar alguém sem ser trocado, traído ou jogado fora. Olho pra gilete, e a lâmina afiada parece tão tentadora, tão bela e serena a ponto de tranqüilizar minha alma. Mas uma voz na minha cabeça me chama a atenção, parece a voz de meu avô:
“Nem sempre a saída mais fácil é o melhor caminho a ser tomado...”
Vovô era muito inteligente, sinto falta dele, mas ignoro os seus conselhos, pego a lâmina afiada, e coloco em cima de meu pulso, fecho os olhos, respiro fundo e...
O telefone toca, me sentindo incomodado respiro fundo mais uma vez e atendo, ouço aquela voz tão calma, pura e perfeita, do outro lado da linha chamando meu nome, era ela:
- Acho que esqueci algumas coisas minhas na sua casa, se não for muito incomodo, vou ai pegá-las.
Por um instante a raiva retorna a mim, que audácia, vir aqui depois de tudo, terminamos há apenas dois dias, mas decidi me controlar. Afinal, eu havia dito que estava tudo bem, decidindo me mostrar forte e não chorar, disse que só queria que a felicidade dela e escolhi dar a ela os parabéns pelo novo namoro, tentar continuar a amizade. Se alguém tivesse culpa, esse alguém seria eu. Acalmo-me, a ouço me chamando no telefone:
- Alô?
- Desculpe, só me distrai um pouco... Tudo bem, passe aqui quando quiser... Sempre será bem vinda, sabe disso.
Terminamos a conversa como amigos, olho para a gilete e a jogo no ralo, a voz dela me deu algo para continuar vivendo, algo que odeio sentir, deu-me esperança. Não a esperança falsa de ter ela de volta pra mim, não essa esperança que tanto odeio, mas sim a esperança de esquecê-la e voltar a amar novamente outra pessoa, pois essa é uma esperança verdadeira, de algo que pode acontecer. E mesmo que algum dia ela queira voltar pra mim, dizendo que tinha cometido um erro, que nesse momento meu coração chore, grite, ou esperneie, eu não a aceitarei de volta nunca mais, pois ela deverá aprender com esse suposto “erro”.
Esse é o sarcasmo da vida, a mesa virar quando você menos espera, e você é pego por qualquer merda que aconteça, seja sua namorada que te trai com outra mulher, ou seu pai que após ter sobrevivido a um câncer morrer de gripe, acredita nisso? Gripe! Por que o sarcasmo é um tipo de ironia só que uma ironia engraçada, pelo menos para mim. Ergo-me, desligo o chuveiro e paro de chorar para poder voltar ao meu sarcasmo de minha vida.