A Espera de Lola.
Quase 21h15min o ônibus Sul rumo ao Centro parou na rua João Afonso Nobre, dele Lola desceu cuidadosamente, cada degrau, seus sapatos não eram confiáveis. Ainda não havia chegado ao seu destino, faltavam três quadras, mas os seus pés já gritavam de dor. Devia haver um assento preferencial para as mulheres de salto alto nos ônibus, pensou ela que estava acostumada ao seu sapato Anabela vermelho e velho.
O tempo estava chuvoso, a qualquer hora o céu poderia desabar. Lola não se preocupou em trazer a sua sombrinha pois sabia que voltaria de carro e teria uma ótima noite. Ela dava passos pequenos como se a qualquer momento pudesse ser traída por aquelas armas que estavam em seus pés, sem contar no medo de suar e estragar a maquiagem. Por que fui deixar a Shirley me arrumar?
Chegou 21h20min no restaurante Divini. Ela definitivamente não estava acostumada com aquele tipo de ambiente, só de pensar nos diversos talheres para cada tipo de comida já fazia suas mãos suarem. Na recepção, uma moça alta, loira, magra e que parecia ter acabado de sair de uma página da Vogue, olhou-a como se estivesse trajando as roupas de um andarilho. A Shirley me garantiu que este vestido é um atestado de mulher estilosa e de classe alta.
- Boa noite - disse a moça, que parecia não querer respirar aquele ar.
- Boa noite! Eu fiz uma reserva em meu nome... Lola, Lola Ambrósio.
- Hum.
Hum o quê? Pensou Lola enquanto observava a moça digitando em seu computador freneticamente.
- Mesa 07, próxima ao banheiro masculino.
Lola pensou em protestar, mas a noite ainda seria muito boa para estragar com isso.
Ela havia combinado 21h30min o encontro, faltavam alguns minutos. Acredito que Ele deva ser daqueles pontuais sistemáticos, nem 21h29min, nem 21h31min, ele chegará na hora.
Um sério garçom entregou o cardápio para Lola, mas naquele momento ela disse que queria apenas uma água sem gás. O homem a trouxe prontamente. Deve ter pego água da torneira, será que terei que pagar por isso?
Já havia passado alguns minutos e Ele ainda não havia chegado, Lola falou para si mesma que era normal se atrasar um pouco, ela que era muito ansiosa e chegava adiantada.
Na mesa ao lado estava um casal de meia idade. Sérios e quietos, o assunto já devia ter acabado. O homem se limitava a cortar a carne em seu prato enquanto a mulher apenas tomava o seu tinto. Obviamente eram casados há muito tempo, não por causa das alianças, mas pela visível falta de novidade e paixão que existe nos jovens amores. Eu nunca ficarei assim com Ele, se bem que devo me apressar para casar, o tempo já está começando a ser rude comigo.
Quase 22h00min, o restaurante estava cheio e Ele ainda não havia chegado. Acho que não soará desesperado se eu ligar para ver o que aconteceu. O telefone deu dois toques e em seguida o sinal de ocupado. Ele não deve ter desligado, impossível, vou esperar mais um pouco.
Era embaraçoso ficar sozinha em uma mesa. Da recepção, a moça a olhava em tom de deboche. Sorte para a Lola que não era a única solitária no restaurante, do outro lado estava um homem corpulento que parecia estar comendo a coisa mais deliciosa do mundo, provavelmente ele até preferia ficar sozinho, a comida era toda para ele. Era fascinante ver o homem, era excitante para ela ver alguém com tanto prazer ao comer, mas Lola era ruim de garfo, o que era possível ver através de sua aparência desnutrida. Ela já não aguentava mais pedir água, então para não ficar feio decidiu pedir um vinho.
Aquele era o primeiro encontro desde que se conheceram na festa da Shirley. Foi uma loucura! Eu não esperava que Ele se interessasse por mim, sou tão... comum. Apesar de ser inexperiente em relacionamentos, ela estava gostando do que estava acontecendo, nem acreditou quando Ele aceitou sair com ela após o terceiro convite que fez ao telefone. Aquela era a noite do amor, mas por que Ele estava demorando tanto?
Após 01h30mim de atraso o restaurante já tinha diminuído o ritmo. Ela havia tentado ligar diversas vezes, mas sempre dava sinal de desligado. Até que ela recebeu uma mensagem em seu celular, era Dele e dizia...
"Aborta ai nos falamos outra hora"
Nada mais.
Lola se sentiu fraca, humilhada, talvez era a mistura da notícia com o vinho. Não sabia que reação deveria ter, então ela apenas se afastou delicadamente da mesa e se levantou esboçando um doce sorriso. Deus, dê-me forças para sorrir. Enquanto caminhava rumo ao caixa, ela sentia que as pessoas a fitavam com pena, não tinha coragem de erguer a sua cabeça e encará-las.
Na saída, a recepcionista a olhou de uma forma diferente de antes. Era compaixão. Disse para Lola:
- Tchau... boa noite.
Lola deu um sorriso tímido, mas não respondeu.
Estava chovendo, o que a fez prometer a si mesma que levaria consigo a sua sombrinha sempre que o tempo estivesse estranho. Vendo que não conseguiria correr até ao ponto com aqueles saltos, ela os tirou e disparou pela rua.
Chegou ao ponto no momento que o seu ônibus estava para partir. Ela estava encharcada e descalça ao entrar quando o motorista disse:
- Noite difícil, hein? Vi no jornal que amanhã será melhor.
Ao ouvir isso o choro apertou em sua garganta. Por favor, Lola! Não demonstre a sua fragilidade na frente dos outros. Amanhã será melhor? Sim, nada melhor que uma boa noite de sono e um novo dia para melhorar.
Aquele não era o seu final, mas definitivamente Lola seria feliz.
E o ônibus Centro rumo ao Sul partiu.