O VESTIDO COR DE ROSA
Naquela belíssima manhã ela terminou seus afazeres domésticos que habitualmente fazia, com um doce sorriso nos lábios.
Retirou cuidadosamente do pequeno guarda roupas, o vestido cor de rosa.
Dos seus três vestidos destinados às grandes ocasiões, aquele era o seu preferido
O abraçou carinhosamente, deixou as lágrimas de alegria rolar pelo rosto.
Em silêncio agradeceu a Deus Pai, a felicidade do momento.
Com muito cuidado separou o sapato novo, deixou meias e as roupas íntimas prontas para o uso.
Fez uma leve maquiagem, como era o seu costume nas grandes comemorações.
Feliz pensava: _ Vou deixar tudo em ordem, assim que vierem me buscar... Estarei pronta. –
Enquanto esperava preparou um café para servir aos familiares quando chegassem.
Sua alma estava em festa.
Vivenciaria naquele dia, uma alegria, uma felicidade, destinada a pouquíssimas mulheres neste mundo.
Até a natureza colaborava, apresentando um sol iluminado com um céu de um azul fascinante.
Assistiria naquela data o batizado do tataraneto.
Sorriu ao imaginar o garoto já grandinho, confundindo as palavras ao chama La dizendo: _ “tartatavó...”
Lembranças da infância dos filhos e filhas vieram à sua mente, depois vieram as lembranças dos netos, netas, bisnetos, bisnetas, e agora a imagem do tataraneto, enchia seu coração de felicidade.
Pacientemente ficou esperando vierem buscá-la.
Apesar da idade se mantinha uma mulher saudável, lúcida, e otimista.
Lembrou da última visita ao médico.
O geriatra com veneração disse: _A Senhora está de parabéns... Já passou dos 85 anos e tem uma saúde de causar inveja aos jovens... –
O filho mais velho que carinhosamente a acompanhava falou:
_ Também Doutor.. Minha mãe é um exemplo de vida, nunca fumou, nem bebe bebidas alcoólicas, se alimenta de maneira frugal, não comete nenhum exagero, com certeza tem mais saúde que todos nós... –
Continuou esperando, começou a ficar preocupada._ Será que este batizado é tão tarde assim? - Perguntou para si.
Se recostou no sofá, estava tão alegre que não sentiu fome.
O tempo foi passando lentamente.
Uma grande tristeza foi tomando o seu coração.
A tardezinha aceitou a grande verdade: Se esqueceram dela.
Doídas lágrimas começaram a sair dos olhos.
Já de noitinha os familiares chegaram, comentando o batizado e o almoço feito na comemoração em grande restaurante.
E falaram demonstrando muita vergonha:
_ Desculpe Vó... No carro não cabia mais ninguém, ficamos de voltar, mas com todo aquele alvoroço esquecemos da Senhora...
Ela não suportou, com os olhos marejados de lágrimas desabafou:
_ Puxa vida... Por que, tamanha falta de consideração?
Tudo que ensinei a vocês, todo o amor que dediquei, não valeram de nada?
Deixar-me para trás porque não havia lugar no carro?
Por que não falaram? Se eu soubesse disso, com certeza tomaria um taxi ou ônibus, iria mesmo a pé.
Magoaram-me muito. Será que vocês têm idéia do que é ser tataravó? –
Doeu nos familiares a grande falta cometida.
Mas era tarde, em vão tentaram consolá-la.
Não há como explicar este desrespeito por aquela que merecia a veneração e carinho de todos.
Ela foi para o seu canto em silencio, e chorou.
Perguntava-se: _Meu Deus onde errei? Será que dar amor e dedicação à família durante toda uma vida é errado?
Será que se eu fosse uma mulher egoísta, me tratariam com mais respeito? –
Teve uma noite cheia de pesadelos, lembrando das dificuldades sofridas.
Lembrou do esposo e falou baixinho: _ É meu velho, com o seu temperamento difícil.
Com certeza, se você estivesse aqui não ia deixar barato este desrespeito. –
Então, riu ao imaginar o falecido esposo brigando com todos. Exigindo respeito e consideração.
Ao acordar de manhã, ao abrir as janelas e ver o belo céu azul.
Fez sua prece matinal:
_ Obrigado Senhor pela noite que se foi, e por mais um dia de vida.
Perdoa Senhor, estas minhas lágrimas tão doídas, és o criador de tudo e de todos.
Raramente nós humanos, lembramos do teu amor e dedicação nas horas em que estamos felizes.
Porque, Eu? Uma simples mulher, cheia de defeitos, tenho que ficar tão triste porque se esqueceram de mim em meio às comemorações? ...
O importante é que meu tataraneto está saudável e feliz. –
Pegou o vestido cor de rosa que havia deixado sobre a cadeira.
O colocou novamente no pequeno guarda roupas dizendo:
_ Fique aí bem guardadinho... Afinal és o meu melhor vestido.
Prometo-te que no batizado do próximo tataraneto estarei presente, e vou te vestir. –
Sorrindo, sentindo a alma leve, iniciou os seus afazeres diários...