Ave de rapina
Há quem acredite que não somos capazes de entender a linguagem dos pássaros, cães, formigas, abelhas.... Afinal quase todos os animais que nos rodeiam... Digo que rodeiam, porque os que estão longe do contato visual podem realmente nos estranhar e chegar mesmo nos atacar... Todos sabem disso claro que sim... Com essa observação quero tentar expor um acontecimento verdadeiro que realmente, aconteceu em um dia em minhas andanças pela vida. Nessa época sentia que a vida vinha como uma locomotiva pra cima de mim, não havia tempo ou chance para questionar se sim ou não... Se o trabalho era pesado ou estava fora do que eu queria fazer, se eu iria gostar ou não, segurar ou não. Estava de cara com a minha realidade de viver. Se não me atirasse, se viesse abandonar minhas crenças, minha fé, meu orgulho... Pronto! Estava tudo acabado. Como tenho de herança a fé que todo guerreiro traz dentro de si, lá estava eu de frente com o desafio que viria enfrentar. Caminhava pela cidade sem um rumo definido, eu estava muito ansioso por trocar de emprego, e com isso encontrei com um velho amigo que por incrível que pareça também estava atrás de um ajudante. Quando parei para cumprimentá-lo parecia ler em meus olhos o que iria perguntar á ele, e ficou com um olhar receptivo, com isso ficou muito mais fácil ir direto ao assunto. Ao dizer a ele que estava querendo trabalhar fomos diretamente ao acordo para começar no dia seguinte, marcamos para nos encontrar no dia seguinte pela manha. Com isso voltei para meu caminho e retornei para onde estava fazendo uns bicos... Demiti-me, dizendo que não iria voltar mais... Atirei-me para uma nova jornada, em casa eu apenas tentei entender para onde tudo aquilo me levaria. Assim passaram se os meses, cada dia uma novidade e locais diferentes, pessoas, casas, mansões, casarões, no meu trabalho não tínhamos lugar definido, a cada dia estávamos em uma nova propriedade, uma nova mansão, clubes, lojas, shopping. Eu era ajudante de um técnico e um engenheiro, o responsável pelas obras era o engenheiro e o técnico era diretamente o executor e eu o acompanhava com ferramentas, e tudo o que fosse necessário durante o expediente. Sempre muito atencioso ao que fosse necessário, não imaginava ter que passar por uma das minhas maiores façanhas, ou um maior desafio qual fui submetido. Estávamos em um condomínio de luxo em São Paulo, um lindo apartamento panorâmico, com piscina, e tudo que se pode imaginar de luxo. Eu estava encantado com o local, o proprietário queria instalar uma arandela em um local quase impossível, tínhamos que iluminar um local de difícil acesso, por se tratar de estarmos no ultimo andar, e pra variar tinha que fazer um “rasgo corte” em concreto puro para ocultar um conduite e não deixar aquilo La exposto. Essa difícil tarefa sobrou pra mim, a de cortar, fazer um rasgo na parede de concreto para ocultar um tubo de meia polegada. Nada fácil porque teria de ficar em cima de uma escada, no topo do prédio sob um sol das 11:00 horas .Quando olhei aquilo sabia que não seria fácil, e quando notei no olhar daquele gordo com um sorriso irônico me passando as ferramentas todas gastas e sem corte, me senti um nada, um ser sem qualquer chance que não fosse encher as mãos de calo... Não poderia amolecer, era a minha missão, era meu desafio, teria que vencer. Peguei minha ferramenta “marreta e talhadeira” um ponteiro totalmente cego sem corte ou ponta... Subi pela escada e fui acariciado pela brisa da serra da Cantareira que em frente de meus olhos estava La no horizonte em pleno silencio, eu estava no Tucuruvi, em São Paulo em um condomínio de luxo no ultimo andar em cima da torre na caixa de água.O técnico, imagino que estava com fome e foi comer porque não mais vi ele por ali.Por momentos senti muito calor, tirei minha camisa branca e amarrei na cabeça para proteger do sol forte, e me concentrei nas batidas no ponteiro ,e as vezes alternava com a talhadeira, que também estava cega, sem corte.O suor descia pela face, as vezes sentia uma gota salgada em meus lábios,aquilo me deixou irado, por estar com ferramentas totalmente velhas para uma situação em que estava.. Não entendia como um técnico podia ter suas ferramentas tão mal cuidadas. Lembro-me que tive instantes de desanimo total , pensado em largar tudo aquilo mandar ele pro inferno. Foi quando ouvi um som vindo do céu não muito distante, acho que uns 20 Metros acima de mim, repentinamente e contÍnuo chamando minha atenção, repetiu e repetiu, não pude deixar de olhar para o céu azul, e olhando para aquele gigantesco céu azul eu vi um lindo gavião muito grande voando na amplitude daquele azul , e soltava gritos muito agudos e altos que eu podia ouvir perfeitamente ,mesmo ele estando muito longe e acima de mim, fiquei por uns instantes observando aquele gavião que surgiu voando em círculos. Senti que ele estava me vendo ás vezes ele curvava o pequeno bico quando aproximava de mim e soltava gritos agudos muito alto que outros saíram para olhar em sua janelas, e isso eu pude ver porque estava no topo do edifício e me surpreendi com aquilo. Comecei a ver imagens de índios com penas na cabeça, ou índios com penas de pássaros, meu sentimento avançava para aquelas imagens de índios, e o sol me aquecendo o suor, meus pulsos, minhas mãos segurando aquela marreta e ponteiros, eu me equlibrando na escada o pássaro gritando sobre minha cabeça, aquilo tudo me deu força muita força! Senti que aquele pássaro estava me lançando uma energia, uma força, um contato, eu estava em contato com aquela ave. Imagens de índios iam e vinham em minha mente. Índios americanos, índios do amazonas, índios gravando em rochas, índios e aves e penas, tudo passando em fleches em minha mente, minhas mãos não sentiram a ferramenta, as batidas pareciam fazer rìtimos e eu explodia o concreto com minhas mãos e minha força. As ferramentas estavam quente eu via faíscas sair com as pancadas que dava no ponteiro, o pássaro ainda voava sobre mim, e eu aumentava aquele corte no concreto como se não sentisse mais o fogo do sol, o suor, e as bolhas que surgiam nas mãos.Aquele pássaro marcou aquele momento em minha vida.Ele veio das montanhas voar sobre um guerreiro, ele trouxe força, concentração, e energia pra mim, estávamos em contato naquele momento, fez muitos vôos em circulo sobre mim, sobre o prédio e sobre aqueles que não o percebeu na imensidão de um céu azul, muito azul. Sempre que ouço um gavião soltar um grito agudo no céu ou em uma arvore, eu lembro que esse pássaro traz força, energia, e me traz uma grande paz.Meus amigos do trabalho estavam ocupados em ficar longe do sol, e era hora do almoço, acredito que estavam procurando o que comer.Quando terminei o serviço disse ao técnico que podia jogar fora as velhas ferramentas.Aquele dia minhas mãos ficaram doidas, meus corpo vermelhos do sol, meus ouvidos gravados para sempre o som do grito de uma ave de rapina.