LEMBRANÇAS - O piquenique
O piquenique
Pai Pedro, era um lugarejo perdido no sertão mineiro, edificado às margens de uma linha férrea da extinta Rede Ferroviária Central do Brasil, que constituía uma parada obrigatória do Trem de passageiro que cortava aquelas bandas.
O lugar era composto por uma estação desativada. Ao seu derredor, a casa do agente; a casa do bombeiro, o Sr. Geraldo – um ferroviário, de cor negra, íntegro e de muita vergonha, que tão bem tomava conta daquela parada; as casas do Senhor Justino e a do Senhor Antônio Batista, ambas com um comércio varejista - que eram chamados de Venda, nome comum dado àquele tipo de comércio - abasteciam de mantimentos às necessidades da maioria das famílias daquela região; um grupo escolar composto de apenas uma sala, feito de madeira, construído pela referida ferrovia; um pouco mais à frente e à atrás as casas do Sr. Clemente e do Sr. Joel, respectivamente; uma caixa d´água que abastecia as máquinas maria-fumaça e os operários da rede ferroviária.
Os alunos de toda região num raio de 10 quilômetros se deslocavam para estudarem ali. A maioria dos alunos iam à pé, por isso tinham que sair bem cedo das suas casas, outros à cavalo.
O grupo escolar era dotado de carteiras de madeira com estrutura metálica, conjugada assento-carteira, que abrigava dois alunos.
O grupo era insuficiente para atender toda a demanda, então o prédio da estação se transformou em sala de aula, onde as turmas eram multiseriadas e as “carteiras” eram feitas de bancos de madeira, onde o assento e a superfície para escrever eram da mesma altura, o que fazia os alunos ao final da aula ficarem com dor na coluna.
Tom era um desses alunos. Menino feliz, estava sempre alegre. Apesar de seu jeito meio que afobado, apressado, tinha uma maneira carinhosa de tratar os seus colegas, o que fazia com que eles tivesem muito carinho por ele, em especial as colegas Lúcia, Zaira e Suely. Era muito comum ele roubar a merenda da Suely -os bijus que a mãe dela fazia – e mesmo assim ela nunca brigava com ele.
Certo dia, a professora - dona Eunice - marcou um piquenique. Foi àquela euforia e ansiedade, pois eles não sabiam como era verdadeiramente um piquenique, só tinha visto falar e agora estavam preste a vivê-lo. O acontecimento seria dali à um mês. O lugar escolhido foi o rio, numa região chamada de vargem grande, onde tinha muita areia, poços e muita sombra formada pelos pés de jatobás.
Iniciou-se os preparativos, cada qual teria que levar a sua matula (merenda) e todos queriam levar algo diferente. Não se tinha os sucos enlatados de hoje, nem as garrafas térmicas, nem os freezers, nem geladeiras, nem muito menos a energia elétrica, para que alguém pudesse levar alguma coisa gelada ou fazer gelo.
Mas na casa de Zezito, tinha um pé de groselha. Ele colheu as flores e o Tom colocou dentro de vários litros de água para descolorar e fazer o suco. Assim, quando chegou o dia, eles adoçaram àquela tintura rosada e cada qual levou seu litro num embornal.
Mas a maioria não tinha outra opção, já que as frutas ali era muito difícil ainda mais naquela época do ano – mês de setembro – então a maioria levava seu embornal com um pouco de café dentro de um litro de vidro e algumas quitandas.
As quitandas eram formadas pela sua maioria em biscoito de polvilho; bijus; rapadura com farinha; mandioca cozida aos pedaços; colocados em sacos de pano. Os pedaços de mandioca eram envolto com folhas de bananeira.
E assim saíram logo cedinho, pois queriam aproveitar o máximo do passeio. Tudo era novidade para eles, sentiam-se importantes, fazendo o tal “piquenique”.
Ao chegarem lá foi àquela euforia, Tom e Zezito procuraram logo um lugar seguro e colocaram seus litros de suco dentro d’água para ficar fresquinho.
Passaram-se momentos felizes ali, foi um dia inesquecível na vida daquelas crianças que o tempo não apagará, jamais.
Os tempos eram difíceis, muito daquelas crianças em casa nem sempre tinham o que comer, como era o caso de Orlando, que ao terminar de escrever na última folha do seu caderno, pegava a borracha e apagava a primeira folha, para voltar a escrever, porque não tinha o dinheiro para comprar outro caderno.
Mas apesar de todas às dificuldades, eles eram felizes.
Saudosas lembranças...