Morador de Rua

Vou narrar um fato que vale a pena ser compartilhado, por mais que queira não vou conseguir dormir sem passar isso adiante, acabei de chegar do teatro, são 1:30 da manhã de segunda, logo mais meu dia começa, hoje vai ser agitado começam minhas provas, resolvi ao contrario da maioria dos meus amigos sair, ao invés de estudar simplesmente sair, recebi um convite pra assistir um musical o numero 1 do mundo, onde um lugar chega a custar R$250,00, mas como nunca tinha ido e fui convidado por um amigo que não via a muito tempo fui.

Chegando lá estávamos vendo o musical quando no intervalo um homem se declara a namorada, diz que a ama e a pede em casamento, muito brega porem original, não vou explicitar meu nojo desses amorzinhos, meu desprezo por essas podres pessoas que acreditam que a paixão não se vai com o tempo, ela é forte no momento porém só, mas já fui besta ao extremo e perdôo essas pessoas mas não é sobre isso que quero falar agora, paixão vamos deixar pra quem sabe outro dia.

Saindo de lá fui para o terminal de ônibus, de repente estou eu e meu amigo conversando e para ao nosso lado um morador de rua, eu já pensei la vem pedir dinheiro, mas ele só citou:

-é o frio ta chegando

Mas observei e vi que ele não era desses fora de si, estava bem normal, resolvi dar atenção alias o ônibus tava demorando, logo ele disse:

-é morreram dois mendigos essas semana por causa do frio, dormir na rua é difícil assim, é legal quando se junta um pessoal e fazemos fogueira.

Ele articulava muito bem as palavras, minha primeira indagação foi quais seriam os eventos que levaram a esse homem morar na rua. Continuamos dando atenção e logo estávamos falando sobre desenhos animados, chaves, em minutos estávamos como três amigos relembrando moimentos da infância, ao imitar um gesto vi que suas mãos estavam tremulas, algo não estava normal com sua saúde, mas continuamos, ao nosso lado para um outro morador de rua, mas este estava bem sujo, cego de um olho, vestia trapos, ele de repente pede:

- vocês podem me dar uma ajudinha, to com fome

Eu e meu amigo nem demos atenção e falamos que não tínhamos nada, nisso ele continua ao nosso lado e o nosso “novo amigo”, diz:

-eu sei bem o que é isso, fome é muito ruim.

Abre a sacola de mão e de dois pães tira um e da ao outro, que agradece e sai comendo o pão, o desconforto pousa entre nos por alguns segundos e logo voltamos a relembrar momentos da infância, vejo sorriso naquele rosto sofrido da rua, sorriso que nem imagino quando foi o ultimo, por alguns minutos ele se sente normal, uma pessoa com oportunidades que não se preocupa com o frio das ruas, com a fome do amanhã, toda a sociedade hipócrita que vive suas vidas la fora foi esquecida e esses três relembram de quando eram crianças, de quando não tinham preocupações, quando o amanhã sem medo, quando as horas eram medidas por programas de TV, comecei a observar os traços dele, por trás de cada rosto a uma grande historia, mas qual seria a sua?

Comecei a me indagar, tenho que estudar a matéria da prova, santo Agostinho, mas diante de todos esses problemas sociais, o que Agostinho pode fazer, cadê o divino ali, olhei para o lado mas diante da miséria não encontrei Jesus lá, por que eu ia voltar pra minha vidinha medíocre enquanto, esse homem igual a mim ia dormir na rua, eu ia seguir com minhas aulas de filosofia, enquanto esse homem ia morar na rua sem saber o que aconteceria no seu dia de amanhã, que diferença faz a razão nestas horas, o homem que divide o pão com um desconhecido, o homem que em algum momento de sua historia já foi uma criança feliz.

Hoje é dia 12 de junho dia dos namorados, enquanto casais a algumas horas desembolsaram R$250,00, por 2:40hrs de musicas e danças, pagaram para ver uma historinha feliz, um teatro onde tudo gira em torno de dinheiro, apenas R$0,50 de pão já fez a noite de um homem mais feliz, essa horinha de teatro poderia render a mais de 500 moradores de rua uma noite em que seu estomago roncaria menos, mas a vida é assim né? Enquanto vale trocar a fome de muitos pelo divertimento de um, o mar de rosas do dia dos namorados para mim é um esgoto de espinhos e merda, onde me afogo dia após dia, com merda até o pescoço, vomito da hipocrisia dessa sociedade, duvido que algumas das madames do teatro poderiam trocar seu batom de R$24,00 por um sorriso no rosto de um morador de rua.

Por que algumas pessoas têm tanto e outras nada isso só Deus pode responder, meu ônibus chegou, paramos de relembrar de tempos onde todos eram iguais, eu volto pra minha cama quente, enquanto ele deve estar se ajeitando no asfalto, eu volto pra minha prova de Santo Agostinho, volto pra minha filosofia e a vida segue seu curso lá fora, que dane-se a filosofia, que dane-se a razão, enquanto sigo para meus cobertores eu imagino a única resposta que Deus poderia dar se ele se comunicasse com os homens, a única resposta que me fariam compreender essa desigualdade, se eu ouvisse isso dele poderia acreditar na sua existência, e a resposta é:

-EU SOU SADICO, COMO VOCÊS NÃO VÊEM?