Claudia Leitte Fucks

Ele sabia que estava ferrado logo após abrir os olhos. O alarme soava alto e as luzes de emergência piscavam. A primeira coisa que percebeu era que estava completamente nu. A segunda foi que estava com ambas as mãos algemadas em um sofá. E a terceira era que o sofá estava bem no meio da sala do chefe.

Tentou buscar na memória como tinha ido parar ali. O abadá amarelo jogado no canto lembrou-lhe que estivera no show da Cláudia Leitte poucas horas antes. Lembrou também que bebeu muito, beijou algumas bocas e nada mais. Escuridão total. A sua mente latejava avisos de uma ressaca tempestuosa armando-se rapidamente no horizonte. E aquele alarme maldito não ajudava em nada. Arrependeu-se de ter misturado vodca, uísque, cerveja e champanhe. O open bar fora o seu calcanhar de Aquiles. O trabalho extenuante como estagiário no escritório de advocacia, as cobranças ferozes do patrão e o final do semestre na faculdade contribuíram para que ele agendasse para o show o porre que precisava tomar. Era uma necessidade desestressar, relaxar, abusar-se um pouco de si caindo na farra. Mas agora percebia que de nada adiantariam estas justificativas. O alarme indicava que ele seria descoberto a qualquer instante.

Precisava arrumar um jeito de sair dali o quanto antes. Chamou algumas vezes por ajuda, sem sucesso. Como fora parar ali? Ele tinha a chave do escritório para ser o primeiro a chegar e organizar a correspondência do patrão, mas não se lembrava de tê-la levado para o show. Ah, sim, ela estava no painel do carro. Na certa, o idiota arranjou alguma garota e para economizar o motel pensou no confortável sofá do escritório. Talvez inconscientemente quisesse se vingar dos abusos do chefe. Mas não se lembrava de quem havia levado para lá. Certamente ela seria a dona das algemas. Eram de aço, mas tinham um revestimento de couro rosa para não machucar. Daqueles modelos vendidos em sex shops 24 horas. Tentou soltar-se, mas tanto as algemas não mostraram a mínima intenção de abrir quanto o braço do sofá nem mexeu. Procurou rapidamente ao redor para ver se encontrava algo que pudesse auxiliá-lo. O tempo corria. Na mesa de vidro, tantas vezes usadas para reuniões, havia uma garrafa de frisante virada e dois copos ainda pela metade. Pelo chão, somente as suas roupas. Continuou perscrutando a sala quando o seu coração gelou. O cofre estava aberto.

Todos os funcionários sabiam que o cofre do escritório ficava escondido atrás da imitação de O Grito, do Munch. Mas ninguém além do chefe sabia a combinação. Agora sim, estava totalmente fodido. Além de ser demitido por justa causa iria para a cadeia. Adeus, faculdade de Direito. Adeus, shows da Cláudia Leitte. Adeus, liberdade. Na cadeia teria de dar o cu toda noite pra não apanhar. Adeus, selo original de inviolabilidade. Estava realmente fodido. E a droga do alarme não parava.

Mas poderia alegar que fora vítima de um golpe. Isso. Boa noite Cinderela, não? Alguém o dopou no show e o manipulou até ali. Ele não estava cônscio de seus atos, excludente de ilicitude, Código Penal wins. Seu cu estava a salvo. Foi quando o alarme parou de soar. Ouviu passos vindos na direção da sala. Sua respiração parou. Virou de lado para esconder o pênis entre as pernas. Foi quando viu a garota entrando cambaleante usando somente o abadá do show, que não cobria muita coisa. Ele conhecia aquela garota. Droga. Era a filha de dezesseis anos do chefe. Agora é que fodeu-se tudo de vez.

- Amor, acho que acabei dormindo no banheiro. Devo ter vomitado tudo o que eu bebi e mais um pouco.

- Er… tudo bem. Você tem a chave desse troço? – ele perguntou balançando as mãos presas.

- Tenho, deve estar no bolso da minha calça. Você foi bem safadinho, sabia? Vamos fazer de novo? – pulou em cima dele e o abraçou – Assim nos vingamos juntos daquele calhorda do meu pai. Não sei com o que ele vai ficar mais puto: quando ver que roubaram o dinheiro dele, também, usando o meu aniversário como senha tava esperando o primeiro imbecil fazer isso; ou quando descobrir que eu não sou mais virgem.

- Sim, sim, mas uma coisa de cada vez – respondeu apressado e agora preocupadíssimo – vamos primeiro sair daqui, depois conversamos. Você sabe aonde foi parar a sua calça?

- Deve ser essa daqui, que estava na mesa da recepção – disse o homem parado na porta.

Era o chefe.

O pai dela.

Fodeu.