UMA SEXTA-FEIRA
Sexta-feira, perto das cinco da tarde, eu entro num bar e peço uma
cerveja. Estou angustiado pensando nos meus problemas e achando
que a vida não vale a pena. Complicado pensar nas consequências de
se estar liso e ver as contas vencendo sem saber o que fazer para pa-
gá-las. Pedi um vale na firma e o patrão disse que não tinha. Fazer o
que? Nada. O jeito é esperar pelo dia do pagamento. Por enquanto ten-
ho o da cerveja e isso me basta. Bebo cerveja como se tragasse as an-
gústias que estão por vir. O mundo real está lá fora e eu aqui dentro
desse bar pensando que a vida poderia ser os sonhos que não sonha-
mos, as alegrias que não vivenciamos, a ficção onde tudo acaba bem.
Mas a vida não é nada disso. A vida é o que chamam de realidade e se
mostra nas manchetes dos jornais, no salário que não dura um mês, nos
amores que acabam sem explicação.
A cerveja está acabando e as angústias ainda desfilam na minha me-
mória como um mosaico da realidade , revelando o lado ruim das coisas.
É sexta-feira, amanhã é sábado,depois é domingo e segunda tudo re-
começa. Acordar com o corpo ainda desejando uns minutos a mais de
sono. Tomar banho, tomar café, pegar um ônibus lotado e escutar as
pessoas comentando sobre futebol, crimes, bobagens. A vida.
A cerveja acabou e vejo Lenine na telinha. Aí começo a achar que a
vida vale a pena. Bendita cerveja que acaba a sede e as angústias de
uma sexta-feira que estava perdida no calendário da minha vida.