Madrugada no interior.

Vi uma velha persignando-se abruptamente,

Diante do cruzeiro

E das velas bruxuleantes...

Misteriosa velha metida em seu vestidinho

Surrado de chita barata.

Místicas velas ao pé do cruzeiro

Exalando seu cheiro de reza

De morte

De cera amarela,

Criando sombras e dando movimento

Ao que não se move.

Vi no nevoeiro

O cachorro vira-lata uivando,

Jurando que era um lobo.

Vi o velho vigia da praça

Sentado em seu tamborete encostado no coreto com o boné no rosto,

Soando o apito,

Conforme ressonava.

Vi uma mulher gorda, baixinha,

Seminua e muito pintada,

Fazendo “tóc-tóc” com seus saltos ,altos,

Bêbada, dando rabissacas ao vento,

Com sua medonha cabeleira crespa.

Vi um carro parar e deixar uma “moça”

Na esquina da sua rua...

Vi a “moça” correr para casa com os sapatos na mão,

Ajeitando a roupa.

Vi a coruja voar e dar seu rasga mortalha

Saindo da torre da Igreja,

Quando o relógio dava doze badaladas.

Vi a luz se acender numa casa,

Quando o menino chorava...

Ouvi uma voz cansada de mulher

Entoando acalantos...

Ouvi o ranger dos armadores,

O menino calar,

O acalanto cessar,

Vi a luz apagar.

Ouvi ruidosa ópera felina nos telhados ser interrompida por um balde de água fria, jogado por uma mulher do primeiro andar, que possessa, derramava também impropérios sobre os bichanos.

Vi uma mulher com a cabeça cheia de “bobes” fumando acocorada, de camisola,

Na área de sua casa.

Vi dona Balbina, a parteira velha,

Passar apressada na companhia de Vicente,

Em direção da casa do mesmo.

ERA MADRUGADA

ERA INTERIOR...

Por: Thomas Saldanha

Thomas Saldanha
Enviado por Thomas Saldanha em 28/03/2011
Código do texto: T2874701
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