Madrugada no interior.
Vi uma velha persignando-se abruptamente,
Diante do cruzeiro
E das velas bruxuleantes...
Misteriosa velha metida em seu vestidinho
Surrado de chita barata.
Místicas velas ao pé do cruzeiro
Exalando seu cheiro de reza
De morte
De cera amarela,
Criando sombras e dando movimento
Ao que não se move.
Vi no nevoeiro
O cachorro vira-lata uivando,
Jurando que era um lobo.
Vi o velho vigia da praça
Sentado em seu tamborete encostado no coreto com o boné no rosto,
Soando o apito,
Conforme ressonava.
Vi uma mulher gorda, baixinha,
Seminua e muito pintada,
Fazendo “tóc-tóc” com seus saltos ,altos,
Bêbada, dando rabissacas ao vento,
Com sua medonha cabeleira crespa.
Vi um carro parar e deixar uma “moça”
Na esquina da sua rua...
Vi a “moça” correr para casa com os sapatos na mão,
Ajeitando a roupa.
Vi a coruja voar e dar seu rasga mortalha
Saindo da torre da Igreja,
Quando o relógio dava doze badaladas.
Vi a luz se acender numa casa,
Quando o menino chorava...
Ouvi uma voz cansada de mulher
Entoando acalantos...
Ouvi o ranger dos armadores,
O menino calar,
O acalanto cessar,
Vi a luz apagar.
Ouvi ruidosa ópera felina nos telhados ser interrompida por um balde de água fria, jogado por uma mulher do primeiro andar, que possessa, derramava também impropérios sobre os bichanos.
Vi uma mulher com a cabeça cheia de “bobes” fumando acocorada, de camisola,
Na área de sua casa.
Vi dona Balbina, a parteira velha,
Passar apressada na companhia de Vicente,
Em direção da casa do mesmo.
ERA MADRUGADA
ERA INTERIOR...
Por: Thomas Saldanha