Flores no Quarto
A porta abriu devagarzinho, como se aquele que chega tomasse cuidado para não despertar alguém lá dentro. Contudo, ele sabe que aquilo é em vão, mas mesmo assim não perde o costume. Entra no quarto e caminha com os olhos fixos na figura imóvel em cima da cama. Ajeita o lençol que não precisava ser arrumado. Nunca precisa, mas mesmo assim o faz. Sempre está impecável, nenhum movimento desmancha aquela ordem. O recém chegado contempla o rosto inexpressivo sobre o travesseiro branco. Branco! Tudo é branco, pensa com desgosto.
Senta-se perto da janela, o mais longe possível dos aparelhos que não param de zumbir. Abre o jornal que trouxera e começa a ler desde a última página. Lê tudo. Cada palavra. Vê, em um canto, as flores murchas outra vez e faz uma nota mental: flores novas. Sufoca as lembranças dela que insistem em trazer lágrimas. Procura pelo relógio de parede e descobre por quanto tempo esteve ali; diz um até logo que ninguém ouve, enrola o jornal e vai para casa, da mesma forma que fez nos últimos dois anos.