O Espelho
Certa vez, em uma de minhas muitas viagens pelo mundo, encontrei uma bela vila aos pés de uma imensa montanha. Caminhei durante algum tempo por suas ruas de terra batida, mas, apesar de ser dia e o Sol brilhar forte, não havia ninguém por lá. Não avistei crianças brincando ou senhores fumando nos bancos. Sequer topei com algum cão vagabundo. Já havia decidido ir embora quando pensei ter ouvido alguém chamar por meu nome. Julgava que a voz teria vindo de uma pequena casa de madeira perto de onde estava. Olhei com curiosidade: era um lugar modesto, muito igual à qualquer outra vivenda; tinha janelas com tinta descascada, alguns degraus e tábuas do assoalho da varanda já lascadas; e a porta, de madeira tosca e pouco enfeitada, rangeu e moveu-se com o vento. Cheguei mais perto e bati algumas vezes antes de entrar. Tudo era silêncio; uma quietude densa que acompanhava o bailar da poeira no facho de luz que havia adentrado pela porta aberta.
Qual foi minha surpresa ao encontrar, nos fundos da sala, um homem magro, maltrapilho e barbudo, dentro de um espelho! Cumprimentei-o cordialmente, e o sujeito fez o mesmo. Tinha muitos bons modos. De início, conversamos sobre coisas triviais: se chove ou faz sol, frio ou calor, coisas assim. Quando o assunto já estava por morrer perguntei o que ele fazia, mas o coitado respondeu que, simplesmente, vivia por aí. Falou também que não tinha destino em suas andanças, não sabia o que fazer; andava pelo mundo em busca de sua missão, mas ainda não sabia o que era, pois de certo não a havia encontrado.
Não alongamos muito mais a conversa. Ri dele mais tarde. Pobre homem, perdido no mundo e nos ideais. Quanto a mim, juntei minhas coisas e fui para outro lugar.