CÃO
Sempre fechava a porta olhando atentamente para o apartamento. Os cantos, não sei por que observo-os todos os dias. Talvez uma solução escondida. Checo a água e a ração do meu cão, desligo o gás e somente deixo acesa a lâmpada da área de serviço quando saio à noite. É só pegar a chave do carro que ele sempre me olha e balança a cabeça.
No domingo me surpreendeu. Saí do quarto, arrumado, e ele veio correndo com a chave da porta na boca. Soltava um ganido fino, quase um “assobio” de um vento forte se esfregando no prédio. Agitava com tanta força seu rabo que balançava seu corpo. Convenceu-me. Olhei pela janela o clima ameno com as árvores balançando como se me chamassem. Ele pulava, adivinhando minhas intenções. Naquele dia foi quase impossível me aproximar da porta, tamanha era sua agitação. Praticamente se ofereceu para colocar a guia, ficando imóvel ao meu lado enquanto eu a prendia em sua coleira.
Um sol em pleno inverno. Faz frio na sombra e fora dela não esquenta muito são as vantagens de se morar perto do mar. É o lazer a um passo.
Momentos de reflexão, sonhos, devaneios, observação. Crianças correm atrás de gaivotas. E essas teimam em pousar próximas. Ficam assim numa eterna brincadeira. Correr, espantar, levantar vôo, observar, pousar e correr para espantá-las novamente. Mães cercam seus filhos de cuidados um olho no mar e outro no sol. Banham seus filhos com protetor solar e se esmeram em cuidados redobrados com a água que esta fria e cheias de segredo para vitimar os incautos. A maresia me deixa um gosto salgado nos lábios. Andar a esmo na calçada. Vida é movimento, movimento é vida. Corri tanto a vida toda. Para quê?
Olhei meu cão, um labrador. Parece que lê meus pensamentos. Fita-me sentado e move a cabeça inclinando-a de um lado para o outro. Solidão, eterno silêncio. Sem respostas ou perguntas. Faço um carinho em sua cabeça. Ele saltita com suas patas dianteiras ao mesmo tempo em que espana o chão com seu rabo. Pergunto sussurrando:
- Quer andar até a barraca? Uma água de côco vai ser ótimo. Praticamente me leva, e quando chegamos...
- Bom dia. O de sempre?
- Bom dia. Veja se consegue um bem gelado.
Sempre atencioso revira esse freezer lotado de côco, para encontrar um que seja de acordo para me atender.
- Achei!
- Parece-me que está somente frio.
- Você vai senti-lo. Um minuto.
Fura-o tão facilmente com esse ferro pontiagudo que bastou uma estocada e já deu para colocar dois canudos. E antes de começar a matar minha sede o meu cão olha fixo para o meu côco. Quando o movimento ele o seque com os olhos. Para um bom "entendor" basta meia palavra. Peço e sou atendido: - Uma vasilha descartável e outro côco. Retiro os dois canudos e os dispenso agradecendo. O olhar curioso de meu cão me apressa.
- Vamos! Assim mesmo.
- Calma, deixe-me sentar aqui. Esta vendo isso aqui, é um muro de contenção. Um dia, meu velho, o mar vai tomar tudo isso aqui de volta, mas enquanto isso vamos tomar água de côco. Pára de espanar o chão com seu rabo. Deixa-me virá-lo que você já, já, vai matar a sede. Aqui tem muita água.
- Pronto! É todo seu. Está uma delicia como a gente gosta. Que sede! Este mar esta me dando vontade de comer uma peixada, não dessas de restaurante. Não mesmo! Daquelas que ela fazia. Ali tinha gosto, um manjar dos deuses. Eu adoro peixe! Um dia quem sabe... Sente essa brisa? É tudo de bom. Como diria minha mãe: - Cheia de iodo. Meu amigão.
DIMITRI
19/8/2008 12:43