MARIA COZINHEIRA
Assim eram a quase totalidade dos dias da pequena vida de Maria no planeta Terra.
Maria era mulher, esposa, mãe e, principalmente, cozinheira. Maria cozinhava. Sua maior atribuição dentro de sua casa era cozinhar. Maria e cozinha eram quase que sinônimos; sempre que batia aquela fome hiperbólica, aquela de morrer, lembravam-se de Maria e seu caseirinho pra lá de bom e fresquinho.
Toca o telefone e Maria vai atender ansiosa, é o marido perguntando se o jantar já estava pronto, pois chegaria da rua com aquela fome extremada. Deixava o telefone desanimada, e voltava aos seus afazeres triviais.
Outro dia, “saco vazio não para em pé” diz o popular ditado, Maria sem falta pula da cama às 06h00 para cumprir com sua obrigação cotidiana. Panelas, arroz, feijão, carnes, saladas, alhos, bugalhos, cebolas, condimentos...
Maria, cortando cebola com o abdome encostado na pia, de repente é surpreendida pelos carinhos inusitados e ausentes do marido; seus pelos até se levantam e uma coisa lhe sobe do baixo ventre até o meio do peito, no que ele pergunta: “Está pronto o meu almocinho querida?”.
Devo contar também que Maria trabalhava fora, oito horas de seu dia eram desperdiçadas em um trabalho quase que industrial. Calor, roupas apertadas, tédio, sono, monotonia, e Maria ia para casa ao final da tarde. Deitava-se exausta no sofá e dormia pesado, aliás dormir era a única coisa que a aliviava de ser quem era.
E o telefone toca. Era o marido querendo saber se Maria tinha comprado carne. Ela respondeu que sim; não passavam sem carne. “Ah, era somente isso”, desligava o telefone um marido aliviado ao saber que seu jantar não seria vegetariano.
Os dias passavam. Passavam os dias e as noites também; Maria passava, sua vida passava; felicidade? À noite, para variar, jantavam juntos, papai, mamãe e filinha o quase doce jantar preparado por Maria; e ela era sempre elogiada por seus belos dotes ao fogão.
E finalmente, acabava o dia; mas que cansativo foi esse nosso dia não? O marido dava um beijo nela, virava-se de lado, e lhe desejava um ótimo sono. Amanhã seria um dia cheio. Porém, antes de pegar no sono o marido a lembrava:
- “Você fez a feira? Sabe que não podemos comer sem salada, né? Boa noite!”