Clarice parte I
Graças ao seu olhar triste e vazio que Clarice existe. Nunca vi um ser tão desprezível e feliz. Não entendo a felicidade que aquela menina pequena e frágil consegue ter ao sentir os pingos violentos de chuva caindo em seu rosto. Deve ser uma forma doce de sofrer. Vai entender, cada bicho com sua mania.
Clarice nunca foi muito de falar. Na verdade, se já não tivesse escutado a criatura dizendo baixinho "obrigada", pensaria que é muda. Muda não é, só não gosta de falar, mesmo. A pobre gosta mesmo é de passar horas em silêncio observando o nada. Gosta de coisas simples, como: Chutar pedra, sair na chuva, cantar baixinho, olhar os pássaros, tomar café ( como gosta de café, meu deus.) e escrever. Falando em escrever, para alguém infeliz, ela é uma ótima escritora. Pena que é insegura demais para admitir isso. Nunca está satisfeita com suas palavras. Acha que nunca está nem um pouco perto da perfeição. A verdade é que ela já atingiu a perfeição no dia que nasceu.
Uma curiosidade sobre Clarice: Ela se comunica mais com os animais do que com as pessoas. Deve ser porque é um bicho, também. Um bicho evoluído e inteligente, mas com o lado emocional primitivo e deficiente. É tudo isso, mas feliz. Quando fala, costuma dizer que os animais e as crianças que estão seguros da loucura do mundo. Carrega a teoria de que depois que nos tornamos adultos, viramos pessoas amargas, tristes e carentes. Admite que é amarga, triste e carente. MAS FELIZ. Vai saber, Clarice é quase imoral de tão complicada e simples que é.