Então é Natal...
Existia uma escola onde estudavam os alunos mais simples daquela cidadezinha do interior paulista. Provavelmente ainda existe!
Nessa escola, desde o ano de 2000, a diretoria era comandada pela Sra. Berta que sempre incentivou aos professores das classes que correspondiam ao primeiro e segundo ano do ensino fundamental que, próximo à data natalina, solicitassem aos alunos a confecção das famosas Cartas para o Papai Noel.
Depois disso, seguindo uma regra, escolhiam entre essas cartas àquelas que achavam serem as mais criativas e providenciavam a visita do Papai Noel em suas residências, papel esse sempre desempenhado pelo Sr. Osmar, um senhor aposentado do bairro onde estava instalada a escola.
Nesse ano de 2010, faltando duas semanas para o Natal, a professora Isabel do primeiro ano A levou ao conhecimento da diretora uma das trinta cartas que recebera e, segundo ela, deveria ser a escolhida de sua classe.
A diretora, que não assinava em baixo de nada que não tivesse minuciosamente lido anteriormente, tomou a carta para si, onde leu a seguinte narrativa:
Oi seu Papai Noel!
Meu nome é Marcos, mas me chamam de Marquinhos, pois sou magrinho e pequeno demais para os meus 8 anos.
Estou escrevendo essa cartinha porque a professora mandou, mas acho que não vai adiantar nada, pois sei que não existe nenhum bom velhinho que anda por aí voando de renas e descendo por chaminés. Existem sim boas pessoas que se vestem de vermelho e tentam levar um pouco de alegria onde ela raramente existe, através de brinquedos...
Falando nisso, já que estou fazendo a carta mesmo, bem, na verdade estou ditando a carta, não sei escrever muito bem ainda, minha prima Lucia é quem está fazendo isso por mim, pois ela me deve um favor, coisa de um namoro escondido que eu prometi guardar segredo... Mas então, como eu estava falando de presentes, não custa nada dizer que eu gostaria muito de ganhar uma bicicleta. Não precisa ser de marcha, mas tem que ser grande, para que eu a aproveite por bastante tempo, afinal sei que não conseguiremos comprar uma tão facilmente.
Mas esse desejo aí foi antes de ver minha mãe rezando alguns dias atrás...
Para que o senhor entenda, preciso explicar que moro num barraco de madeira em cima de um morro, eu, minha duas irmãs, uma de 1 ano e meio e a outra com 3, mais um irmão de 5, e a minha mãe que nos sustenta através da coleta de recicláveis. O meu pai? Não sei onde ele anda, sumiu antes da caçula nascer.
Nosso barraco tem um cômodo só, onde minha mãe dorme numa cama de solteiro com a caçulinha e nós três dormimos num colchão de casal.
Foi numa dessas noites que vi minha mãe rezando ajoelhada em frente da santinha. Ela pedia que nesse fim de ano conseguíssemos ter uma ceia de verdade e não o costumeiro arroz com feijão seco. Até aí não tem nenhuma novidade, ela sempre nos diz que devemos ter esperança e continuar acreditando, que quando crescermos poderemos ajudar a comprar uma casa de verdade ou aumentar o barraco, e que devemos principalmente pedir isso todos os dias para Deus, em oração antes de dormir.
O que me fez mudar de opinião quanto à bicicleta que eu queria ganhar foi que, nesse dia em particular, ela rezava chorando e quase não conseguia dizer as palavras, parecia estar desesperada demais ou desacreditada, não sei.
Logo ela que eu nunca vi chorar.
Vê-la assim me fez pensar que tudo aquilo com que estávamos acostumados, fruto da miséria em que vivíamos, não era então uma coisa normal como ela sempre fez questão que acreditássemos.
É por isso que ao invés de um presente para mim eu gostaria agora de ganhar algo para toda a minha família, quem sabe um peru recheado, que eu nem sei que gosto tem, acompanhado por panetones e outras coisas que sejam necessárias para essa tal de ceia de Natal.
O senhor me desculpe por ter sido sincero lá no início em dizer que não acredito que você exista, mas uma coisa eu sei: Deus Existe! Foi Ele que Me tocou naquela noite que minha mãe estava ajoelhada e me fez ver que algumas coisas serão sempre mais importantes que outras, e tenho certeza também que é esse Bom Deus que toca os vários corações daquelas pessoas que todos os anos se vestem de vermelho e saem por aí distribuindo presentes e jogando balas de cima de seus carros enfeitados.
Se o que eu pedi for demais, não tem problema, como eu disse já estamos acostumados com essa nossa vida e é claro que existem outras pessoas ainda mais carentes do que nós, por mais que isso me seja impossível de imaginar. Nós com toda a certeza conseguiremos sobreviver a mais um Natal, pode ser que existam outros que nem tenham tanta sorte, e sendo assim pode transferir o meu desejo para eles, sem pensar duas vezes.
Acho que quando eu crescer eu também vou me transformar num Papai Noel, pois me imaginei um “tantinho” assim no seu lugar e isso me deixou muito mais feliz...
A diretora após ler a carta tentou disfarçar de todo jeito as lágrimas que rolavam pela sua face, mas ao olhar de lado viu a professora Isabel chorando ainda mais do que ela mesma e se deixou levar pela emoção. Abraçaram-se e após conseguirem se acalmar um bom tempo depois, decidiram colocar aquele pedido como prioridade.
Tudo foi arranjado para que na véspera de Natal o Sr. Osmar fosse visitar a família de Marquinhos, levando consigo uma ceia completa e uma bela bicicleta azul. Infelizmente, devido a esses acasos que teimam em acontecer, por volta das 13 horas na véspera o Sr. Osmar veio a falecer de um infarto fulminante, que dizem ter sido fruto daquela obesidade que já o vinha acompanhando há bem mais de 10 anos.
Com esse fato, tendo ocorrido muito em cima da hora, todos os eventos que a escola planejará para o Natal foram automaticamente cancelados, para tristeza dos professores, principalmente de uma chamada Isabel.
Quase um ano depois o menino Marcos, agora no segundo ano e já escrevendo melhor, fez de próprio punho uma nova carta para o Papai Noel que começava mais ou menos assim:
Oi seu Papai Noel!
Lembra de mim, é o Marquinhos! Minha mãe lhe manda lembranças!
Esse ano se não for pedir demais eu gostaria de ganhar um computador, afinal a bicicleta azul ainda está novinha...
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Para todos que passarem por aqui, desejo Boas Festas desde já!
Existia uma escola onde estudavam os alunos mais simples daquela cidadezinha do interior paulista. Provavelmente ainda existe!
Nessa escola, desde o ano de 2000, a diretoria era comandada pela Sra. Berta que sempre incentivou aos professores das classes que correspondiam ao primeiro e segundo ano do ensino fundamental que, próximo à data natalina, solicitassem aos alunos a confecção das famosas Cartas para o Papai Noel.
Depois disso, seguindo uma regra, escolhiam entre essas cartas àquelas que achavam serem as mais criativas e providenciavam a visita do Papai Noel em suas residências, papel esse sempre desempenhado pelo Sr. Osmar, um senhor aposentado do bairro onde estava instalada a escola.
Nesse ano de 2010, faltando duas semanas para o Natal, a professora Isabel do primeiro ano A levou ao conhecimento da diretora uma das trinta cartas que recebera e, segundo ela, deveria ser a escolhida de sua classe.
A diretora, que não assinava em baixo de nada que não tivesse minuciosamente lido anteriormente, tomou a carta para si, onde leu a seguinte narrativa:
Oi seu Papai Noel!
Meu nome é Marcos, mas me chamam de Marquinhos, pois sou magrinho e pequeno demais para os meus 8 anos.
Estou escrevendo essa cartinha porque a professora mandou, mas acho que não vai adiantar nada, pois sei que não existe nenhum bom velhinho que anda por aí voando de renas e descendo por chaminés. Existem sim boas pessoas que se vestem de vermelho e tentam levar um pouco de alegria onde ela raramente existe, através de brinquedos...
Falando nisso, já que estou fazendo a carta mesmo, bem, na verdade estou ditando a carta, não sei escrever muito bem ainda, minha prima Lucia é quem está fazendo isso por mim, pois ela me deve um favor, coisa de um namoro escondido que eu prometi guardar segredo... Mas então, como eu estava falando de presentes, não custa nada dizer que eu gostaria muito de ganhar uma bicicleta. Não precisa ser de marcha, mas tem que ser grande, para que eu a aproveite por bastante tempo, afinal sei que não conseguiremos comprar uma tão facilmente.
Mas esse desejo aí foi antes de ver minha mãe rezando alguns dias atrás...
Para que o senhor entenda, preciso explicar que moro num barraco de madeira em cima de um morro, eu, minha duas irmãs, uma de 1 ano e meio e a outra com 3, mais um irmão de 5, e a minha mãe que nos sustenta através da coleta de recicláveis. O meu pai? Não sei onde ele anda, sumiu antes da caçula nascer.
Nosso barraco tem um cômodo só, onde minha mãe dorme numa cama de solteiro com a caçulinha e nós três dormimos num colchão de casal.
Foi numa dessas noites que vi minha mãe rezando ajoelhada em frente da santinha. Ela pedia que nesse fim de ano conseguíssemos ter uma ceia de verdade e não o costumeiro arroz com feijão seco. Até aí não tem nenhuma novidade, ela sempre nos diz que devemos ter esperança e continuar acreditando, que quando crescermos poderemos ajudar a comprar uma casa de verdade ou aumentar o barraco, e que devemos principalmente pedir isso todos os dias para Deus, em oração antes de dormir.
O que me fez mudar de opinião quanto à bicicleta que eu queria ganhar foi que, nesse dia em particular, ela rezava chorando e quase não conseguia dizer as palavras, parecia estar desesperada demais ou desacreditada, não sei.
Logo ela que eu nunca vi chorar.
Vê-la assim me fez pensar que tudo aquilo com que estávamos acostumados, fruto da miséria em que vivíamos, não era então uma coisa normal como ela sempre fez questão que acreditássemos.
É por isso que ao invés de um presente para mim eu gostaria agora de ganhar algo para toda a minha família, quem sabe um peru recheado, que eu nem sei que gosto tem, acompanhado por panetones e outras coisas que sejam necessárias para essa tal de ceia de Natal.
O senhor me desculpe por ter sido sincero lá no início em dizer que não acredito que você exista, mas uma coisa eu sei: Deus Existe! Foi Ele que Me tocou naquela noite que minha mãe estava ajoelhada e me fez ver que algumas coisas serão sempre mais importantes que outras, e tenho certeza também que é esse Bom Deus que toca os vários corações daquelas pessoas que todos os anos se vestem de vermelho e saem por aí distribuindo presentes e jogando balas de cima de seus carros enfeitados.
Se o que eu pedi for demais, não tem problema, como eu disse já estamos acostumados com essa nossa vida e é claro que existem outras pessoas ainda mais carentes do que nós, por mais que isso me seja impossível de imaginar. Nós com toda a certeza conseguiremos sobreviver a mais um Natal, pode ser que existam outros que nem tenham tanta sorte, e sendo assim pode transferir o meu desejo para eles, sem pensar duas vezes.
Acho que quando eu crescer eu também vou me transformar num Papai Noel, pois me imaginei um “tantinho” assim no seu lugar e isso me deixou muito mais feliz...
A diretora após ler a carta tentou disfarçar de todo jeito as lágrimas que rolavam pela sua face, mas ao olhar de lado viu a professora Isabel chorando ainda mais do que ela mesma e se deixou levar pela emoção. Abraçaram-se e após conseguirem se acalmar um bom tempo depois, decidiram colocar aquele pedido como prioridade.
Tudo foi arranjado para que na véspera de Natal o Sr. Osmar fosse visitar a família de Marquinhos, levando consigo uma ceia completa e uma bela bicicleta azul. Infelizmente, devido a esses acasos que teimam em acontecer, por volta das 13 horas na véspera o Sr. Osmar veio a falecer de um infarto fulminante, que dizem ter sido fruto daquela obesidade que já o vinha acompanhando há bem mais de 10 anos.
Com esse fato, tendo ocorrido muito em cima da hora, todos os eventos que a escola planejará para o Natal foram automaticamente cancelados, para tristeza dos professores, principalmente de uma chamada Isabel.
Quase um ano depois o menino Marcos, agora no segundo ano e já escrevendo melhor, fez de próprio punho uma nova carta para o Papai Noel que começava mais ou menos assim:
Oi seu Papai Noel!
Lembra de mim, é o Marquinhos! Minha mãe lhe manda lembranças!
Esse ano se não for pedir demais eu gostaria de ganhar um computador, afinal a bicicleta azul ainda está novinha...
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Para todos que passarem por aqui, desejo Boas Festas desde já!