E O CRACK MATOU MAIS UM...
Seu Leotério estava sentado conversando com alguns amigos, e enquanto conversava ora olhava a lua, ora admirava as Espadas-de- são-jorge plantadas ao lado do banco de concreto, construído junto ao muro, quando dona Maria de Afonso chegou com a notícia:
_ Mataram seu filho, seu Leotério! Mataram! Mataram lá na padaria da esquina! Ai, meu Deus do céu – e enxugando o suor que descia pelo pescoço, que era três traços gordos separando a cabeça do corpo, acabou fazendo o sinal-da-cruz com a mão esquerda.
Imediatamente seu Leotério levou as mãos ao rosto e lá as conservou por algum tempo, depois rapidamente se recompôs e sem falar palavra alguma se pôs a caminhar. Os amigos, em cochichos, também apressadamente puseram-se a segui-lo. Era uma procissão que se formava à medida que seu Leotério seguia para a padaria na intenção de ver o filho - que outrora havia lhe dado tantas alegrias. Lembrou-se de quando ele havia nascido e das tantas noites em claro, das brincadeiras de infância e de quando levava-o ao campinho para assistir aos campeonatos de futebol e à praia – lugar que seu Leotério adorava ir sempre. Passada a fase infantil, seu Leotério não queria lembrar mais nada. Só se perguntava se era realmente verdade: Teria sido seu filho assassinado? Não, não, não. Recusava-se a acreditar. Precisava ver com seus próprios olhos para se convencer.
O coração disparado apressava as pernas que seguiam numa caminhada rápida, às vezes pedindo mais do que seu frágil e cansado corpo, beirando os setenta anos, podia. O que também provocava preocupação junto aos amigos, que comentavam:
_ Será que aguenta? Se não vão sair dois caixões de uma vez.
_ Pobre do velho! Nessa altura da vida, depois de passar por tudo o que já passou, e ainda mais essa...
_ Deus sabe o que faz, e esse coitado já sofreu muito.
De longe já era possível avistar o tumulto formado na esquina da padaria: carros de polícia com os giroflex ligados, trânsito lento e um número grande de pessoas que largaram os seus afazeres para presenciar o que estava acontecendo.
Seu Leotério, agora mais apressado do que nunca, abriu caminho no meio da confusão formada por aquele mundo de gente e certificando-se de que era mesmo o seu filho, fez um aceno com a cabeça. Depois lentamente sentou-se ao lado do corpo, passou as mãos pelos cabelos do morto, e as levantou para o céu:
_ Graças a Deus. Disse e chorou de alegria. Outros fizeram a mesma coisa.
Primavera / 2010
*Seu Leotério é nome fictício de uma pessoa real que viveu essa história real, isso segundo seu Claudio. Esse que do Alto Guapiruvu, passando pela Saibadela até chegar ao Votupoca, que do Areado, passando pelo Rio Preto até chegar ao Cacubo, bebeu em todas as vendas e em todas elas deixou um fiado, que ele jura de pé junto que um dia irá pagar.