ABEDULA – O FALSO SÍRIO-LIBANÊS

*Da série ABEDULA

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Uma das histórias mais fantásticas contadas por Abedula era a de um sujeito que se apresentava com o nome de Ibrahim Al Assef , o qual se intitulava um “sírio-libanês” , e não gerava desconfiança para a comunidade brasileira, mas suscitava dúvidas entre os demais imigrantes árabes , conquanto além de um passado confuso o sujeito não se atrelava a nenhum outro grupo da colônia Síria ou Libanesa.

Consta que o tal Ibrahim teria chegado ao Porto do Rio de Janeiro escondido no porão de um navio de bandeira Argelina e que por lá adquiriu documentos falsos junto ao escritório de um popular falsificador que atuava na região da Central do Brasil . O sujeito teria oferecido uma gama variada de “espelhos” a serem preenchidos e aptos a dar ao cliente uma nova identidade.

A escolha de Ibrahim e da nacionalidade libanesa – não se sabe se esse era o seu nome verdadeiro – teria se dado graças ao bom conceito de que gozavam os imigrantes Libaneses e Sírios, ao contrário de outros oriundos de nações vizinhas mas que eram reconhecidos como “malandros”.

Em curto espaço de tempo ele perambulou por diversas cidades do eixo Rio - São Paulo exteriorizando um estilo de vida que não era compatível com os imigrantes Sírio-Libaneses , já que estes costumavam firmar domicílio em determinados municípios e ali desenvolver seus negócios atrelados a vínculos sociais muito claramente assumidos.

Numa viagem de compras a São Paulo, acompanhado de seu velho amigo Mustafá – aquele mesmo que lhe dera bons conselhos no passado e que possuía negócios importantes na região de Foz do Iguaçu – tiveram a oportunidade de conhecer um “poderoso” atacado de roupas populares que era administrado pelo tal Ibrahim – o Sírio-Libanês ....

Antes de fazer qualquer negócio com o “patrício” eles buscaram informações com os demais comerciantes das redondezas e de todos ouviram espantosas considerações. Alguns diziam que o homem era um poço de mistérios, pois conseguia vender mercadorias a um preço que era impraticável , visto que rotulados abaixo do valor de custo . Outros sustentavam que o sujeito detinha um carisma inigualável e que , ademais , exibia uma invulgar generosidade ...

Uma senhora que mantinha uma tradicional pastelaria no centro comercial do bairro do Brás chegou a dizer que ele havia conseguido “regenerar” um bêbado conhecido como “Fininho” que vivia nas redondezas há décadas, sempre dormindo nas ruas e recebendo gorjetas pela carga de malas e sacos de compras dos comerciantes.

– “ O Ibrahim comprou roupas para ele , limpou um quarto nos fundos da loja e até paga um salário para o pobre coitado” , dizia a incauta vendedora de pastéis ... “Agora ele tem um emprego digno” ...

Abedula e Mustafá entraram no estabelecimento e puderam confirmar as informações, sobretudo quanto ao baixo preço das mercadorias, e fizeram muitas compras . A alegria dos bons negócios e dos preços baixos só se misturava com a interrogação que permeava a personalidade daquele estranho “árabe” , cujo “sotaque” intrigava muito ...

Alguns meses depois disso, quando retornaram a São Paulo para fazer novas compras de mercadorias para reposição em seus comércios , foram direto ao endereço do Sírio-libanês Ibrahim ,mas para perplexidade encontraram uma fita estendida à porta e um “lacre” com inscrições do Poder Judiciário, dando conta de que o local fora isolado por determinação da Justiça .

Curiosos e preocupados foram até a pastelaria falar com a mesma senhora idosa com que haviam conversado alguns meses antes e , enquanto digeriam um delicioso pastel , lhe perguntaram o que significava aquilo tudo .

- O que aconteceu com o Ibrahim senhora ??

A resposta veio num tom melodramático que se misturava a um certo ar de vergonha e constrangimento que sempre toma conta de quem foi ludibriado ou se enganou em relação a alguém ... Disse a vendedora de pastéis:

- “Vocês nem sabem ... O seu Ibrahim estava de vento em popa, vendia muito mais que todos os seus concorrentes do bairro , aí um dia a Polícia chegou e procurava por um nome que ninguém conhecia, mas pela descrição acabaram prendendo o “Fininho” , que chegou a dormir uma noite na cadeia , mas depois foi solto quando toda a vizinhança testemunhou que ele não passava de um bêbado ...”

- “Acreditem meus bons senhores , o Sírio-libanês Ibrahim havia colocado uma firma em nome do coitado do Fininho e dizem que toda a mercadoria foi comprada com base nessa empresa falsa , por isso ele vendia tão barato ... E sabem mais uma coisa, parece que ele nem era Sírio e nem Libanês e também a Polícia descobriu que ele nunca se chamou Ibrahim”

O sujeito teria desaparecido com a mesma facilidade com que apareceu e sabe-se lá para onde viajou para praticar suas “boas ações” com excluídos sociais . Alguns meses depois Abedula foi intimado para prestar depoimento na Polícia, ocasião em que o Delegado disse que informações da Interpol davam conta de que o sujeito vinha agindo em diversos países, sempre usando a mesma artimanha de se apresentar como “Sírio-libanês”.

Abedula esbravejava : “ Sujeito borco, mancha o nome dos batrícios, como é que bode ser tão sem vergonha assim, Dr. Delegado” !