O VIZINHO BONITÃO (2 DE 2)

Pontualmente às nove horas da noite a campainha tocou. Bia avisou, imediatamente:

- Só pode ser bomba. O síndico é você. Vá lá e atenda.

Suspirando, José Mário se arrastou até a porta.

- Dona Carminha! Mas a que honra devemos sua presença?

Toda sorridente, dona Carminha estendeu para ele um pote de plástico cor de rosa.

- Trouxe um pouco do pavê de doce de leite que eu fiz para o Juba. A receita é da Bia. Ficou ótimo.

Bia apareceu por detrás do marido, amarrando o seu robe lilás. Sua dieta, que já ía de mal a pior, acabava de naufragar de vez.

- Puxa, dona Carminha – falou ela – Não precisava se incomodar com a gente.

- Bem, mas é a única forma de eu comer uma sobremesa - comentou José Mário - Muito obrigado, dona Carminha. Inclusive, estou pensando em comprar os ingredientes necessários para uma sobremesa decente e dar para a senhora preparar para mim. O que a senhora acha?

Dona Carminha ficou encantada. Ela adorava o José Mário.

- Mas com todo o prazer!

- Meu marido não tem vergonha na cara, dona Carminha - Bia estava furiosa - Ele está apenas brincando.

- Não é brincadeira, não - protestou ele - Eu…

Neste momento, a porta do apartamento de dona Carminha se abriu e Juba apareceu. Bia chegou a estontear. O rapaz estava pronto para sair para a balada. Roupa de grife, cabelo impecável, sorriso radiante. Por alguns instantes, Bia sentiu saudades do seu tempo de solteira faceira.

Com a carteira na mão, ele se aproximou da tia, cumprimentou Bia e José Mário e avisou:

- Estão me esperando lá embaixo, tia. Vou dormir na casa do Betinho.

- Está bem, meu querido - respondeu ela, beijando-o na testa - Cuide-se.

Juba se despediu e entrou no elevador. Dona Carminha comentou:

- É um ótimo rapaz. Ele tem me ajudado tanto! Até queria dormir em casa hoje para não me deixar sozinha. Mas o Juba é jovem! Tem tanto para curtir! Não me importa que ele passe algum tempo com o namorado. Esta idade passa tão rapidamente!

Bia ficou branca, mas José Mário concordou com a assertiva de dona Carminha na hora:

- É verdade. Quando a gente vê, a juventude já passou. Muito bem faz o Juba de sair para curtir o namorado. E viva as diferenças!

Mais tarde, na hora de dormir, José Mário ainda comia as últimas sobrinhas do pavê, raspando o fundo do pote com uma colher. Bia estava em silêncio, olhando para o teto.

- Eu não disse?

- Cale a boca, José Mário. Eu estou com enxaqueca e quero dormir.

- Meu olho clínico não fala.

- A vida do Juba não é problema seu. Aliás - e Bia se apoiou no cotovelo e encarou o marido - você devia se inspirar nele, sabia?

- Eu? Me inspirar no Juba? Que absurdo.

- Claro. Acho que você tem muito a aprender com ele.

- Aprender o quê? Como passar gel no cabelo parafinado? Ah, já sei! Como fazer uma série de abdominais para ficar com a barriga perfeita! Boa idéia, Bia. Vou pedir para a dona Carminha o celular dele. Pode ser?

Bia ignorou o tom irônico do marido e retrucou:

- Você pode aprender com o Juba a ter uma visão mais aberta do mundo, a ver a vida por outros ângulos. Também você poderia aprender a ser menos ignorante e aceitar as pessoas com seus gostos, suas diferenças e deixar seus preconceitos bem escondidinhos, em um lugar que nem eu possa ver.

Dizendo isto, Bia virou para o outro lado e encerrou o diálogo, com um sonoro:

- #Fica a dica.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 19/11/2010
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