CORRIDA DE CAVALOS
Onório era homem honesto e trabalhador, daquele tipo que vai de casa para o trabalho e vice versa. Sempre com a camisa branquinha, de punhos abotoados, gravata ajustada ao pescoço fino e calças de linho, cuidadosamente vincadas.
Desde muito tempo, ao ingressar no serviço público, costumava carregar sua maleta, pra onde quer que fosse. Nunca faltava à repartição, a não ser quando foi enterrar o pai. Mas exceto nesta ocasião, era religiosamente assíduo. No serviço era considerado um exemplo para os chefes, e um puxa saco, na opinião dos colegas invejosos.
Fidelíssimo, não dava ocasião ao assédio, e nem passava por sua cabeça impregnada de creme de cabelo – assediar as colegas de saia e batom.
Não tinha quase nenhum vício, até o dia em que um amigo convidou-o a ir ao Jockey Clube para ver as corridas de cavalos. Relutou o quanto pode, tentou recusar, até mesmo inventou desculpas mirabolantes para escapar à insistência do colega, mas enfim cedeu – mais para acabar de vez com a insistência que por uma curiosidade pequena que fosse em descobrir o mundo glamoroso das corridas de cavalos.
Mentiu pela primeira vez à esposa, dizendo que iria fazer hora extra no sábado para terminar um relatório importantíssimo. Não fosse a esposa um poço de ingenuidade saberia que o suor no rosto do marido, a fala entrecortada, o excesso de explicações e os olhos assustados, teriam revelado a ela o engodo. Mas, enfim acabou convencendo a pobre mulher, que não compreenderia que seu marido, tão certinho, pudesse ir a um lugar pecaminoso e cheio de vícios, conforme ele mesmo costumava afirmar ao ler no jornal sobre notícias sobre o tema.
Pegou o ônibus com o colega, que ia lendo o jornal e comentando os páreos daquele dia, uma linguagem bem pouco conhecida para o homem só habituado ao trabalho e à família. Chegaram então ao Jockey Clube e já se encaminharam diretamente às cabines de apostas. Contrariado acabou apostando, por insistência do colega, uma soma insignificante, apenas para não ser taxado de muquirana.
Foram enfim para as arquibancadas para assistir às corridas daquela manhã. Começou ali a ver os cavalos se posicionarem e os jockeys, em suas roupas coloridas, se preparando para montar. Assistia aquilo sem muito entusiasmo, mas fingia algum interesse para não desapontar o companheiro.
Enfim, foi dada a largada. Como num passe de mágica a impaciência se transformou em pequeno interesse, que foi aumentando na medida que os cavalos iam avançando nas raias. Olhava para o número do cavalo do bilhetinho da aposta e para a pista. Quando deu por si já torcia para o cavalinho com o seu número chegar em primeiro.
Ganhou a aposta, para a surpresa e ao mesmo tempo alegria do colega! Ficou tão satisfeito que acabou apostando também nos outros páreos.
Já se passaram alguns meses desde que Onório foi ao Jockey Clube. Desde então, vez ou outra folheia os jornais para ver os páreos que irá apostar. Já perdeu a fama de funcionário padrão e agora faz “hora extra” quase todos os finais de semana, mas agora sem suores e vozes entrecortadas. Mas a esposa continua um poço de ingenuidade.