Um último domingo de paz

O dia surgia lentamente, meio que sem vontade. Na janela, a admirar, lá estava um idoso aposentado que, às cinco horas da manhã, havia levantado aflitamente do seu leito confortável, com a impressão de uma calma melancolicamente monótona que estaria por vir.

Lembrava-se do tempo em que conseguia ver o horizonte azul do mar da varanda de sua casa, que o preenchera, naquele instante, de uma alegria que não voltaria jamais, pois, na sua frente, havia apenas um tom de cinza morto e inerte dos prédios blindados, com o qual se deparou ao abrir os olhos, suspirando como se o encanto de suas lembranças fosse quebrado.

Queria se livrar dos prédios, barreiras concretas que sufocavam sua memória. Resolveu, então, caminhar pelo calçadão da praia mais próxima, que ficava a menos de dois quarteirões de sua casa.

Chegando à praia, despejou uma lágrima, emocionado com o dia ensolarado que se abrira diante dos seus olhos, agora ainda mais próximos do mar, que refletia uma luz como se iluminasse um caminho em sua direção.

Passou o dia na praia. Estava na companhia do Sol e sentia-se levado pelo caminho infinito de luz às ondas que, vez ou outra, batiam na areia como o palpitar do seu coração.

Em silêncio, despedia-se do Sol, que parecia não querer ir embora, pois lentamente descia do seu posto magistral no céu.

Já era noite quando o idoso voltava para casa, com enorme satisfação, o que não sentira desde muito tempo, pois desde muito tempo fora mal humorado e raramente saía de casa, com seus sentimentos trancados no peito e raramente compartilhados.

Chegando em casa, tomou um banho, imaginando-se na imensidão do mar. Dormiu num sono profundo, tão profundo que rendeu-lhe sonhos.

Dormiu em paz, enfim. Não acordou, mas voltaria ao mar como sempre desejou. Sua vontade foi então respeitada, mesmo em sua ausência.

Rafael Saraiva
Enviado por Rafael Saraiva em 10/11/2010
Código do texto: T2607537
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