Quem não comunica...
Seria um dia daqueles, pensou Geraldo. Quando ela, calada, colocava com força, sobre a mesa, a louça e os talheres para mais um café da manhã. Ele até pensou em fazer uma comentário bem humorado sobre o cabelo da esposa, que estava mais desalinhado que o normal, mas, depois de 44 anos de casados, sabia que isso só a deixaria ainda mais irritada.
Pensou no que poderia tê-la deixado assim. Seria algo que ele disse ou o que deixou de dizer? Seria algo que ele fez ou porque deixou de fazer? Deveria perguntar a ela o que a estava incomodando? Inútil. Ela nunca dizia. Queria sempre que ele adivinhasse. Pensou nisso com irritação, que logo foi amenizada por lembrar-se de que ele não era muito diferente dela. Geraldo também não costumava dizer o que lhe aborrecia. Esperava que a esposa, que já o conhecia há anos, percebesse e tomasse providências.
Procurou, então, ajudá-la tirando da sacola os pães que havia comprado quando voltava de sua caminhada diária. Sua esposa serviu-lhe o café e ele, como sempre, tirou o miolo do pão entregando a ela a casca torradinha. Foi, então, que ela explodiu:
- Chega! Não aguento mais isso!
Com o susto, Geraldo esbarrou sua mão na xícara de café, que virou sobre a toalha da mesa.
- O que houve, querida? - perguntou, ainda assustado, tentando limpar a sujeira.
- Todos os dias a mesma coisa. Há anos deixo de comer o miolo do pão porque você o toma de mim, deixando só a casca, que eu detesto! Chega! Basta! Você precisa deixar de ser egoísta!
Geraldo, atônito, num sussurro respondeu:
- Mas, meu bem, eu sempre gostei da casca do pão, não do miolo. Eu sempre abri mão porque eu pensei que era dela que você gostasse também.
História baseada numa palestra que ouvi sobre a falta de comunicação no lar.