Lânguida
Lânguida
Na verdade eu queria ser um encantador de estrelas. Mas há muito não consigo olhar o céu. E não faço nem idéia do que seja encantar estrelas. Eu queria mesmo era beber poesia e destilar palavras amenas. Mas minhas fontes rotas não permitem; secaram-se há muito!
Sinto as mãos trôpegas insistirem em acenos para algum lugar despedindo-se de alguém que desconheço.
Queria fazer mil coisas, não me movo um centímetro. Queria as ondas me beijando as pernas, queria sentir o vento salgado da praia lamber meus cabelos e meu rosto. Todavia, não me aventuro ao mar, não me arrisco num passeio matinal nem vespertino.
Vivo, sinto-me como morto; uma morte fria e sombria que acontece todos os dias às 7h da manhã.
Desejo tudo, mas meu tempo não dá para nada. Meus dias são cheios de um vazio tão intenso que me cansa.
Sinto sono, mas não consigo dormir, sinto uma sede que água não satisfaz!
Não mais percebo a sublime cadência dos versos quando pela manhã cantam os pássaros na minha janela! O que me deixa em paz é o negro silêncio das horas calmas em completa solidão.
Meus sentidos vivem uma dissonante relação de introspecção com o restante do meu ser.
Queria crer, falta-me fé!
Queria morrer, falta-me coragem; é preciso ter coragem para morrer!
“– Não! Resista! Viva!!!” prorrompe do meu interior aquela lânguida voz, agarrando-se àquele último fiozinho de esperança que lhe restava. Ela me contagia.
Quero viver, decido viver!!!
Quero sair; decido sair! Enquanto me preparo naquele ritual há muito esquecido: Banho, escovação dos dentes, pentear cabelos, guarda-roupas, sapateiras, perfume, espelho...
Ouço uma outra voz sussurrar-me: Vá não...! lá está tudo tão confuso, tudo tão frio; o egoísmo é um furioso Leão faminto! A ausência de paz um assassino insano e cruel; lá fora é tão escuro e aqui está tão quente...
E por um instante eterno decido arrancar as roupas, bagunçar os cabelos, vestir meu costumeiro roupão, calçar meus chinelos, lançar-me na poltrona e esquecer-me do mundo vendo a vida passar na tela da TV, quem sabe correr como louca, desvairada, puxar os cabelos até arrancá-los... No entanto resisto à voz e à tentação, corro em direção à porta me lanço no vácuo e me aventuro numa audaciosa caminhada pela calçada...
De repente, a fina chuva desceu das nuvens cantando meu nome e não mais senti meus pés, me perdi nos olhos e olhares dos transeuntes, me vi nas flores cantantes, no silêncio de um cão dormindo na escada.
Foi assim que reaprendi a viver...
Fonte: http://www.webartigos.com/articles/50699/1/Languida/pagina1.html#ixzz13n4m5PV7