Sorriso de Monalisa

Seus olhos farejavam, seu nariz lacrimejava, pra ela pouco importava se as palavras estavam trocadas. Luciana estava atônita demais a desenhar o caminho que iria traçar. Tirava as melhores notas, era exemplar, não ia muito a festas e por ser sempre assim era cobrada demais. Seus pais não percebiam, mas a prendiam dentro de si mesma. Em seu pequeno circulo de amizades, sentia-se bem, por vezes sentia-se mal, isso porque seus amigos eram ainda mais exemplares e a faziam sentir-se inferior.

Extremamente insegura, tinha a impressão de que todas as palavras que saíam de sua boca eram erradas, mas não faziam sentido por puro nervosismo momentâneo. Cobrava-se, cobravam dela, mas era apenas uma adolescente que ainda pensa ser criança! Sua mãe constantemente a perguntava:

-Filha , já decidiu o que irá fazer? Que tal ser médica, olha que bonito ficaria seu nome: Doutora Luciana, já imaginou? Que imenso orgulho!

Seu pai, achava que sua princesinha seguiria seus passos, e faria Engenharia, qual quer que fosse.

Luciana estava cada vez mais perdida dentro de si mesma, em seus pensamentos sabia exatamente o que queria, mas sentia-se mal por não desejar o que eles queriam pra ela. Havia um grande peso, que mal podia suportar, só de saber que não superaria todas as expectativas. Sempre foi apaixonada pela arte e tudo que se referia a ela. Seu coração era feito com escritas de cores, traços, pincelada. Queria ser pintora e um dia ser reconhecida por seu trabalho. Tinha talento e tinha paixão, só isso bastava. Não, não bastava! Seus pais mal podiam imaginar tal decisão, não aceitariam. Pois isto foi dito e feito:

-Filha você precisa ganhar dinheiro, como viverá de arte?

Falavam seus pais juntamente com a sociedade inteira. Com estes dizeres derrubaram seus sonhos de cima do monte Everest e junto com eles caíram lágrimas infindáveis. Luciana não cabia em tanta melancolia. Triste, observava-os indo embora e levando consigo parte de sua alma. Cada vez mais distantes. Estavam tão longe, mas nunca desapareciam. Permaneciam apenas pra intensificar sua dor. Procurou então outra profissão, optou pelo caminho que o pai decidira.

No ano seguinte, prestou vestibular e passou, foram dois anos dedicados somente aos estudos. Casa,cursinho e escola. Mas jamais abandonara suas telas, dia após dia suas pinturas ficavam mais escuras, a arte sempre fora o espelho de sua alma.

Na primeira semana da faculdade, só conseguia ver números que a perseguiam e não paravam de atormentá-la. Não entendia e não via razão alguma naquelas fórmulas extremamente complexas, nem queria entender. Conheceu bons amigos, riu, esqueceu das infelicidades. Professor em sala: perguntou-se pela milésima vez: o que faço aqui? Era um peixe de águas doces e calmas que agora se encontrava em mar turbulento e salgado; não se sentia viva, faltava-lhe o oxigênio. Notas péssimas faziam parte do boletim de uma aluna exemplar. Abandou, disse chega. Escolheu a palheta clara. Sorriu novamente. Foi admitida; estava agora sentada em frente a um monitor de 15 polegadas, em um escritório fechado no centro de sua amada metrópole. Tudo o que queria era ver a luz do sol e retratar um instante de luz, como em uma pintura impressionista. Saía às 21h00 da noite, mal podia ver a lua, estava exausta demais: apenas deitava e dormia em sono profundo, nem assim estava tranquila, pois sonhava com todas essas inquietações.

Outro dia amanheceu, dava os mesmos passos vazios que não a levavam a lugar algum. Gastava seu dinheiro em telas, pincéis, tintas, cores, felicidade! Segundo semestre, vestibular novamente, dessa vez não passou, não havia se dedicado nos últimos meses. Sentia que o emprego mal pago só a atrapalhava e acentuava seus graus de miopia. Entrou em uma universidade particular, conseguiu um desconto, que não era muito...mas já a ajudava.

- Dessa vez sim, farei artes!

Disse isso com um leve sorriso como o de Monalisa, palavras que saíram do coração e a preencheram em um estado de alegria nunca antes provada. Via flores por onde passava. Graduada, agora lecionava, não era fácil, mas ninguém lhe disse que seria. Passava seu conhecimento com profundo amor. Simplesmente amava o que fazia e assim se sentia útil para com a sociedade. Estava feliz o suficiente. Mas, não parou de sonhar. Seus quadros estavam mais coloridos do que nunca. Crê com total convicção que ainda fará uma grande exposição. É o que a torna viva, não somente vegetando como naquela semana numérica, mas viva pela arte, viva de verdade!

Tatiana Espíndola
Enviado por Tatiana Espíndola em 24/10/2010
Reeditado em 05/12/2015
Código do texto: T2575019
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