Tomara que chova
“Tomara que chova...
Três dias sem parar”.
Entoava a chusma de moleques na carroceria do caminhão do “Seu” Adão, que nos guiava até a Fazenda dos Caixetas, nos esperados e desejados passeios domingueiros, como que um presente a todos nós, por mais uma semana de estudos. Nem sei se merecíamos. Porém era o que pensávamos naqueles anos. Um passeio bucólico que, com certeza, toda criança gostaria de fazer.
De qualquer forma o caminhão seguia o seu caminho, vencendo a distância, que não era tão exagerada assim, tudo dentro do esperado e desejado, menos o tal de:
“Tomara que chova...
Três dias sem parar”.
Aquela cantiga me deixava aflito, mas nada que pudesse provocar um grau maior de preocupação, mesmo porque estava longe de ser uma patologia, ainda mais para um menino saudável de calças curtas. Era medo mesmo, medo da chuva, que nem estava caindo e só prenunciava. Só isto e nada mais.
E lá ia o caminhão, com valentia descendo e subindo morro, levantando poeira, aquele barulhão gostoso do motor, aceitando as marchas que eram exigidas para dobrar mais um espigão. Uma reduzida na curva, um embalo maior na descida, primeira, segunda, terceira, quarta, quinta... e lá ia o caminhão, morro abaixo, a nos mostrar a exuberância da natureza, hoje tão maltratada “burramente” por todos nós.
“Seu” Adão sempre foi craque no volante e, com segurança, conduzia aquela caravana entusiasmada e cantante. Nenhum temor quanto a isto. Afinal em vários anos como motorista não poderia receber nenhum comentário que desabonasse sua conduta. O homem era “fera”!
Até aí tudo bem, menos aquela cantoria a martelar nos meus tímpanos:
“Tomara que chova...
Três dias sem parar.”
E não choveu. Nem um pingo. Até pelo contrário: foi sol o dia todo. O passeio foi excelente, o arroz doce estava muito gostoso e o medo da chuva, que não era exclusividade minha, passou.
Minha avó Rita também era assim. Medrosa quando se tratava de chuva. Rezava um terço inteirinho nas chuvas grossas. Acendia velas e mais velas durante as tempestades. Invocava Santa Bárbara para protegê-la dos relâmpagos. Implorava por São Jorge nas trovoadas e, para a ventaria que queria derrubar tudo, clamava por todos os anjos e santos e se metia no fundo do guarda-roupa.
Adamar Gomes