A VOLTA

Eu estava saindo da cama depois de mais uma noite em que duas garrafas de vinho e a companhia de Mari, me esgotaram o suficiente para acordar completamente morto. Uma ducha fria me reanimou um pouco. Bateram na porta. Era ela.

– Você?

– Não querido, é o meu fantasma. Morri de tédio. Não vai me convidar pra entrar?

– Claro! Você já está dentro! Mas o que te trás aqui depois de tanto tempo?

– Nem sei! Acho que queria ver você, afinal fomos casados.

– É fomos!

– Puxa! Que entusiasmo!

– Droga, você me deixou, pela brilhante carreira de atriz global, o que deu errado?

– É foi uma decepção! Nada além de umas pontas em duas novelas.

– Qual?

– Hora! Uma ponta na das sete e outra na das oito. Você não viu?

– Hora e desde quando eu assisto novelas?

– Puxa! Nem pra saber se eu ia parecer?

– Aposto que fez papel de doméstica.

– Como você sabe?

– Claro! Você é negra! Doméstica é sempre negra ou nordestina.

– Tá! Mas na novela das sete eu era uma prostituta de luxo num papel um pouco melhor.

– Qual a diferença?

– Certo! Não era o papel que eu queria, mas era um pouco melhor. Eu queria um papel forte, dramático. Não vai por uma roupa? Você está uma gracinha enrolado nesta toalha.

– Ok! Mas, pra quantos você deu pra conseguir o papel? – Hei! Qual é? Eu não sou destas. Bem! Tive um caso com o supervisor de elenco, mas não teve nada a ver com o papel.

– E o que houve?

– Peguei o desgraçado de bunda pra cima embaixo de um mecânico do tamanho de um guarda roupa!

– Esta é engraçada!

– O que é engraçado?

– Ser trocada por um mecânico. Mas você não veio só me ver! Diga o que quer.

– Bem! Como as coisas estão ruins, talvez possamos reatar, o que você acha?

– Bem! Não nego que ainda gosto de você, mas tem a Maribel. Preciso pensar.

– Ok! Enquanto você resolve, vou tomar um banho.

Dizendo isso ela foi para o banheiro e nem sequer imaginou que talvez eu precisasse de mais tempo. Acendi um cigarro e fiquei imaginando como seria. Será que ela havia mudado? Parado com aquela história de carreira? Quando ela saiu, não deu pra resistir, estava uma deusa enrolada na toalha e claro que eu descartei a toalha e a beijei. Minhas mãos premiam suas nádegas e ela sabia muito bem como me deixar louco. Arrastamo-nos para a cama e apesar da noite com Maribel, eu encontrei forças e nos envolvemos numa louca e desvairada paixão que reacendia. Finalmente eu fui vencido pelo cansaço e adormeci enquanto ela me acariciava. Acordei na manhã seguinte com uma dor de cabeça infernal. Procurei-a na cama, mas ela não estava. Andei pela casa feito um autômato e nada. Tomei um banho e uma aspirina. Imaginando onde ela poderia ter ido. Não tardei a descobrir e da maneira mais dolorosa. Minha carteira, as chaves do carro e meu celular. Haviam sumido. Abri o computador e estarrecido vi que minha conta bancária tinha sido zerada. Eu não havia mudado a senha desde que ela fora embora e agora estava pagando caro pela distração.

Passei o resto do dia tentando encontrá-la, mas foi inútil. Ninguém a viu ninguém sabia. Mas a vida é especialista em surpreender-nos quando menos esperamos. Então eu a vi, saindo de um shopping em companhia de um garotão. Dirigiam-se ao carro dele. Um ator emergente.

É isso! Fiquei possesso e sem pensar, saquei a arma e fuzilei os dois. Um policial que passava, me deu voz de prisão. Sim, fui preso em flagrante. Mas pela maldita mania de andar armado, minha vida está destroçada. Meu advogado veio ver-me.

– Você está bastante enrascado. Disse ele. – Você agiu sem pensar. Além da posse ilegal de arma, você confundiu as coisas. Fui ver a mãe do rapaz que você matou. Ela me disse que seu filho não tinha nada com sua esposa além de uma grande amizade. Eram colegas de profissão e ele a estava ajudando a embarcar para os Estados Unidos onde ia fazer uma cirurgia complicada. Você sabia que ela era doente?

– Não! Nunca teve problemas de saúde.

– Pois é! Não sei por que ela agiu assim, mas ela tinha um problema muito sério. Um tumor de Glomus jugular. A cirurgia é delicadíssima e de altíssimo risco. Além disso, ela era bipolar, talvez por isso tenha agido desta maneira.

– Você está me dizendo que ela me roubou, para fazer essa cirurgia?

– Sim! Aquele rapaz apenas ia levá-la ao aeroporto. O seu dinheiro na verdade foi transferido para a clínica americana e pode ser recuperado. Este envelope estava com o rapaz. É para você.

Foi com as mãos trêmulas que apanhei o envelope das mãos do advogado. Havia um cheque pré-datado em meu nome. R$ 30.000, bem mais do que ela havia levado. Um bilhete escrito em uma folha de papel. Dizia: “Querido, desculpe, mas não tive coragem pra te contar o que está acontecendo comigo, talvez a gente nunca mais se veja. O seu carro está na concessionária, mandei trocar o óleo. Seu celular está no porta-luvas, o meu estava sem bateria. Este cheque é da venda do meu carro. Só estará disponível no vencimento. O Rodrigo vai te contar tudo o que não tive coragem. Ele é um grande amigo.

Adeus. Te amo,

Marylin”.

O choque foi muito forte, escureceu tudo e eu acordei na UTI do hospital. Tive um AVC fulminante e acidentes vasculares, sempre deixam seqüelas. Então fiquei completamente cego. Agora minha vida acabou, isto é apenas parte do castigo. Maribel, vinha me visitar na cadeia, mas desde que contei a ela a verdade, nunca mais veio. Fazem agora 4 dias que não como, é isto, vou deixar que a vida se esvaia. Não tenho coragem para me matar. Mas vou fazer tudo o que puder para encontrar a morte. É só o que me resta.

Lauro Winck
Enviado por Lauro Winck em 11/10/2010
Código do texto: T2550412
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