TEMPO BOM
Numa clínica de fisioterapia.
-Ei Maria da Luz! Quanto tempo!
-É mesmo. Moramos na mesma cidade e não nos encontramos.
-Por que você está aqui?
-Por causa de uma bursite. E você?
-Ah, minha filha... Arrumei uma artrose, bem aqui no pescoço.
-E os seus filhos, como vão?
-Eles estão bem, graças a Deus.
-“Menina”, não me esqueço dos doces cristalizados que sua mãe fazia. A bala de coco, que a gente chamava de canelinha de anjo, era tudo de bom e estava presente em todos os aniversários em Aimorés, MG. Dona Madalena era uma doceira de mão cheia!
-Da Luz, sabe o que o seu pai fazia para mim, quando eu era criança? Cubinhos de madeira para eu jogar belisca, com as duas Célias e a Genilda, em cima do balcão da venda do papai. Eu era craque e jogava até com a mão esquerda.
-Você jogou ferrinho no chão como eu?
-Muito, muito! Era só parar de chover, que a meninada pegava os seus ferrinhos, para fincá-los no chão macio e sair riscando. Que tempo bom era aquele!
-Bom demais! Você ia ao cine Ideal sozinha?
-Que nada! Papai só deixava eu ir ao cinema com a mamãe.
-E o meu nos vigiava, quando estávamos namorando. O medo do velho era que perdêssemos a virgindade ou ficássemos grávidas. Que bobagem! Dos dez filhos dele, sete são mulheres e casamos todas virgens.
-E eu também, Da Luz. Só que, agora, os valores mudaram. Esse negócio de virgindade virou piada de salão, digo, de shopping, de barzinho e da praia. Muitas vezes, a moça precisa mentir que “ficou” com fulano, com beltrano, com sicrano e até com “zicrano”, para não servir de chacota no seu grupinho, sabia?
-O pior é que é assim mesmo.
-Bem, “garota”, o papo está bom, mas já vou. Fique com Deus.
-Amém. Vá com Ele também.