A perplexidade de Peterson
Perplexidade! Se pudesse resumir em uma só palavra tudo o que estava sentindo, aliado ao seu extremo tesão, naquele exato momento, seria Perplexidade, pura. Agora entendia seu amigo JP, suas teorias fantasmagóricas, suas boaventuras, sua ânsia pelo gênero feminino. Mulheres acima da média enlouquecem os homens. Elas e suas formas físicas esculturais, moldadas. Não saíram, estas, do mesmo lugar que o homem. Não vieram do barro, esculturadas por Deus, como os trogloditas e brutamontes homens. Não. Estas vieram de um desenho feito a lapiseira ponta fina, milimetricamente calculadas, centímetro por centímetro, tudo em seu devido lugar, como devia ser. Mérian era, como o próprio Peterson qualificava, em sua classificação internacional de beleza feminina, como uma acima da média, exuberante. Era uma das quais Peterson nunca havia nem ao menos conversado ao pé do ouvido, nunca nem um toque. Quem dirá beijos sedentos em boca carnuda, mãos, as duas, ao mesmo tempo, que percorrem todas as curvas por dentre um vestido preto e sem calcinha. Céus! Aquilo sim era vida, aquela era a vida de seu amigo JP, agora entendia. Precisava mais daquilo, sim. Terminaria a noite, muito mais que endividado, apaixonado. Precisava de Mérian para sempre. Sua vida mudaria a partir daquela noite. Começaria as abdominais logo na manhã seguinte, os dois litros de água, a economia na poupança, quitaria suas dívidas, faria uma academia, dormiria e acordaria mais cedo. Sua sorte, que por muito tempo esteve escondida, ou depositada na conta de algum sortudo qualquer, agora começara a dar as caras. Um homem necessita de sorte, sim.
O solavanco que sentiu com a parada do carro fez cessar, por instantes, as mordidinhas na orelha direita que agora praticara. Era um profissional. Olhou para a frente, sem a mínima localização. Pasmou. Era um motel. Ela viera direto ao abate, viera para o lugar mais propício a prática sexual, a uivos e sussurros e gritos de prazer. Era o que ela queria, espertinha. Era o que Peterson também queria. Tinha mais duas folhas de cheques, dívidas e dívidas e dívidas. Mas a vida era boa, sim. Esse pensamento lhe fez por instantes esquecer Mérian, mesmo ela ali, toda exposta, toda sua. Lembrou também da morte do professor Régis. Que maestria fora sua matéria. Que crueldade de morte. Pensar em morte em um momento daqueles? Não! Chacoalhou a cabeça e fez logo que este pensamento usurpasse. Pensamentos assim levam o homem à brochura, a lástima, a humilhação, a impotência. Morria de medo. Corria sérios riscos de brochar, agora era este seu pensamento. Seria o fim. Sairia dali, do motel, iria para o seu apartamento, aquele cubículo, sintonizaria seu rádio relógio numa melancólica canção, um Reginaldo Rossi, abriria uma garrafa de wisky, um cigarro entre os dedos, um livro nas mãos. Colocaria altas doses de veneno no copo arredondado de wisky e morreria. Lentamente, nostalgicamente. Nenhum homem merece a vida depois de brochar para Mérian. Seria a derrota extrema. Por isso que sempre seu amigo JP levava consigo, na carteira, um comprimido de Viagra, azul, redondinho.
- Essas mulheres, as deusas, facilmente nos levam à broxura. – Bradava sempre JP. – Nós, pobres homens, ficamos cheio de responsabilidade, e, ao invés de irmos com cancha, a mesma cancha que usamos com as feias, saltamos em cima delas feitos lutadores de luta livre, aí vem a desgraça. Quando olhamos para nosso sargento, lá está ele, em posição de descansar. Morto, o maldito.
Deveria urgentemente parar com aquele pensamento.
- Preciso te falar mais uma coisa. – Falou baixinho Mérian, uma vozinha fina, doce. – Melhor. Preciso te falar mais duas coisas. – Mérian estava séria, rígida, confiante. Falasse o que fosse não diminuiria o sentimento construído. Nada. O mundo podia acabar, como previu Nostradamus, aquele fajuto. Morreria feliz, naquele instante, se o mundo acabasse. Partiria amando.
- Eu adoro sexo anal. – Aquilo parecia inacreditável. Todos os pelos de seu corpo arrepiaram, ergueram-se num sinal de alerta. Seu sargento estava em posição de sentido, pontual, unânime, cheio de si.
- Não precisa falar mais nada.
Peterson estava perplexo, apaixonado e endividado. Gostava de bares, das noites, das vilas e dos becos. Gostava de choros, de sambas, de mulheres. Gostava do seu Grêmio, imortal. Mas acima de tudo gostava de loiras com vestidos pretos sem calcinha e que eram fascinadas por sexo anal. Sim. Gostava disso acima de tudo.
Adentraram. O motel era luxuoso. Na entrada uma voz vinda de um monitor de computador lhe solicitara o número do quarto. Ela apertou, retirou um ticket e um cartão de crédito. 300 reais! Céus. 300 reais era o preço do seu aluguel mais condomínio do mês inteiro. E aquele valor era só por 2 horas. Míseras duas horas. Mas era um dinheiro muito bem investido, sim. A garagem era subterrênea, estranha até. Estacionaram. Adentraram no quarto aos beijos e urros de prazer. Mãos por todos os lados. Tocara todas as partes do corpo de Mérian, todas. Todinhas! Foi tirando suas calças e sua cueca de jogo, sim. Estava bem preparado, antes de sair resolveu usar sua cueca oficial, sua mais nova, uma cueca preta box de elástico apertado. Essa era a de jogo, o fardamento oficial, tinha também as de treino.
- Calminha seu moço. – Reclamou Mérian. – Vamos com muita calma nessa hora.
Calma. Ela pedira calma? Estava a ponto de bala, de explodir feito as trágicas bombas do Sudão, seu pênis implorava por aquela Mérian, necessitava dela.
- Vamos beber uma champagne.
Uma champagne deve custar mais uns 300 reais. Estava arruinado, dessa vez para sempre. Seria preso. Precisava arrumar todo esse dinheiro emprestado até as 10 da manhã do dia seguinte, antes do banco abrir. Seus cheques entrariam em sua conta feito um Stock Car, a 300 km por hora. O gerente do banco o ligaria, mandaria o prender por estelionato. Não. Não poderia ir para a cadeia, tinha medo de ser abusado por aqueles presidiários sedentos por carne nova.
Embruído nesse pensamento, Mérian bebia compulsivamente, já na terceira taça. Ria e gargalhava, diferentemente de antes, e suas pernas abriram-se a mostrar sua vagina úmida e bela. Também diferentemente de antes não deixava mais Peterson a tocar, apenas provocava. Devia ser seu jogo de sedução, e se fosse, estava dando certo. Peterson estava louco de desejo por Mérian, que, divertidamente, se aproveitava da situação.
Na oitava taça de champange deitou e, de repente, dormiu. Roncava feito uma maria fumaça a andar por trilhos, com seu vestido negro erguido, quase que despida. Peterson ali, parado, ele e sua cara de babaca, na sua recém segunda taça de champagne, morna. Não podia acreditar! Uma loira daquelas, um belo exemplar da espécie, dormindo e roncando numa cama de motel, semi-nua, a sua frente, sem sexo.
Resolveu ligar a banheira. Tinha, de alguma maneira, que se divertir. Uma hidromassagem aliviaria a tensão.
Logo o banheiro estava cheio de espuma, e Peterson, o repórter Peterson, pronto para bancar o milionário, tomando champagne e fumando charuto e escutando MPB na banheira. Era um Deus.