Encantar o cliente

Palhares entrou numa loja para comprar uma coisa à-toa e já não foi gostando do atendimento ruim, ou melhor, do não-atendimento. Isto mesmo, ele simplesmente não era atendido e ficava junto ao balcão a ver navios.

Quem é que não passou por uma situação como esta? Acho que todos nós, um dia, tivemos este desprazer.

Logo com Palhares, cara legal, amistoso, amigão, bom relacionamento com vizinhos a ponto de ser o síndico permanente do condomínio em que reside, pelo seu senso de organização e de uma paciência de Jó para tolerar todos os chiliques de Da. Carminha, moradora que reclamava de tudo e de um tal de Chupeta, intolerável com o som a todo pique em seu Fusca 74, considerando-se dono do mundo. Por isso, além dele, ninguém se considerava em condições de assumir este cargo espinhoso.

E o Palhares não era atendido. Ficou ali vendo passar os atendentes e esperando um olhar de um deles para arriscar um “bom dia”, que fosse, para iniciar a comunicação. Seria pelo menos o início de uma compra desejada. Mas a impossibilidade deste contato persistia à medida em que o desfile de funcionários continuava, acudindo um ou outro cliente e outros que batiam um papo animado, comentando sobre os resultados do futebol, o posicionamento dos times no campeonato, sobre a pesquisa eleitoral e o capítulo da noite anterior da novela e tantos outros assuntos do momento, menos para aquele.

Palhares se lembrou do curso de vendas que havia feito com a professora Norma no ano anterior, para aumentar os seus conhecimentos e logicamente aplicá-los com a devida ênfase nas suas atividades profissionais. Ouviu coisas que já sabia de cor e salteado, “a satisfação do cliente”, “encantar o cliente”, “atendimento personalizado”, tudo muito bonito no papel, porém distante de alguns despreparados que vão para o mercado de trabalho como verdadeiros pamonhas. Pelo menos ali, naquele pequeno universo, era a dura realidade a ser constatada.

Claro que, justo como era, Palhares sabia que nem todos os balconistas eram assim, sonsos, até pelo contrário, muitos jogavam no time dos competentes e gabaritados, que sabiam “encantar”, aplicando todas as boas técnicas de venda. Ainda bem.

Agora o nosso amigo, que continuava sem ser atendido, começava a se imaginar como um homem invisível e veio à sua mente o livro “The Invisible Man”, obra-prima de Herbert George Wells, que havia lido há poucos dias. Nestas horas pensamos em tudo, não é verdade? Seria ele um homem invisível?

Imaginou também se um fato como este tivesse ocorrendo com a Dona Carminha, moradora que reclamava de tudo no condomínio. Era briga na certa, pois ela jamais engoliria aquela situação. Partiria, com certeza, para as vias de fato, quem sabe ensejando um boletim de ocorrência.

Cansado da espera inútil, era hora de se tomar uma providência, colocando um ponto final naquele fato desagradável e constrangedor, quem sabe esbravejando, soltando o verbo, deitando falação, porém nada disto combinava com a personalidade e jeito de ser do Palhares.

Preferiu adquirir a conexão para a mangueira de jardim num outro lugar.