Desencontros - Parte 2 - Lorena
Daquele dia em diante, eu me encontrava com Carolina quase todo dia. Nossa amizade crescia, e minha paixão por ela só não crescia mais, pois não havia mais espaço em meu coração.
Um dia em fim chamei-a para ir passear no parque da cidade. Lá no parque, passeamos e, enquanto eu a admirava, ela admirava as árvores, sabia várias espécies de árvores de memória. Sentamos em um banco à sombra das árvores e ficamos olhando um para o outro. Não sei quanto tempo durou aquela troca de olhares, mas sei que, para mim, pareceu uma eternidade. Eu aproximei meu rosto do dela, e ela fechou os olhos. Eu ia chegando cada vez mais perto daqueles belos lábios, avançava vagarosamente, aproveitando cada respiração sua e, quando nossos lábios iam se tocar, trovejou. Carolina quase caiu do banco de susto, então eu disse:
-É melhor irmos embora, parece que vai chover forte.
De fato choveu. Passei o resto do domingo olhando para aquela maldita chuva através da janela, maldizendo-a por ter estragado nosso passeio pelo parque. Depois de vários minutos, que pareceram horas, olhando aquela chuva a cair, decidi ler. Peguei a Bíblia, e, por providência ou coincidência, abri exatamente na passagem que diz: "E eu convosco estabeleço a minha aliança, que não será mais destruída toda a carne pelas águas do dilúvio, e que não haverá mais dilúvio, para destruir a terra. E disse Deus: Este é o sinal da aliança que ponho entre mim e vós, e entre toda a alma vivente, que está convosco, por gerações eternas. O meu arco tenho posto nas nuvens; este será por sinal da aliança enrte mim e a terra. E acontecerá que, quando trouxer nuvens sobre a terra, aparecerá o arco nas nuvens. Então me lembrarei da minha aliança, que está entre mim e vós, e entre toda a alma vivente de toda a carne; e as águas não se tornarão mais em dilúvio para destruir toda a carne." (Gênesis 9, 11-15). Olhei para fora da janela e vi um arco-íris. Será que isso era uma aliança de que a chuva não mais atrapalharia meus passeios pelo parque, e que tudo daria certo com Carolina daí em diante?
Na segunda não encontrei com ela na faculdade. Na terça passei por ela, mas ela estava tão apressada que nem reparou em mim, então decidi não perturbá-la. Na quarta consegui falar com ela, mas não tocamos no assunto sobre o dia no parque, nem nos outros dias. A vida seguiu como era antes daquele dia de início de verão. E se seguiu até o recesso, quando fui a Salvador, para ver meus pais e passar o natal e a virada do ano em casa. A família toda queria saber como foi o ano que eu passei na capital federal, se eu tinha conhecido o presidente, e se eu tinha me apaixonado. Contei de Carolina, falei que ela era muito bonita e gentil, disse também que fazia letras na UnB, só não contei sobre o episódio do parque. Foi como se ele nunca tivesse existido.
Era véspera de natal, e eu ainda não havia comprado os presentes, então fui ao Iguatemi. Passei pelas lojas, comprei os presentes, e fui lanchar. Ao sair da praça de alimentação, me deparei com vários ex-colegas de ensino médio, que ainda moravam em Salvador: José, Miguel, Guilherme, Beatriz e... Lorena. Ela estava mais bonita desde a época que eu havia me mudado e tinha terminado o terceiro ano. Um frio correu pela minha espinha quando ela me contou que ia pra Brasília estudar na UnB, assim como eu, só que no curso de enfermagem. Conversamos por horas, até que eu tive que voltar para casa.
Quando cheguei em casa, a ceia já estava na mesa, e todos esperavam apenas por mim para comerem. Trocamos presentes e daí comemos. As comemorações já tinham acabado, meu priminho de 6 anos de idade, que fora passar o natal em minha casa, já dormia, meus pais haviam saído, e eu estava no sofá, assistindo televisão, um daqueles filmes idiotas sobre Papai Noel que passam em especiais de natal, quando a campainha tocou. Olhei pelo olho-mágico e vi do outro lado da porta aquela linda figura que encontrei no shopping. Abri a porta e ela perguntou:
-Posso entrar?
-Claro.
Ela entrou, e se sentou no sofá. Eu me sentei ao lado dela, e perguntei o que a trazia em minha casa.
-Estava com saudade de você e, quando te vi no shopping, resolvi dar uma passada em sua casa.
-Ah, claro. Como vão as coisas?
-Bem, obrigada. Como já te contei, passei no vestibular da UnB. Estou ansiosa para ir para lá em Brasília.
-Lá é legal, mas demora um tempinho até você se acostumar com o clima seco e frio do inverno, com as cordenadas ao invés de endereços, e com os prédios baixos em quase toda a cidade. -Brinquei. Ela deu uma risada sincera e suave. Ah, como quase pude me esquecer dessa bela risada?
-Relaxa, eu me adapto fácil. E se eu precisar de ajuda com alguma coisa eu te peço.
-Está bem. Onde você vai morar lá?
-Minha irmã tem um apartamento no centro, que ela deixou lá quando se mudou para São Paulo. O apartamento estava alugado até o ano passado, mas agora eu é que vou morar nele. Você mora sozinho?
-Não. Moro com meus tios.
Ficamos conversando até tarde. Ela deitou seus belos cabelos dourados em meu ombro, e contou sobre o seu ano. Depois eu falei sobre tudo do meu ano, menos sobre Carolina. Depois que eu contei, ela levantou seu rosto, e ficou a fitar meus olhos, então vagarosamente aproximou seus lábios do meu, mas virei o rosto. Vendo isso, ela rapidamente se levantou e disse que tinha que ir, pois estava tarde, e ela estava cansada. Eu me ofereci para acompanhá-la até em casa, mas ela disse que estava bem. Se foi.
Passei o resto das férias sem vê-la, e ela também não foi me procurar. Os dias se passaram e já era hora de voltar para Brasília, para mais um semestre de estudos.