O Assassinato
Mérian Vitória. Por que se interessaria por um sujeito como Peterson? Um sujeito endividado, feio, nervoso e que mal conseguia conversar. Um sujeito que nunca conseguiria dar uma vida digna a ela, uma vida de princesa, com passeios em shopings e jantares românticos e tudo mais. Sim, era essa vida que Mérian merecia. Ela, uma loira, advogada, rica, inteligente, cheia de si. Quantos homens estariam interessados nela neste exato momento? E ela ali, com Peterson, sentada numa mesa do bar do Tadeu, tomando cerveja gelada e comendo uma porção de camarão, que ela mesma pediu. Ali, conversando e gesticulando e tudo mais, sozinha com Peterson, do Diário. Ele lembrou que tinha apenas 30 reais no bolso traseiro, dentro de uma carteira de couro surrada. Céus! Teria que abrir mão do talão de cheques, assinaria feito um Dom Pedro I na proclamação da república, cheio de charme. Mas na segunda teria que correr até o banco, antes das dez, para que o Tadeu não depositasse o cheque e o próprio voltasse, sem fundo. Sua conta estava negativa, sem saldo até para uma caixa de fósforos. Mas não podia pensar nisso. Tudo estava dando certo, e tinha certeza que a partir daquela noite sua vida iria mudar. Ia ser efetivado no Diário Serrano, deixaria essa vida indigna de free lancer. Como um sujeito inteligente e tão culto como o Mário Sérgio Cardoso, dono do jornal Diário Serrano, não vira a inteligência que transbordara das têmporas de Peterson? Não havia explicação cabível! Não neste mundo tão injusto. Ainda mais com o furaço que dera com a reportagem do assassinato do professor Régis, da Universidade. Uma reportagem vitoriosa, digna de prêmio. Peterson fora o primeiro a chegar, ele e sua câmera Nokia de fotografia. Registrou tudo. Publicou. Ganhou no dia seguinte a capa. Régis Tobermann era professor universitário há 17 anos do curso de direito da Universidade local. Já havia sido coordenador do curso, candidato a reitoria e vereador do município por três mandatos. Era um sujeito bom, sempre de terno e gravata, barba bem feita e cabelos grisalhos bem penteados. Tinha seu charme. Nos 30 anos de profissão acumulara inúmeras vitórias nos tribunais, colocara na prisão muitos bandidos e criminosos, e com isso acumulava algumas inimizades. Sempre advogou da maneira mais ética possível, com lealdade e empenho. Tinha uma amante, que também casada, se envolvera com ele há exatos 7 anos. Régis devia ter seus 55 anos muito bem conservados, ela, uma morena descomunal, também advogada, 28. Clarice Mattos, casada com Jéferson Silva há 12 anos, vivera momentos de altos e baixos no casamento. Um marido que não gostava de trabalhar, envolto em jogos de poker e mulheres, um filho na hora errada. Foi aí que conheceu o professor. No começo era apenas sua aluna, se tornou funcionária da Universidade, secretária do professor Régis, advogada. Tudo muito rápido. Depois de alguns jantares românticos e com todo o charme do professor, ela acabou cedendo. Caiu na tentação e tornou-se sua amante. Não queria dinheiro, nem fama e nem nada custoso do professor. Queria apenas carinho, coisa que não tinha com seu marido. Queria ser amada, queria afeto. Então passou a viver uma vida entre o professor Régis e seu marido. Sexualmente em casa, com o marido, e sentimentalmente na faculdade, com o professor.
O professor estava morto, e isto era um fato. Peterson ganhara com isso, com o perdão da palavra. Ganhara com a morte de um sujeito que nunca viu na vida, que só vira na televisão ou por boatos de pessoas. Foi lá, primeirão a chegar, rápido como um leopardo, alerta como uma raposa, fotografou, entrevistou e pimba! Capa. Entrevistou Clarice, ainda na Universidade, onde Régis foi morto. Dois tiros pelas costas, nada roubado, nada bagunçado. Dois homens armados, de carapuças.
Quando Peterson chegou Clarice ainda chorava, desesperada, debruçada sobre o corpo ensanguentado de Régis. Perdera seu grande amor, ali, bem embaixo dos seus olhos. Os homens chegaram de moto, um desceu, entrou na sala e disparou dois tiros da arma calibre 38. Ela ao lado, insólita. Régis caiu, sangrando. Desfaleceu feito um miserável. Um pobre coitado, sem força nenhuma para reagir. Uma traição.
- Eles precisam pagar. Precisam ser presos. A justiça precisa agir. – Gritava Clarice a Peterson, aos prantos, num desespero desassolador. Ela era uma morena linda, pele escura, olhos verdes. Estava triste, e não existe no mundo nada pior que mulher triste. Antes que estivesse brava, nervosa, estressada. Mas mulher triste é digno de pena. Deu uma vontade em Peterson de abraçá-la, beijá-la e consolá-la. Mas não. Conteve-se. Se restringiu apenas em fotografar e entrevistar Clarice. Frases rápidas, poucas, mas ela fizera questão de dar a entrevista. “Eles precisam pagar.. precisam ser presos?” Será que Clarice sabia de alguma coisa? Sabia o real motivo da morte?