Lembranças dele
Lembro-me da adolescência – quando o mesmo amigo de hoje, fiel escudeiro de várias noites de vãs filosofias em botecos da zona sul do Rio de Janeiro me questionou se um dia eu iria conseguir amar, me doar por inteiro, sem me rasgar pela metade. Foi numa noite de lua cheia há quase 10 anos, eu estava tentando entender o fim de meu quase casamento e ele tentando entender a razão de seu início. Éramos duas visões tentando entender o porquê do meu coração dilacerado, se o fim era tão eminente, existia a mentira, a mão única, as diferenças, a posse.
E desde lá, nunca mais consegui a mesma inocência na entrega, tive tantos e tão poucos, dei-me tanto e não recebi metade. Os atos, os não retornos, os fins e novos começos. Ciclico, antagônica, variando em plena felicidade à noites de edredom. Foram anos buscando abrigos, abraços, explicações e principalmente me dando desculpas para o eterno continuar. Foram anedotas descompassadas, foram lampegos de um nada. Eram apenas pequenas noites de fogos de artificio. Vivi uma vida tão inóspita, baseada em valores iludidos, onde eu apenas queria ser compreendida. Procurei o amor em prazeres que não eram meus, abri mão de valores e quase perdi minha essência. Transmutava de personagem a medida que um novo protagonista me invadia, sem vontades, sem alma, eu só queria a salvação de um pé quente em plena noite fria – ou a sorte de um amor tranquilo. E em função disso, me moldei de tantas formas, vesti tantas caras, troquei de assunto ou de personalidade, como falava meu amigo, mulher de fases, de homens – mulher dos olhos de vidro, tristes, mulher dilarerada de tantas mudanças.
Na minha adolescencia riamos do drama, das tramas, das meninas sem personalidade. Mas nunca me imaginei em tamanho buraco, na mesma mesa de bar de sempre, o questionei do porque de tanta necessidade – onde construi este vazio que tanto eu tentei preencher. Ele sorri doce, disse que o espelho era minha alma e que eu nunca havia entendido o impacto que eu causava na vida de quem entrei, que nunca busquei a verdade de quem ficou do outro lado. Sempre sorrindo, passou a mão por meus cabelos e falando que meu sofrimento de tão genuimo me fazia cega, e que o amor que tanto precisava eu já tinha desde minha adolescencia e que ele não iria esquentar meu pé ou me moldar, pois era imutável e para sempre. Neste momento, beijou minha testa e dizendo, eu sempre vou te amar – exatamente como você é. E um dia quando você entender que o que temos é exatamente o amor mais puro, a troca mais leve e conseguir tê-lo com alguém de fora, então neste momento que terá achado o amor de verdade.
Eu finalmente entendia a leveza que sempre haviam me falado, lembrei da tarde de vinho e de politica, de alguém que se calava para me ouvir, e de todos as justificativas que me dei em razão de seus silêncios, a balança permeia sem escolhas, o cheiro de rosas invade o ambiente e eu e meu amigo dividimos mais uma cerveja