O pombo

Estava eu a curtir a Natureza no anfitiatro situado a meio do esplendoroso jardim paradisíaco - com muitos patos, peixes, pombos e tartarugas - da Fudação Calouste Gulbenkian em Lisboa quando me deu aquela emoção estomacal... É engraçado: todos os bichos naquele jardim vêm ter connosco, excepto as tartarugas. Com certeza não terá nada a ver com o hábito das pessoas darem de comida aos animais... De qualquer das maneiras tem piada. Como estava dizendo, ao sentir aquele emergir interior, saco de um belo naco de pão da avó com Kefir; sim Kefir que eu estou muito cultura do mundo. Ponho-me nas calmas a degustar o pão que muito bem me estava a saber quando, surpresa das surpresas, caído do céu, qual anjo mimado, um pombo!!! "Ah! Um pombo!" Exclamei eu como se pode constatar pelos sinais efectivos. "Porque será?" Não sei se sabem a técnica colombínica (nem sei se esta palavra existe) de fazer com que aquele bicho de ar estranho lhes atire um pedacito de comida: pim, pim, pim (é a minha onomatopeia para imitar um ser humano a atirar comida aos pombos...). Eles não vão directos ao assunto como fazem os vendedores de bíblias. Nããããão... Ficam a rondar... como o petiz que quer pedir qualquer coisa à mãe e que sabe que o mais provável é levar nega. "Mãeeee... oh mãeeee, oh mãeeee"... "NÃO!" Bem, primeiro rondam, rondam, rondam, depois, talvez ganhando coragem, ENCARAM! Mas só durante umas fracções de segundo. O meu naco de pão com Kefir dava para nós os dois. A sociedade é que não era muito justa: 99% para mim e 1% para o pombo. Tirei um pedaço de pão e o pombo percebe, juro, aproxima-se logo, mas depois recua um pouco! ("xiiiiii, não posso dar bandeira" deve ter pensado, como quem está a negociar o preço de um carro... "não estou muito interessado, só estou aqui a rondar, eu nem quero comer nem nada, mas se voce der qualquer coisa também não vou recusar, seria má educação... "). Enfim, pus o pedaço de pão em cima do encosto da fileira de assentos de pedra que estavam na minha frente. O pombo rondou um pouco mais e não foi mal educado. Decidi brincar um pouco com a situação dado que o pombo queria continuar a ser bem educado. Aí, eu coloquei quatro pedaços de pão no mesmo lugar distando 10 cm uns dos outros. O pombo, qual ser lançado à sua própria natureza, comeu um, depois outro e assim sucessivamente. E eu pensei "pombo és estúpido, não percebes que estás a fazer precisamente o que eu quero que faças..." Mas imediatamente ocorreu-me que ele deveria estar a pensar o mesmo de mim... e isso irritou-me! E o raio do pombo queria mais, não largava! Fiquei farto do pombo e dei um chega para lá com o pé para ver se ele ia embora. Foi mas voltou, ao contrário da canção... Então ocorreu-me outra experiência, talvez inspirado pelo movimento da perna: pus o pé em cima do assento de pedra à minha frente e a uns 2 ou 3 centímetros do pé coloquei um pedaço de pão (não era para fazer mal ao bicho, podem estar descansados). Será que o pombo ia bicar? Ou a proximidade do meu pé faria com que o pombo recuasse com medo? Olhem, voces não acreditam! mas o pombo ora olhava para o pão, ora olhava para mim e isto várias vezes, como quem pensa "será quem me vais bater seu sacana?" Pombo corajoso, avaçou - muito devagar - e bicou... e recuou em seguida. Ah é! pensei. Subi a parada: voltei a pôr o pé em cima das costas do assento à minha frente e coloquei um pedaço de pão em cima do ténis. Aí o pombo deve ter pensado "Nossa Senhora mãe de Deus... isso não se faz é cruel". Juro, o pombo lançou-me um olhar que deve ter durado um bom segundo, senti que o raio do bicho penetrou na minha alma como nenhum outro não humano... Depois ficou ali, olhando, olhando, olhando... para o pedaço de pão em cima do meu pé: "vou ou não vou... vou ou não vou... vou ou não vou..." Não foi, virou-se e foi-se embora, é que literalmente embora, nem a voar foi, foi mesmo caminhando sem virar a cabeça para trás, como quem diz: "f*d*ss*, este cara é doido vou dar o fora!" Devo confessar que fiquei p*t*: o c*br** do pombo não confiou em mim!