Uma Companhia Nada Desejável.
Um certo dia,ao pegar uma carona com um amigo da cidade de Natal à Mossoró, me deparei com uma situação, digamos não muito desejável, uma estória que quero lhes contar.
Quando esse meu amigo chega, para me dar a dita carona, nos cumprimentamos e entro no carro. Porém, ao sairmos do local em que eu estivera esperando-o, ele, olhando sério para mim, disse:
- Tem uma cobra dentro do carro.
Confesso que, no exato momento em que ele disse aquilo, a unica coisa que me veio a mente, além de uma risada nervosa, foi:
- Você tá brincando!
Ele disse:
-Calma, ela está dentro do motor, não tem como entrar aqui, pois os vidros estão fechados.
Achei uma loucura o que eu estava ouvindo. Estávamos dentro de um carro, pegando uma estrada, cujo percurso até a nossa cidade era de 240km, e com uma cobra nos fazendo companhia.
Ele começou a explicar o fato hilário;
- Hoje pela manhã, quando estava vindo de um sítio uma cobra apareceu, colocando a sua cabeça no pára-brisa pelo lado de fora do carro.
Continuei a ouvi-lo, ainda achando que poderia ser brincadeira ou que o cara era maluco mesmo. Ele continuou sua história:
- Parei no primeiro posto de gasolina que tinha na estrada de lá pra cá, ainda com a cobra de cabeça erguida, de frente pra mim. Ao chegar ao posto, fiz sinal para um frentista e avisei a ele da cobra, apontando-a. Ele viu e chamou seu colega de trabalho. Eles pegaram uns pedaços de pau e se aproximaram do carro para tentarem matar a danada.
Mas, continuando, disse meu amigo:
- A danada foi esperta e, digamos que agiu até de boa fé, porque quando os frentistas se aproximaram, ela voltou pra o seu lugar de embarque - o motor, sem machucar ninguém e ficou ali quietinha por um bom tempo até que eu tive outra idéia; resolvi ir ao corpo de bombeiros.
- chegando lá, desci do carro, chamei o profissional e fiz o relato. O bombeiro abriu o motor olhou, olhou e nada de cobra.
- Essa cobra não está mais aqui, disse o bombeiro. Com a quentura do motor, ela provavelmente saiu, pode viajar tranquilo, você viu, olhei tudo, nem rastro da danada, concluiu.
Meu amigo não acreditou nessa história, e continuou a cismar que ela ainda estava no motor do carro, mas mesmo assim, resolveu seguir seu rumo.
Seguimos em viagem. os dois muito tensos, eu olhando direto para o piso do carro, observando se não tinha como a danada entrar e ficar com a gente de vez.
Quando menos esperávamos, a nossa ilustre companhia resolveu dar o ar de sua graça: colocou a cabeça para fora do motor e ficou no vidro da frente do carro, olhando para nós. Foi aí que vi que meu amigo não tinha enlouquecido. A estória era real mesmo.
Senti um arrepio enorme vendo aquela cobra saindo toda de dentro do motor do carro. Era fina, porém enorme.Marcos não parou o carro, seguiu em viagem com a cobra subindo por cima do carro na nossa frente.
O medo agora não era só da companhia indesejada, e sim, da estrada que estava movimentada. Meu amigo precisava de muita atenção naquele instante, por isso eu lhe propus
-Preste atenção à estrada que eu presto atenção a cobra.
E assim foi feito. Ela saiu, foi até o vidro da porta do motorista, olhou para o mesmo, que disse:
- Ela "tá" doidinha pra entrar porque aqui dentro "tá" frio e ela ali dentro do motor que está pegando fogo.
Por um momento, eu pensei:
- Será que ele vai abrir a janela para ela se refrescar?
Brincadeira, esse pensamento foi só para amenizar a tensão, pois ele foi muito equilibrado nessa hora; tanto com a cobra como com a estrada, pois graças a sua sabedoria estou contando hoje essa história.
Então ela - a cobra - se enrolou toda no retrovisor do carro, do lado do motorista, esticou a cabeça, deu um pulo e se foi.
Nossa, que alívio! - suspirei.
Como meu amigo não a viu pular, já que observá-la era a minha missão( a dele era observar a estrada), ele me perguntou ainda duvidoso;
-Você a viu pular?
- Vi, respondi.
Paramos num posto de gasolina e ele olhou todo o carro, por dentro e por fora, e depois seguimos em viagem.
Conversamos sobre vários assuntos no decorrer da viagem. A danada da cobra nos havia deixado, porém, ficamos com a sua lembrança, pois de vez em quando ele me perguntava:
- Você a viu pular mesmo?
E eu sempre respondia que havia visto pular, que ele podia ficar tranquilo.
Depois de responder retomamos a nossa conversa que não era mais sobre a nossa companhia indesejada.
Um bom tempo depois de estrada, ele me perguntou novamente
- Tem certeza que a viu pular mesmo?
Respondi, mais uma vez, que sim, entretanto, disse, só não a ví se arrastando pela estrada.
Ainda bem, que quando respondi desta forma, já estávamos chegando a nossa cidade.