Sexta-feira, 13 de agosto

Alvarino trabalhou enquanto teve forças e se aposentou com um minguado salário, que regrado, juntava-se a de outros escassos recursos familiares para fazer frente às despesas de casa. Uma vida simples, que não permitia luxo, mas um entrosado ambiente familiar. Era o que importava.

Era gente simples e que honrava os seus compromissos. Ao Senhor Alvarino, conhecido como ‘Seu’ Alvarino, ficava o encargo de pagar as contas de água e luz e, claro, comprar os remedinhos de uso diário, e tudo aquilo consumia os seus proventos oficiais do ‘INPS’ não sobrando prá mais nada, a não ser um joguinho aqui e outro ali, uma rifa, coisas assim.

Ele gostava mesmo era de jogar um truquinho na praça do Mercado, só prá passar o tempo. Era comum vê-lo sob a sombra de uma velha árvore, com amigos de verdade e até alguns conhecidos meus como o Neguinho dos Frangos, o Galeguinho Tricolor, e o Taquinho ‘Isprivitado’ – era assim que todos o conheciam, não posso fazer nada!

Em casa, colava as nádegas num banquinho de madeira e ficava ali olhando o tempo, fazendo as suas previsões meteorológicas, aparando as difíceis unhas encravadas do pé com o canivete, proseando com um e outro, recontando os casos de mil novecentos e cafunga, principalmente para a netinha Felisbina, que além de feliz no nome, era assim também no dia-a-dia. Foi ela que escolheu e adquiriu para o vovô querido, o bilhete da rifa que correria à noite na Praça.

Voltemos ao nosso protagonista:

Defeitos ele não tinha, a não ser que superstição seja um defeito. Isto era com ele mesmo, supersticioso ao extremo. Não havia outro igual a ele. Só apeava da cama com o pé direito no chão. Passar debaixo de uma escada, nem pensar. E se o gato preto cruzasse à sua frente, estava complicada a situação. Quebrar espelho, sinal de sete anos de azar, e por aí vai... Vai ser sismado lá nos Trinta Paus! Ele não gostava nem de pensar nestas coisas, que o deixavam acabrunhado.

Não andava sem a medalhinha da Virgem Maria, Mãe protetora, a quem prestava uma devoção muito grande e era A que o encorajava a suportar aqueles seus temores.

‘Seu’ Alvarino jogava no time daqueles que não encaravam de jeito nenhum o número 13, contrariando o Zagalo. Achava que casa, apartamento ou final de placa de carro com este número, era sinal de mau agouro.

E o dia 13, então?... Era um Deus nos acuda. Com certeza, poderia ser retirado de seu calendário.

E olha que não falei da sexta-feira, 13, que aumentava ainda mais a sua dose de preocupação.

É... e prá piorar a situação tivemos este ano a sexta-feira, 13, de agosto, prá provocar de vez uma queda no índice “down Jones” do Alvarino, que passava a invocar todos os Santos, numa reza forte e constante como a guiá-lo naquele dia aziago, que demorava a passar, mais que uma corrida de tartarugas.

Mas, como todo o dia tem o seu fim, inclusive o 13, este também caminhava para o seu desfecho, para alívio total do ‘Seu’ Alvarino, que neste momento, começava a ouvir uma voz, bem ao longe e que, a cada segundo tornava-se mais inteligível, à medida em que Felisbina, numa correria desenfreada, se aproximava trazendo uma notícia:

- Vovô, Vovô!!! O Senhor ganhou... o senhor ganhou...

Alguns segundos depois, com mais calma, a netinha completou a informação: O ‘seu’ Alvarino foi o felizardo no sorteio nas barraquinhas da Igreja São José Operário.

Com isto o pernil assado já estava garantido para o jantar, graças ao número 13, retirado da cumbuca.