A Rotina de Minha Morena
Eu acordo, acendo meu cigarro na janela do nosso quarto que dá vista para a Bela Cintra onde andam e param vários daqueles homens vestidos de forma engraçada indo para Congregação Israelita na esquina, ela está dormindo abraçada ao travesseiro e já são 7 horas da manhã. Me distraio com o movimento e ela levanta, vai lavar o rosto e me acompanha com mais um cigarro, “isso ainda vai nos matar”- ela diz sorrindo com a certeza de que nunca irá parar.
Nos vestimos, a deixo no trabalho e vou viver a vida entediante do meu.
Já faz mais ou menos 4 anos que estamos morando sob o mesmo teto, faz 4 anos que eu tento ligar para minha mãe e fazê-la atender, mas sem sucesso já que sempre acabo interagindo com o “deixe o seu recado ao sinal. Obrigada”, quando penso em minha mãe acaba sempre vindo esta frase com aquele tom robótico destas máquinas modernas que são acopladas ao telefone sem fio.
Já era hora do meu almoço e era sempre o mesmo lugar, o restaurante da esquina que pertencia ao Zé, ele já havia sido atendente de motel e vendedor de jornal, eu e mais meia dúzia de pessoas que nos encontrávamos no almoço sem ao menos saber nossos nomes nos divertíamos juntos com as história do Zé.
Algumas horas e cigarros depois já era hora de ir, minha morena me encontra na porta do trabalho e pegamos o carro no estacionamento da esquina.
Ela coloca Hermanos para ouvirmos e eu sempre reclamo do seu gosto musical, ela fica emburrada e rouba meu cigarro como forma de protesto.
Chegamos em casa, tento de novo ligar para minha mãe que ainda tem aquela voz robótica, pego uma cerveja, ligo a TV, é quarta-feira, dia de jogo do Corinthians. Ela faz a janta que provavelmente sairá sem sal e com um aspecto bem diferente do que eu estava com vontade de comer, mas eu já me acostumei. Comemos. Ela vai deitar enquanto vejo o jogo até o fim, já se foram 3 cervejas, um prato de comida, 3 sacos de salgados e um maço de cigarro, ficamos no empate. Dou a última ligação para minha mãe que continua não atendendo e vou dormir pensando que por mais que eu não fosse mais filha, irmã ou parente ainda tenho a melhor morena do mundo.