Ela tinha um sorriso sério. Por um tempo, fiquei pensando como alguém pode ter um sorriso sério e analisei seu rosto quieto, a elegância encabulada que destacava a naturalidade de atos vagarosos, curtos e precisos. Quase imperceptivelmente, um leve tremor se insinuava em seus lábios rosados, como se o esforço para segurar certa emoção fosse maior que a capacidade dos músculos que a retinha. Tentei imaginar que palavras se escondiam ali, prontas e enlouquecidamente ávidas por liberdade. E que histórias elas contariam. Talvez explicassem o sorriso sério, talvez livrassem sua face da rijeza exposta.
 
Quando baixou os olhos, tentei ler de que tristeza ou de que dor seu corpo vivia naquele momento. Busquei no chão, para onde ela dirigia o olhar distante, um caminho, um sinal, uma marca, uma tatuagem riscada ao acaso, que pudessem revelar um sintoma de perigo, um indício de lembrança, qualquer coisa que a carregava para dentro de um silêncio inviolável, intransponível.
 
Mas por que seria dor? – Questionei. Por tantas vezes tenho essa tendência de tomar a seriedade como tristeza. Sei lá por que causa. Então, por que seria dor ou tristeza? Poderia ser, apenas, um surto de ansiedade. Um achaque por estar ali, uma declaração explícita de educada impaciência, de disciplinada intolerância. Um sorriso sério cairia bem nos lábios de alguém magestosamente soberbo, rodeado de cercas e arames farpados bem alinhados e visíveis avisos sobre distâncias. E o tremor, quem sabe um rasgo de ira quase a saltar, quase pronto para explodir em impropérios indignados.
 
Um sorriso sério. Como, um sorriso pode ser assim, austero? Lembrei-me da canção de Chaplin: “... ao notar que tu sorris, todo mundo irá supor, que és feliz”. Talvez fosse por isso. Um sorriso supõe ou pressupõe, felicidade. E quem sabe fosse isso o que ela queria mostrar, sem saber que, além do sorrir, também uma incógnita desfilava por seus lábios róseos. Então, um intervalo. Por um momento, me confundiu aquela minha leitura. Também eu poderia estar enganada com os olhos que a entreviam. Com que olhos, será, eu lia naquele dia, naquela hora, naquele momento?
Eliana Schueler
Enviado por Eliana Schueler em 13/08/2010
Reeditado em 27/02/2011
Código do texto: T2435429
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